Talento não tem cor
Sistema de cotas pode estar com os dias contados
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emO Brasil é o país do empurra. Se não há qualidade no ensino infantil, empurra. Se inexistem escolas decentes ao ensino fundamental, empurra. Se o ensino médio não presta, empurra. Além dos períodos educacionais previstos na Lei 9.394/96, são contempladas a educação superior, a de jovens e adultos, a profissional ou técnica, a especial e a moderninha educação a distância. Mas nada disso é relevante.
O mais grave e que está sendo discutido na Esplanada dos Ministérios agora, ainda de forma reservada, é o sistema de cotas nas universidades. Para muitos, uma excrescência inaugurada pela Universidade de Brasília – UnB no início dos anos 2000, pelo falecido reitor Lauro Morhy, um guajará-mirense, nascido em Rondônia, brilhante químico membro da New York Academy of Sciences.
Por um acaso este escriba estava no campus da UnB, trabalhando a convite da diretoria, no dia exato em que Lauro Morhy determinou prioridade para lançar o sistema de cotas no vestibular, há quase duas décadas. Um sistema restrito, só para negros. Ele desejava ser pioneiro também nessa química racial. Pura vaidade, acredito, respeitando a sua ausência. Imediatamente minha reação foi dizer que aquilo representava um erro histórico, segregativo, irresponsável. Não tive voz. O tempo veio para esclarecer o equívoco tupiniquim, burro, falido.
A incompetência do Estado não pode ser resolvida por doses homeopáticas indiretas, por meio de leis de conveniência duvidosa, demagogas, que escondem a base do problema. Existe o sistema de cotas também nos EUA, mas lá não é nada democrática a entrada em universidades renomadas como Yale, Harvard, Stanford ou Columbia. No Brasil o vestibular é a senha para qualquer um que passar na prova. Passou, entrou. Os estadunidenses, ao contrário, escolhem seus alunos individualmente, mesmo que passem nas provas, sejam brancos, negros, índios, amarelos, exilados.
Os alunos, além de excelente desempenho pretérito nas escolas de base, depois de aprovados em concursos, são entrevistados individualmente e escolhidos um a um. Podem ser recusados pelas instituições que não dão satisfação a ninguém. Recusam o candidato, seja feio ou bonito, e tocam o dane-se.
Nosso vestibular é muito mais democrático. Permite o acesso ao diploma universitário de qualquer mortal, ainda que tenha nascido em Guajará-Mirim, como Lauro Morhy, o reitor cotista. Qual contribuição o sistema de cotas produz à sociedade? Mais desigualdade. Não só racial, mas social. O método de empurrar diplomas superiores aos mais desprovidos de educação básica – além de inaptidão intelectual – apenas para divulgar estatísticas midiáticas, cria um submundo acadêmico de incompetentes.
A Ordem dos Advogados do Brasil – OAB, principal entidade do universo jurídico, é a primeira prova de que nossas universidades não prestam. Depois de formados, os advogados são submetidos a um exame compulsório, no mínimo inconstitucional. Melhor seria submetê-los a um exame da língua portuguesa – cadeira que deveria ser obrigatória nos cursos de Direito e Jornalismo – que é a ferramenta de trabalho da profissão: saber ler e escrever. Provavelmente 90% dos recém-formados seriam reprovados. Mas sobre isso ninguém diz nada. Que mal faz conviver com juízes incultos e jornalistas analfabetos? Importante são as estatísticas de que o Brasil avançou academicamente. Melhor empurrar. Fazer de conta que negros, índios e pobres agora poderão ser advogados, engenheiros, cientistas.
A realidade, entretanto, não muda. É comum o papai presentear o filhinho com um carro zero, caso ele seja aprovado para uma federal. É muito mais barato pagar a prestação do automóvel novinho do que uma faculdade particular. A federal é de graça. Paga por nós. A segregação social continua e com ela a racial. Ninguém discute a base da educação. O Brasil não precisa de diplomas, mas de igualdade de oportunidades. Não será esse método pernicioso de criação de subclasses de gente, consideradas inferiores pelas cotas inventadas por seres superiores, que vai resolver o problema nacional.
O que falta é nivelar uma ampla oferta de oportunidades. O talento pode estar incubado em mansões, taperas, aldeias, favelas. Talento não tem raça, endereço ou origem determinada. Melhor seria um sistema de cotas de competência e honestidade para acesso aos cargos públicos de ministro do Supremo, deputado e senador. A sociedade, que paga seus salários, certamente reprovaria a maioria. Infelizmente não estamos nos EUA. Quem pode, é melhor empurrar seus filhos pra lá. E que trumpem-se os sociólogos vermelhos de plantão.