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Nas raízes do trumpismo, um guia para tentar entender o eleitorado americano

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Fernanda Magnotta

Desde os primeiros rumores do anúncio de sua candidatura, poucos realmente apostariam na nomeação de Donald Trump ou então considerariam uma possibilidade de vitória. Em meio a tantas dúvidas, ecoa com força a pergunta de US$ 1 milhão: o que explica o trumpismo? Como chegamos até aqui?

O voto em Trump não parece significar o apoio a uma plataforma –até porque o que mais falta nessa campanha é solidez. Ele é, na verdade, um “backlash”, ou seja, uma reação adversa que ocorre em resposta a processos sociais poderosos, que foram estabelecidos nas últimas décadas dentro e fora dos Estados Unidos.

Em primeiro lugar, o voto em Trump representa o ressentimento coletivo que vem da insatisfação da sociedade norte-americana em relação à classe política em geral e às lideranças republicanas em particular. É, portanto, o voto contra o status quo. O declínio relativo à qualidade de vida associado ao aumento da polarização partidária no país pode ter favorecido a emergência de um “outsider” (deslocado), que ampara a narrativa de sua campanha nas preocupações do americano médio.

Ensimesmados, os republicanos parecem não dialogar com as necessidades do cidadão comum. Sem surpresa, não conseguem eleger um novo presidente desde 2004, com George W. Bush, e são retratados pela sociedade, segundo dados do Pew Research Center, como um partido que favorece os ricos em detrimento da classe média. Dessa forma, não é à toa que Trump contrarie a sigla em muitos aspectos e que não se importe com a falta de apoio dentro do partido.

Em segundo lugar, o voto em Trump significa a rejeição a um conjunto de ideias associadas à “doutrina Obama”. Nos últimos anos, o presidente democrata investiu em uma agenda social polêmica e em uma política externa relativamente impopular. O voto em Trump, portanto, poderia ser um voto contra Obama.

Além disso, deve-se considerar ainda o papel desempenhado pela mídia nos últimos anos, já que é por meio dela que a maior parte da sociedade costuma se engajar na política. Logo, parece justo dizer que a postura crítica em relação ao governo e que foi adotada por boa parte dos veículos de comunicação de massa nos EUA acabou por conferir não apenas um viés demonizador mas também certa dramaticidade às escolhas de Obama por um grupo considerável de formadores de opinião desde o início de seu primeiro mandato, em 2009.

Finalmente, em terceiro lugar, o voto em Trump representa uma onda reversa contra a integração dos mercados e a dissolução de fronteiras. É, por conseguinte, um voto antiglobalização. Trump dialoga diretamente com a insegurança de um público acostumado a pensar no maniqueísmo do “eu” versus “o outro”. Ao assumir como premissa a ideia de que “para nos manter seguros, é preciso garantir que os demais fiquem de fora”, ele responde aos medos de uma sociedade acuada.

Após os ataques de 11 de setembro, depois de terem vivido os impactos da globalização financeira com a maior crise econômica desde a Grande Depressão e de terem experimentado uma guerra longa (Afeganistão), assim como a mais cara de sua história (Iraque), o engajamento internacional não parece uma prioridade para o cidadão comum.

Em tempos de terrorismo e de fragilidade social e econômica, as correlações são fáceis –ainda que preconceituosas, ou espúrias. Construir muros soa como diminuir a violência; restringir a imigração parece reforçar a segurança nacional; rejeitar o maior acordo de livre comércio dos últimos anos sugere trazer empregos de volta pra casa.

Esqueçam a narrativa de que Trump é uma ameaça individual, sem noção e sem critério. Mais importante do que aquilo que ele diz é a plateia para quem fala. Desqualificar o candidato não ajuda a explicá-lo nem a derrotá-lo, se for este o caso. Esqueçam a ideia de que o voto em Donald Trump é pitoresco. Pode ser irresponsável, mas definitivamente não é irracional.

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