Deixa ele pra lá
Máscara evita Covid e renega cloroquinistas
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emEm qualquer conta de somar, dividir ou multiplicar, o resultado é o mesmo: ainda que associada à ivermectina e à hidroxicloroquina, a tal da cloroquina não tem efeito algum sobre o coronavírus. E não adianta a indicação do líder, ídolo, mito ou similares. É mentira assegurar o contrário. Como afirmou a microbiologista Natalia Pasternack em depoimento à CPI da Covid, apesar de testado em animais e humanos, o medicamento não atingiu a eficácia decantada pelo homi. Segundo a médica, o experimento só não alcançou as emas – imagino que as dos Palácio da Alvorada – porque elas fugiram. Em resumo, de acordo com evidências científicas, a cloroquina só funciona quando testada em tubo de ensaio. Portanto, é remédio para fundamentalista ou potencial suicida.
Como quero vida longa, tenho horror a tubaínas e uso máscara até para escrever. De concreto, com números cada vez mais trágicos para nossa cômica realidade pandêmica, caminhamos celeremente para atingir à marca de 500 mil mortos pela Covid. É uma indesejável segunda colocação, na medida em que tivemos tempo e oportunidade para refletir a respeito da letalidade da doença e tentar evitar o colapso que enfrentamos. Levamos meses – na verdade o ano inteiro – discutindo a razoabilidade da aplicação de tratamentos precoces sobre uma doença desconhecida, silenciosa e que o mundo inteiro jamais cogitou utilizar. Governo, ministros seguidores sem conhecimento de medicina aprovavam, mas médicos, cientistas e até curandeiros questionavam a eficácia da dona cloroquina.
Temos uma população cerca de sete vezes menor do que a Índia. Se compararmos, somos um microcosmo. Ainda assim, temos quase 150 mil mortos a mais do que o gigante do Sul da Ásia. Hoje, um ano e quatro meses depois e 17,5 milhões de casos registrados, a maioria dos brasileiros tem certeza da ineficácia da medicação. O problema é justamente a minoria, que continua acreditando e consumindo os medicamentos. Nada mais normal, considerando que a ordem de consumo partiu de cima. Como negar uma determinação superior, principalmente quando o chefe afirma fazer uso do que recomenda? É a mesma coisa que, sem argumento plausível, rejeitar uma refeição carinhosamente produzida pela mãe. Para esses, mais relevante do que os óbitos é o volume dos que conseguiram sair do outro lado.
Para apoiadores sem luz, é uma questão de semântica. Certamente não há números comprobatórios, mas improvável que, entre nossos mortos, não haja dezenas, centenas, talvez milhares de usuários de cloroquina. Conheci vários deles. Para os familiares, restou a dor, porque o corpo, o vírus e o negacionismo não perdoaram. Não acreditaram na ciência e, após dias de sofrimento, viraram estatística. A demorada e quase escanteada decisão da compra de vacinas testou quatro ministros da Saúde. Imagino que, com uma exceção, eles devem ter tentado convencer o chefe. Não foram ouvidos e pediram o boné. A exceção foi defenestrada. Alarmantes e assustadores para o planeta, 487,5 mil mortes não tiraram apenas a alegria do povo brasileiro. Resultaram num inesperado e economicamente oneroso isolamento.
Contra a vontade da maioria dos brasileiros, as palavras e gestos debochados sobre o vírus, sua origem, a máscara e as restrições transformaram o Brasil em pária do mundo. Uma lambança diplomática sem precedentes. Por isso, faço minhas essas sábias palavras: “Mais do que lavar as mãos, o mundo precisa lavar o coração, a alma, a mente, a consciência e o espírito”. Em resposta a um discurso presidencial baseado em relatório inexistente sobre o quantitativo de mortes, o governador “gordinho” e gente boa do Maranhão, Flávio Dino, sapecou uma outra frase singular: “O barco está afundando e o capitão manda tirar o colete”. É bem por aí. A trajetória de vida do mito dispensa spoiler. Ele mesmo entrega a rapadura. Onde quer que esteja, abrir a boca é sinônimo de um clique sem flash. Nada se aproveita. Se puder, também use máscara para combater a cloroquina e calar todos que a receitam.