Temer bate, sofre revés e Moro perde
1) Terceirização na mira; 2) Janot é Lula; 3) Vaccari solto
Publicado
emFernando Nakagawa, Rafael Moraes Moura, Julia Affonso, Fausto Macedo, Ricardo Brandt e Luiz Vassallo
Marta Nobre, Edição
O cenário político foi tomado por grandes labaredas nesta terça-feira, 27, em Brasília. Em meio à troca de farpas entre o Palácio do Planalto e a Procuradoria-Geral da República, a ponto de o presidente Michel Temer sugerir, como “ilação”, que o dinheiro da JBS foi distribuído entre procuradores, novas decisões colocaram mais lenha na fogueira.
Rodrigo Janot, procurador-geral da República – acusado no meio da tarde por Temer de promover uma denúncia infame -, deu o troco ao governo, pedindo ao STF a suspensão da Lei da Terceirização, no bojo da reforma trabalhista. O asssunto será relatado pelo ministro Gilmar Mendes.
Ao mesmo tempo, o deputado gaúcho Darcísio Perondi, um dos maiores defensores de Temer dentro do PMDB, postou um vídeo nas redes sociais acusando Janot de querer derrubar todas as propostas reformistas do Planalto, em benefício do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Por fim, uma decisão que pode melar a Lava Jato: a Justiça Federal no Rio Grande do Sul desautorizou o juiz Sérgio Moro, e mandou colocar em liberdade João Vaccari Neto, ex-tesoureiro do PT condenado a 15 anos de prisão. Ele foi acusado de corrupção ativa e passiva, além de lavagem de dinheiro.
Terceirização – No pedido ao STF, Janot argumenta que houve descumprimento de um pedido do Executivo de retirada da pauta do projeto de lei que serviu de base para a lei da terceirização. O procurador-geral avalia ainda que a terceirização da atividade fim e a ampliação dos contratos temporários violam o regime constitucional de “emprego socialmente protegido” e outros itens da Constituição.
“É formalmente inconstitucional a Lei 13.429, de 31 de março de 2017, por vício na tramitação do projeto de Lei 4.302/1998, que lhe deu origem. Não houve deliberação, pela Câmara dos Deputados, de requerimento de retirada da proposição legislativa, formulado por seu autor, o Presidente da República, antes da votação conclusiva”, cita a documentação entregue ao Supremo.
Sem que a Câmara avaliasse o pedido do Palácio do Planalto de retirada do projeto da pauta, Janot argumenta que houve “usurpação de prerrogativa, em afronta à divisão funcional do poder”. A situação, diz o PGR, “colide com a Constituição”.
Além de questionar a tramitação, o procurador-geral questiona o mérito do projeto. Ao Supremo, Janot argumenta que é inconstitucional a interpretação que autoriza a terceirização de atividade fim em empresas privadas e de órgãos da administração pública. “Tal interpretação viola o regime constitucional de emprego socialmente protegido”, cita a documentação. Também é mencionada violação à função social constitucional da empresa, ao princípio isonômico nas relações de trabalho e também à regra constitucional de concurso público nas empresas estatais.
“A lei impugnada configura legislação socialmente opressiva e desproporcional, que incorre em desvio de finalidade, porquanto subverte os fins que regem o desempenho da função estatal, em violação do interesse público”, cita o documento assinado por Janot eletronicamente às 18h36 de segunda-feira, 26.
Outro item analisado por Janot é a ampliação do período máximo dos contratos temporários de trabalho – que passaram de três meses para até nove meses. Para o procurador, a nova regra “rompe com o caráter excepcional do regime de intermediação de mão de obra, adotado pela norma revogada, viola o regime constitucional de emprego socialmente protegido e esvazia a eficácia dos direitos fundamentais sociais dos trabalhadores”. Além disso, o documento menciona descumprimento da Declaração de Filadélfia e de convenções da Organização Internacional do Trabalho.
Volta de Lula – Em um vídeo gravado para as redes sociais logo após o pronunciamento do presidente Michel Temer, o primeiro vice-líder do governo na Câmara, Darcísio Perondi, afirmou que Rodrigo Janot, apresentou a denúncia contra o presidente para barrar a aprovação da reforma da Previdência no Congresso e ainda possibilitar a eleição do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
“Os promotores não querem a reforma, os juízes não querem a reforma. E o Janot, petista, também não quer a reforma para o Lula voltar”, disse Perondi no vídeo. “O Lula não volta, o PT não volta e o Michel vai continuar fazendo a reforma. Acreditem ” Na descrição da publicação, em sua conta oficial no Facebook, o deputado escreveu que “Janot trabalha para eleger o Lula, atrapalha a própria Lava Jato e a luta pela recuperação econômica do Brasil”.
Mais, o ministro da Saúde, Ricardo Barros, também afirmou que a denúncia da Procuradoria contra o presidente Michel Temer representa uma ação dos servidores do Judiciário para barrar a aprovação da reforma da Previdência no Congresso.
Perondi encaminhou uma mensagem aos deputados convocando a base governista para demonstrar apoio ao presidente Temer durante o pronunciamento oficial. No vídeo, o deputado reforçou a presença dos parlamentares no Planalto durante a fala de Temer. “Hoje, só o quórum daqui impede o andamento da denúncia na Câmara”, afirmou.
O vice-líder elogiou o discurso do presidente e afirmou que Temer não aceita a produção de provas ilícitas para incriminá-lo O deputado afirmou que a “prova ilícita” – a gravação da conversa do empresário Joesley Batista com Temer – foi organizada por Janot e pelo ex-procurador Marcelo Miller, citado por Temer como o ganhador de “milhões” durante o acordo de colaboração premiada com a JBS. “A busca de provas ilícitas foi feita pelo sr. Janot e pelo seu braço direito, Marcelo Miller, que organizaram esta gravação com um bandido e um facínora”, atacou Perondi.
Vaccari solto – Para complicar ainda mais o quadro, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) derrubou uma sentença do juiz federal Sérgio Moro e absolveu o ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto de 15 anos e 4 meses de prisão. O petista era acusado por corrupção passiva, lavagem de dinheiro e associação criminosa.
Em nota, o Tribunal informou que os desembargadores entenderam que as provas contra Vaccari são “insuficientes” e se basearam “apenas em delações premiadas”.
A denúncia acusava Vaccari de ter intermediado para o PT “ao menos R$ 4,26 milhões de propinas acertadas com a Diretoria de Serviços e Engenharia da Petrobras pelo contrato do Consórcio Interpar”.
Na mesma decisão, a 8ª Turma aumentou a pena do ex-diretor de serviços da Petrobras Renato de Souza Duque em 23 anos, manteve a pena do empresário Adir Assad, e diminuiu a pena de Sônia Mariza Branco e Dario Teixeira Alves Júnior.
O TRF4 mantém jurisdição no Paraná, base da Operação Lava Jato. Todos os atos do juiz Sérgio Moro são submetidos ao crivo da 8.ª Turma da Corte federal, composta por três desembargadores. Mesmo após o julgamento das apelações, os réus ainda podem recorrer na própria corte questionando a decisão da Turma.
O ex-tesoureiro do PT está preso desde abril de 2015.
A sentença de 15 anos e 4 meses era a primeira e a mais alta de Vaccari na Lava Jato. O ex-tesoureiro do PT foi condenado em outros quatro processos e pegou as penas de 9 anos (maio de 2016), de 6 anos e 8 meses (setembro de 2016), de 10 anos (fevereiro de 2017) e de 4 anos e 6 meses (junho de 2017).
A 8ª Turma retomou nesta terça o julgamento dessa ação, que havia tido pedido de vista do desembargador federal Victor Luiz dos Santos Laus, em sessão em 6 de junho. O desembargador Laus acompanhou o desembargador Leandro Paulsen, que já havia proferido voto na sessão do início do mês. Conforme Paulsen, o material probatório é insuficiente. “A existência exclusiva de depoimentos prestados por colaboradores não é capaz de subsidiar a condenação de 15 anos de reclusão proferida em primeiro grau de jurisdição, uma vez que a Lei 12.850/13 reclama, para tanto, a existência de provas materiais de corroboração que, no caso concreto, existem quanto aos demais réus, mas não quanto a João Vaccari.”
Laus, da mesma forma, entendeu que as colaborações não são suficientes para condenar o ex-tesoureiro. “Para mim, a prova ficou insuficiente. No âmbito desta ação penal, faltou a corroboração da palavra dos colaboradores”, avaliou Laus.
O relator dos processos da Lava Jato no Tribunal, desembargador federal João Pedro Gebran Neto, ficou vencido. Gebran Neto entendia pela suficiência de provas, representada pelas múltiplas colaborações judicializadas.
Quanto ao réu Renato Duque, foi dado provimento ao apelo do Ministério Público Federal e a pena passou de 20 anos e 8 meses para 43 anos e 9 meses de reclusão. A turma aplicou o concurso material nos crimes de corrupção em vez de continuidade delitiva No concurso material, os crimes de mesma natureza deixam de ser considerados como um só e passam a ser somados.
Duque também foi condenado pelos crimes de lavagem de dinheiro e associação criminosa. Os demais réus tiveram as condenações por corrupção, lavagem de dinheiro e associação criminosa mantidas pelo tribunal.
Assad seguiu com a pena de 9 anos e 10 meses de reclusão. Já Sônia Mariza Branco e Dario Teixeira Alves Júnior tiveram os recursos parcialmente providos e a pena de 9 anos e 10 meses baixada para 6 anos e 9 meses de reclusão.
Em nota pública, o criminalista Luiz Flávio Borges D’Urso, que defende Vaccari, avaliou que a “Justiça foi realizada, porquanto a acusação e a sentença recorrida basearam-se, exclusivamente, em palavra de delator, sem que houvesse nos autos, qualquer prova que pudesse corroborar tal delação”.
Segundo D’Urso, a Lei nº 12.850/13 é expressa, quando estabelece, no parágrafo 16 do seu art. 4º, que “nenhuma sentença condenatória será proferida com fundamento apenas nas declarações de agente colaborador”. “Vale dizer, a lei proíbe condenação baseada, exclusivamente, em delação premiada, sem que existam provas a confirmar tal delação e foi isto que havia ocorrido neste processo”, destacou. “Felizmente, o julgamento realizado pela 8ª Turma do TRF-4, ao reformar a sentença de 1ª instância, pelos votos dos Desembargadores Federais, Dr. Leandro Paulsen e Dr. Victor Laus, restabeleceu a vigência da lei, que agora foi aplicada a este caso concreto. O Sr. Vaccari, por sua defesa, reitera que continua a confiar na Justiça brasileira.”