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Estelionato turístico

Guerra estelar ronda Bolsonaro e o R2-D2

Publicado

Autor/Imagem:
Ka Ferriche

O estelionato no Brasil é cultural. E conflituoso. O Estado frauda os contribuintes quando impõe bi, tri, politributação e não devolve nada aos cidadãos. Por outro lado, a sociedade ensina seus filhos como não pagar tributos, repassa aos amigos a agenda de contadores espertos, experts em driblar o fisco.

A cultura imprime normalidade nessa prática perniciosa que tem consequências graves. A razão, que qualquer idiota percebe, é a de que se todos pagassem um pouquinho e o Estado devolvesse o muito que receberá dessa forma, todos teriam serviços de qualidade. A equação é simples, mas o caráter dos responsáveis é complexo. Complexo de inferioridade, certamente. E burro.

A real vocação do Brasil não é produzir commodities, produtos agropecuários brutos, com a alegação de que somos líderes mundiais na plantação de soja, café, laranja (sem duplo sentido, embora seja verdade), carne, em defesa do maldito PIB que requer exame mais inteligente.

Espanha e República Dominicana foram, durante muitos anos, exemplos de como países sem quaisquer perspectivas econômicas ultrapassaram suas dificuldades por meio da indústria do turismo. O mesmo complexo de inferioridade inoculado no caráter brasileiro desde o Descobrimento, faz entender que o ideal é retirar tudo de todos até exaurir a fonte. Aí temos a pobreza, a insegurança, o analfabetismo e a mortalidade como consequências dos anúncios de recordes de safras.

Um programa semelhante ao espanhol ou dominicano, também é difícil no Brasil. Os municípios potencialmente vocacionados ao turismo são roubados sistematicamente pelos empresários que exploram o setor. Recentemente, ao apresentar estudos para a elaboração do Plano Diretor do município de Alto Paraíso de Goiás, a prefeitura revelou o fenômeno de um crescimento absurdo em número de turistas que visitam e deixam milhares de dólares nos setores de comércio e serviço daquele paraíso ecológico, mas que não chegam aos cofres da prefeitura.

A Chapada dos Veadeiros, como é conhecida a região, é lugar obrigatório aos amantes da natureza. Atrai gente do mundo inteiro. Hotéis e pousadas têm diárias quatro vezes mais caras do que em Las Vegas, mas nada sobra para a melhoria de equipamentos públicos, treinamento profissional, educação, infraestrutura turística. Não há controle fiscal, muito menos consciência corporativa, entendimento de que se o município receber parte dessa renda poderá atrair mais turistas.

O mesmo acontece em Pirenópolis, outro polo de atração de turistas de Brasília, principal público que frequenta as duas cidades e despeja lá parte da maior renda per capita do país. É comum as pousadas, restaurantes e lojinhas não aceitarem cartões de crédito e mesmo débito. Só cash. Só para fraudar. Cultura predatória. Culpa que deve ser dividida.

A cultura do estelionato permeia todos os agentes: públicos – por meio das leis tributárias indecentes existentes – e privados – pela sonegação para sobreviver. Não há razão exclusiva nisso. É burrice mesmo. Nosso principal ministério deveria ser exatamente o do Turismo. Aliás, não deveria nem ser ministério, mas a principal pauta de um outro órgão denominado Ministério do Desenvolvimento, Comércio, Indústria e Salvação. Ali o turismo, que não é commodity, seria o principal assunto para a sobrevivência nacional e geração de emprego e renda em curto prazo.

O complexo de inferioridade é que leva ao modelo nacional de querer ser o primeiro em tudo. Em tudo que não interessa: plantar soja, produzir proteína animal, ser campeão mundial de futebol. Nenhum território no mundo oferece matéria prima nativa, perene, nessa proporção para a maior e mais limpa indústria do mundo, que é o turismo, capaz de atrair investimentos externos imediatos, formar mão de obra em todos os segmentos socioeconômicos em curto prazo, preservar o relevo da nossa querida residência no planeta com suas árvores e animais. E gente também, tipo índios.

No caso da Chapada dos Veadeiros, não foi possível entrevistar os extraterrestres visitantes, atrativos não classificados como flora ou fauna, mas indicados pelos grupos adeptos ao THC como frequentes na região. Folclore também é patrimônio imaterial. Gera emprego. Gera renda. Só…

Ou o Brasil troca o modal de desenvolvimento e abre concorrência internacional para a construção de um anel rodoferroviário de passageiros em todo o seu perímetro, do litoral à fronteira seca, chegando às florestas, pantanal, praia, pampas, ou continua como pobre orgulhoso que quer apenas ser o primeiro em assuntos que não vão garantir sua grandeza por muito tempo.

Melhor que ver o presidente Bolsonaro acusado por veículos de comunicação de queimar florestas, ou pela imprensa internacional de queimar o filme da primeira-dama francesa, Brigitte Macron, é torcer para que um daqueles ETs da Chapada dos Veadeiros apareça e exclame em bom português: “Chega de estelionato! Nem nós aguentamos mais.”

A galera de Alto Paraíso, que afirma que Woodstock não morreu, diz que também não aguenta mais ouvir o C-3PO e o R2-D2, quando descem das estrelas e comparecem para um chazinho de ayahuasca coletivo, prometendo que se a situação não mudar eles vão embora de vez da Terra. É mesmo difícil fazer o mais fácil… Só…

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