Antipatia e mediocridade
Pernas de pau do futebol e perebas da política unidos contra o Brasil
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emAinda perplexo com o sofrível futebol da Seleção Brasileira, volto ao tema apenas para ratificar que não sou contra o escrete canarinho, tampouco tenho qualquer tipo de rejeição pela minha Pátria. Embora alguns poucos teimem em torcer pelo fim da democracia, aposto suados tostões que, como eu, a maioria esmagadora realmente é patriota e tem ojeriza por ditaduras. Meu problema – e acho que o de expressivo quantitativo de compatriotas – é antipatia pelo comportamento medíocre do nosso “craque” e pela forma de governar para meia dúzia do capitão brasileiro. Na dúvida sobre minha conduta diante da televisão, preferi apenas ouvir falar a respeito da derrota para o aguerrido time de Lionel Messi. Foi melhor assim. Pelo menos não tive o desprazer de novamente assistir a melancolia em que se transformou o antigo melhor futebol do mundo.
Devidamente vacinados, os patriotas de chuteiras multicoloridas e penteados multinacionais trocaram o orgulho do manto verde e amarelo por um punhado de euros. Nada contra o justo reconhecimento pelo trabalho profissional, mas tudo a favor do país que os formou e, bem ou mal, lhes deu educação e um mínimo de condições para alcançar a merecida vitória. Inaceitável é ouvir – sem poder reclamar- as críticas desses patriotas aos que discordam dos métodos ditatoriais e familiares do timoneiro do claudicante selecionado político-administrativo. São os mesmos críticos que um dia passaram dificuldades, conhecem os problemas dos vizinhos de suas antigas comunidades, mas adoram ostentar as cores de seus clubes europeus, os novos penteados e, vez por outra, fazem o favor de pousar de helicóptero na concentração de Teresópolis para “emprestar” algum conhecimento futebolístico ao combalido Brasil.
Sem nenhum orgulho, é claro. Talvez uma obrigação ou a exclusiva necessidade de cumprir contratos. Nunca a altivez, o brio, a ufania ou a honra que tiveram Pelé, Coutinho, Garrincha, Vavá, Pepe, Rivelino, Gerson, Jairzinho, Clodoaldo, Zico, Falcão, Sócrates, Cerezo, Roberto Dinamite, Careca, entre centenas de outros reconhecidos craques. Não demora e até o favor estará por um fio. Hoje, além de arranhar na língua de origem, poucos dos nossos patriotas expatriados lembram pelo menos uma estrofe do Hino Nacional. Entretanto, cantam com desenvoltura os hinos dos países que escolheram para viver e representar. Na Eurocopa encerrada domingo (11), três jogadores brasileiros estavam italianos, dois eram russos, um espanhol e outro português.
Novamente nada contra. Todavia, qual o direito ou os valores utilizados por esses caras para cobrar de um verdadeiro patriota louvores ao governo Bolsonaro? As evidências de abandono político são cristalinas. Milhões de brasileiros não têm emprego, passam fome, morrem por falta de vacinas e assistem diariamente uma avalanche de denúncias de corrupção envolvendo pessoas que, com as mãos sobre a Bíblia, juraram honestidade. E não podemos reclamar? Temos de fingir que nosso Brasil continua lindo, maravilhoso? Torcer contra é ignorar o sofrimento do povo? Será que somos antipatriotas apenas porque resolvemos reagir ao autoritarismo e à inércia de um governo que nos prometeu mundos e fundos? Até quando teremos de agir como marionetes? Quantos sobreviverão?
O mais triste é sermos levianamente criticados por determinados pernas de pau que, mesmo milionários e com alguma influência, são incapazes de usar os holofotes de celebridade para ajudar as pessoas que nasceram e permanecem sofrendo no país que eles dizem amar. Sinceramente, não torci contra a Seleção Brasileira, mas não lamentei a vitória da Argentina pela mesma razão que a anunciada por aqueles que não tiveram medo de contrariar Neymar Junior e companhia. A Copa América nos foi imposta politicamente. Imaginei a vitória brasileira como um recuo no tempo, mas precisamente ao início dos anos 70.
Vivíamos uma época de euforia militar e de ufanismo descontrolado. O futebol era o ópio do povo, consequentemente a melhor forma de silenciar os insatisfeitos. Portanto, a vitória dos hermanos acabou representando uma derrota para Jair Bolsonaro. Além de confirmar para o mundo nosso despreparo futebolístico – o político todos já sabiam -, no fim e ao cabo o resultado foi justo, merecedor e, sobretudo, satisfatório do ponto de vista folclórico. Perdemos, mas descobrimos que uma força superior nos protege mesmo contra nossa vontade. A turbulência continua, mas a rota está sendo ajustada. Não veio o décimo título da Copa América, apelidada antes de seu início de torneio da morte. Los hermanos levaram a taça, mas orgulhosamente Deus continua sendo brasileiro. No apito final, ficou claro que a união dos pernas de pau do futebol com os perebas da política deixaram o Brasil na lona.