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Comédia pastelão

Vale-tudo para dominar Câmara terá preço alto

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Autor/Imagem:
Wenceslau Araújo*

Sem sinopse, enredo, direção e com artistas de segundo e terceiros escalões, a comédia pastelão em que o bolsonarismo transformou o Brasil terá mais um capítulo na segunda, 1. Previsível, a cena das eleições para presidentes da Câmara e do Senado deve ampliar o rebanho de robôs japoneses (transformes) e, em maior proporção, reduzir o número de telespectadores fiéis ao novelão. Os aprendizes de feiticeiro, com apoio do investidor master, criaram um dramalhão mexicano para convencer os indecisos. Definida há meses, a tônica futura do script dos “novos” bolsonaristas é o din din prometido pelo governo. Sem cascalho, nada feito. É a velha nova política.

O resultado pode ser a senha que o presidente Jair Bolsonaro precisava para estartar seu próximo salto: o da reeleição em 2022. Na realidade, é só mais um pulinho, porque a campanha de fato começou no primeiro dia do atual mandato. Em síntese, o sonho do Palácio do Planalto começou lá atrás, ainda como deputado federal. Portanto, nada mais natural do que afirmar que ele não admite sonhar em abandonar o osso. O grande cenário do presidente será a vitória do deputado Arthur Lira (PP-AL), em quem ele investiu mais do que devia ou podia e cujo retorno será o imediato alinhamento ao Planalto.

O próprio Bolsonaro, cuja língua coça bem antes de sair da boca, adiantou que, vencendo, Lira será “o segundo homem do Executivo”. Os conterrâneos de Lira não viram com bons olhos essa afirmação, pois a maioria dos eleitores de Alagoas nunca o imaginou além da Câmara, com apoio da minoria. Sobram adjetivos impublicáveis e falta-lhe cacife, respeito e votos na terra dos marechais e de Zumbi dos Palmares, estado de gente bonita, ordeira e hospitaleira, de praias de areia branca repletas de palmeiras, lagoas cristalinas e recifes de corais decorando um dos mais belos litorais do país. O deputado também precisa ser apresentado ao Brasil, como foram Deodoro da Fonseca e Floriano Peixoto, os dois primeiros presidentes brasileiros. O povo quer saber o que esperar de quem serviu aos últimos governantes com dedicação, maestria e a esperteza de um lorde. Seu objetivo é caçar o poder com todas as armas.

As fichas foram apostadas. O problema é que os russos – sempre eles – ainda não sabem que têm de descarregar votos em Artur Lira. Como a votação é secreta, não esqueçamos de que trair e coçar é só começar. Então, não se deve cantar de galo antes de uma batida minuciosa no terreiro. De qualquer maneira, o investimento e a interferência do chefe do Executivo já estão valendo a pena, na medida em que, tanto Lira quanto Rodrigo Pacheco (DEM-MG), candidato favorito à presidência do Senado, fecharam posição contra qualquer possibilidade de impeachment. É esperar para ver.

Eleitores de A e de B certamente já experimentaram reveses inesperados. Ex-presidente do Supremo Tribunal Federal e do Tribunal Superior Eleitoral, o ministro aposentado Nelson Jobim dizia em suas palestras que, após o advento da urna eletrônica, as pesquisas eleitorais deviam ser analisadas somente como inspiradoras e não como algo definitivo. Em outras palavras, a vitória só deveria ser “cantada” após a contagem criptografada do último voto. De acordo com Jobim, churrasco antecipado pode acabar chocando a cerveja.

A se confirmar a expectativa do grupo bolsonarista da Câmara, o principal derrotado dessa contenda será o deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), hoje o grande adversário do presidente da República, com apoio irrestrito da bancada petista. Mordido, ferido e com sequelas irreversíveis, Maia deve ser dos mais participativos na oposição. Antes mesmo do resultado, ele já expôs uma das fraturas incluídas na fatura do impulsionamento da candidatura oficial. A primeira delas é o repasse, com porteira fechada, do Ministério da Saúde ao PP e a recriação ou não dos inexpressivos ministérios da Cultura, dos Esportes e da Pesca. Tudo para garantir uma boquinha aos novos aliados e tentar reverter uma expressiva queda de popularidade.

Presidente, já se deu conta de estar fazendo igualzinho àquele que o senhor e seu rebanho chamam de corrupto e ladrão? Então, como explicar a seus eleitores sem cordinha que o Brasil de hoje é diferente? O valor do servicinho para eleger Lira é muito mais robusto. A liberação de emendas extraordinárias custará aos combalidos e comprometidos cofres públicos algo próximo de R$ 20 bilhões. É uma quantia bastante razoável, mas realizável no novo normal do toma lá dá cá, negociata inventada pelo falecido deputado Roberto Cardoso Alves. Apenas a nomenclatura era diferente. Como na oração de São Francisco, Robertão lembrava diariamente ao então presidente José Sarney que “é dando que se recebe”. Sarney sempre atendia.

Já li sobre a possibilidade de Rodrigo Maia assumir a chefia da Casa Civil do governo João Dória, consequentemente o comando político da campanha do governador paulista à Presidência. Pode ser balão de ensaio, mas o radicalismo do presidente contra adversários não é especulação. Com certeza, esse mesmo extremismo deverá ser utilizado por Maia e quem ele apoiar para combater tudo que já foi produzido desde o início do governo de Jair Bolsonaro. E não foi pouca coisa. Munição – e não pólvora seca – os competidores deverão ter de sobra.

*Wenceslau é jornalista

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