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Bajulação explícita

Jovem Pan deixa de fazer notícia e vira bolsonarista

Publicado

Autor/Imagem:
Wenceslau Araújo

Outrora uma rádio isenta, com profissionais corretos e preocupados exclusivamente com a notícia e sempre na linha de frente do radiojornalismo, a Rádio Jovem Pan transformou-se no maestro da desafinada banda de besteirol do presidente da República. Panfletária e repetidora de fake news, a emissora, que já “ancorou” vários mandatários, esquece que em um ano e meio os ares do país serão outros. Como explicar aos ouvintes sem fanatismo a desnecessária, fajuta, desproposital, explícita e cara bajulação ao mito? Será difícil. Na melhor das hipóteses, levará tempo. A campanha da Jovem Pan e os editorias radiofonizados de seu principal dirigente jornalístico em favor do voto impresso beirou as raias do ridículo.

As exceções na Jovem Pan de hoje são raríssimas. Uma delas, José Maria Trindade, é originária da cidade mineira de Medina e responde pelo melhor momento da emissora no anedotário político de Brasília. Em uma entrevista coletiva do presidente Fernando Henrique Cardoso, Zé era o segundo na lista de jornalistas inscritos. O primeiro, Laerte Rímoli, representava a CBN, novíssima no cenário nacional. Antecedendo à pergunta, era praxe a apresentação dos entrevistadores, consequentemente dos veículos a que pertenciam. Macaco velho, Rímoli pegou o microfone, disse seu nome e, no momento de apresentar a emissora, lembrou que faltava um importante complemento. Criou na hora. “Laerte Rímoli, da Rádio CBN, a rádio que toca notícia”. Estava criado um dos bordões mais fortes do radiojornalismo nacional.

Não menos malandro, com doutorado em mineirêz, mas também sem uma marca, na sua vez, Zé, microfone à mão, apresentou-se: “José Maria Trindade, Rádio Jovem Pan, a rádio”. E ficou. A história até hoje é lembrada quando se busca uma das melhores fases do jornalismo político brasileiro. O tempo passou e a emissora paulista atualmente não passa de arremedo do que foi a TV Globo na ditadura militar. Eles mandam e nós obedecemos em nome de nosso caixa, de nossa volúpia comercial e da garantia de poder. A linha editorial, os telespectadores e os ouvintes que se danem. É assim que funciona. Conseguem ser piores no jornalismo chapa branca do que a Empresa Brasil de Comunicação (EBC), holding da TV Brasil, quintal da família e dos apoiadores de Jair Bolsonaro quando querem fazer apologia à violência, ao incitamento e ao escárnio.

Curioso é que esse mesmo grupo criticava os governos Lula e Dilma quando esses usavam a então TV Pública para detalhar ações administrativas. Infelizmente, o tempo deteriorou o jornalismo. Nem mesmo a derrota da PEC sobre a palhaçada da auditagem do voto arrefeceu os ânimos bolsonaristas da turma da rádio. Logo após a oficialização do resultado negativo para o governo, o radialista Paulo Mathias, apresentador do programa 3 em 1, colocou no ar uma enquete com a seguinte pergunta: “Apesar da derrota da PEC do voto impresso, você acha que o aprimoramento no sistema de votação deve ser esquecido?”. Não perdi tempo em saber do resultado, principalmente porque obviamente seria o deles.

Ideólogo da direita, suposto jornaIista, demitido por onde passou e denominado pelo governador João Dória de principal vassalo de Bolsonaro, Rodrigo Constantino é atualmente comentarista de ponta da Jovem Pan. Acostumado a meter os pés pelas mãos, há cerca de um ano e meio ele foi afastado do grupo Record, após um comentário maldoso sobre estupro, na verdade uma defesa gratuita do estuprador. Desnecessário discorrer sobre as razões. Recentemente o ministro das Comunicações, Fábio Faria, genro do Homem do Báu, saiu em defesa da rádio, afirmando que ela é essencial. Tendenciosa como é, só se for para o governo do capitão. Para o Brasil e para São Paulo deixou de ser faz tempo. A queixa do ministro tem a ver com a CPI da Covid, que requereu a quebra do sigilo bancário da difusora do Planalto. Onde há fumaça há fogo.

É claro que o país precisa de diversidades ideológicas e posições políticas diferenciadas. Faz parte do jogo, desde que haja algum pudor. Chapa branca não pode ser nunca sinônimo de bajulação explícita. É preciso um mínimo de jornalismo. Roberto Marinho, Assis Chateaubriand e Samuel Wainer “serviram” a determinados governos, mas, com maestria, fizeram jornalismo e souberam colher dividendos e centenas de milhares de leitores, ouvintes e telespectadores. Ao contrário de outros tempos, a Jovem Pan perdeu principalmente a credibilidade. Como respeitar uma empresa de comunicação popular que, após o fracasso da PEC do voto impresso, a maior derrota do presidente na Câmara, teve o desplante de colocar no ar que a derrota “foi uma vitória moral de Bolsonaro”?

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