As práticas
Ioga e gestação, um jeito para a necessidade de cada mulher
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emSão alguns segundos, um minuto talvez, até que o asana (postura) fique devidamente alinhado e seguro para Marina Patari Garcia, de 35 anos. Na 36ª semana de gestação, a terapeuta ocupacional e atriz investiu na ioga para preparar o corpo e a mente para o parto natural que planeja. Quem a instrui é Fabiana Rodrigues Barbosa, professora e criadora do método Yoga para Mulheres®, que se atenta e adapta a prática às necessidades de cada mulher.
“Sinto que meu corpo ganha qualidade de presença, eu ganho qualidade na minha consciência corporal, das partes do meu corpo e o que eu venho trabalhando é poder levar esses momentos para a hora do parto”, diz Marina.
Ela afirma que, com a ioga, os sintomas da gravidez foram brandos, a gestação tem sido tranquila, e a prática deu mais vitalidade para ela exercitar o corpo. Alguns asanas também permitem uma conexão maior entre ela e Isadora que, de dentro da barriga, responde com movimentos a tudo o que acontece no corpo da mãe, conta.
Atenção ao indivíduo – Embora algumas situações da gestação sejam comuns às mulheres, cada uma muda e lida com essa fase de um jeito diferente. Para atender às demandas individuais, o método criado por Fabiana leva em consideração as oscilações do ciclo hormonal mensal e busca entender todas as questões em torno disso em uma tríade que une as partes biológica, psicológica e social.
“Tem mulheres que, no primeiro trimestre da gestação, ficam ultra dispostas e mais energizadas devido à grande carga hormonal. Outras ficam indispostas e sonolentas. Essas diferenças vão pedir adequações”, explica Fabiana, que pratica ioga há 18 anos.
Segundo ela, ioga não é uma prática universal, ou seja, não é igual para todos e não existe, ainda mais no caso das grávidas, um manual que pode ser seguido. Por isso, ela faz uma entrevista inicial para saber as necessidades de cada uma, mesmo que a mulher já seja praticante ou aluna dela, a fim de adequar a prática ao que a pessoa precisa. Ela também se preocupa para que os asanas sejam feitos com todo o cuidado necessário, pois, caso contrário, pode trazer malefícios.
Alerta – Justamente por esse método ser pautado nas necessidades de cada indivíduo, Fabiana orienta que as pessoas não sigam nem pratiquem as posturas apresentadas nesta reportagem por conta própria. Além de individualizada, a prática segura para gestantes precisa ser orientada por um profissional.
Mulher e ioga de fases – Fabiana diz que existe um conjunto básico de situações fisiológicas que é mais ou menos comum para as mulheres em cada trimestre da gestação, como o desenvolvimento do bebê e as consequências do crescimento dele no corpo dela.
A essas fases, ela agrega outras duas em seu trabalho: a preparação para a gravidez e o puerpério, período após o parto em que o corpo da mulher muda para retornar ao estágio de antes da gestação. Para cada etapa, o método desenvolvido por Fabiana tem objetivos diferentes.
Preparação – Nessa fase, a professora explica que a prática oferece uma sensação de aterramento, ou seja, de preparação profunda e que servirá de base para o que virá. “Vai trazer mais saúde para o útero, para as estruturas envolvidas na concepção e aumento da vitalidade”, diz.
Marina, que está grávida pela primeira vez, praticava ioga antes da gestação, mas teve de parar por um tempo. Após descobrir que um bebê estava a caminho, retornou à atividade quando estava com cerca de três meses. “Voltei com esse intuito [da gestação]”, diz.
Primeiro trimestre – É no início da gestação que ocorrem a fixação do feto no útero – chamada de nidação – e o desenvolvimento das partes que compõem o sistema nervoso central. “É um momento delicado, então temos o cuidado de que seja uma prática para colocar a mulher em contato com a gestação, para ela se dar conta do que está acontecendo nela e de como ela pode se movimentar com esse corpo sem fazer contrações abdominais para que a nidação ocorra com mais estabilidade”, diz Fabiana.
A prática também vai estimular abertura pélvica, alongamento das estruturas profundas do útero e aumento da circulação sanguínea para que haja bastante oxigenação para o bebê.
Segundo trimestre – Nesse período, o trabalho se volta para o fortalecimento muscular, principalmente de pernas, braços e abdome. Neste último caso, Fabiana orienta uma prática que faz com que a mulher, em vez de contrair a região, tente erguer a pele debaixo do umbigo. “Tem um engajamento de consciência, mas quando precisa disso, você se sente mais potente, mesmo que seja difícil realizar no começo por movimentar camadas antes imperceptíveis”, diz.
A prática continua o trabalho anterior de abertura pélvica e acrescenta o de abertura de peito, tanto para as experiências que virão quanto para aumentar a circulação sanguínea nas mamas, o que favorece a futura amamentação.
Fabiana diz que o ideal é a mulher gestante fazer ioga individualmente, pois, assim, o professor consegue dar a atenção necessária para esse período da vida dela. Caso as aulas sejam em grupos, eles devem ser menores, e a prática busca ser a mais personalizada possível, mas com menos aprofundamento.
Terceiro trimestre – Na fase final da gestação, os asanas buscam a preparação para o parto natural se possível. De forma mais rigorosa, há a combinação do tônus do assoalho pélvico e do corpo muscular com abertura pélvica.
Além disso, há uma prática respiratória (Pranayama) junto a um treino muscular do períneo para que, durante o parto, a mulher abra caminho para o bebê em vez de fazer força para empurrá-lo.
Esse detalhe se mostra importante em um projeto realizado pela equipe do Medway Maritime Hospital, na Inglaterra. Os médicos decidiram parar de pedir às gestantes que fizessem força para empurrar na hora do parto, pois perceberam uma alta taxa de laceração perineal nelas com esse comando.
Um ano após a implementação, a incidência de lacerações caiu de 7% para 1%. Os resultados foram publicados no European Journal Of Obstetrics & Gynaecology And Reproductive Biology.
Pós-parto – “É a fase de reintegração da mulher como indivíduo único de novo, não tem um ser dentro dela”, explica Fabiana. Segundo ela, essa prática é necessária porque muitas mulheres “se dissolvem como sujeito para viver só em função do bebê”.
O primeiro trimestre dessa fase inclui o asana do primeiro trimestre de gestação (mostrado acima). Outro, abaixo, é feito a partir do segundo trimestre após o parto.
Ioga no dia do parto. A fotógrafa Ariane Assunção, de 21 anos, estava com pouco mais de três meses de gestação quando começou a praticar ioga na cidade de Vitória da Conquista, na Bahia. “Fazia duas vezes por semana no espaço [das aulas] e todos os dias em casa antes de dormir”, conta. Não foi diferente no dia do parto.
“Eram 12 horas quando a bolsa estourou, senti uma vontade de ficar sozinha, curtir meu último momento com ele no meu ventre. Entrei no quarto e comecei a praticar o Surya Namaskar (saudação ao sol)”, relata. Nino nasceu pouco mais de cinco horas depois, em julho do ano passado.
Ariane voltou para a ioga quando o bebê já estava com cinco meses – e ele foi junto. “Voltei a praticar com ele agarradinho no canguru e ele adora.” A jovem também reconhece os benefícios da prática durante a gestação.
“Eu me sinto uma mulher muito realizada em dizer que não senti nenhuma dor durante todo o período em que Nino esteve em meu ventre. Não tive inchaços, azia, insônia e muito menos enjoos. Acredito que isso tenha se dado às práticas de Hatha Yoga que fazia todo santo dia”, conta.
Hatha Yoga é um tipo de prática que trabalha a permanência do corpo em diferentes posturas, o que favorece a tonificação e a flexibilidade.