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CPI da Pandemia

Governo fecha os olhos e aceita fiança de banco fake

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Autor/Imagem:
Bartô Granja, Edição - Com material da Agência Senado/Foto de Edilson Rodrigues

“Escabroso”, “contraditório”, “demolidor” foram alguns dos adjetivos usados pelos senadores para qualificar o depoimento desta quarta-feira (25) na CPI da Pandemia. O depoente foi Roberto Pereira Ramos Júnior, diretor-presidente da FIB Bank — empresa apresentada como garantidora de crédito da Precisa Medicamentos na malograda compra da vacina indiana Covaxin.

O senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), vice-presidente da CPI, afirmou ter sido, “de longe, o depoimento mais contraditório desta comissão”. O senador Renan Calheiros (MDB-AL), relator, qualificou o depoimento de “escabroso” e lembrou que o negócio foi paralisado graças à CPI. A senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA) disse que nenhum outro depoimento foi “carregado de tantas irregularidades”.

O senador Jorginho Mello (PL-SC) qualificou a atuação da empresa de “golpe”, “tramoia” e “picaretagem”, mas elogiou o governo por não ter fechado o negócio. Marcos Rogério (DEM-RO) também louvou o governo federal pelo fato de não ter ocorrido a compra da Covaxin.

Apesar do nome, a FIB Bank não é banco ou instituição financeira. O questionamento da CPI concentrou-se na falta de credenciais da empresa para avalizar um negócio da ordem de R$ 1,6 bilhão com o Ministério da Saúde, diante de várias possíveis ilegalidades em sua constituição e operação.

— O pior é que coloca o nome de banco e nem banco é! A fake news começa aí! — indignou-se o presidente da CPI, senador Omar Aziz (PSD-AM).

Também indagou-se sobre o papel do advogado Marcos Tolentino, apontado como verdadeiro dono da FIB Bank e ligado ao líder do governo na Câmara dos Deputados, Ricardo Barros (PP-PR). O nome de Barros foi citado em negociações de vacinas com o governo brasileiro suspeitas de irregularidades. Roberto Pereira limitou-se a dizer que Tolentino é advogado de Ricardo Benetti, dono da empresa Pico do Juazeiro, uma das atuais sócias da FIB Bank.

Em diversos momentos, Roberto Pereira afirmou desconhecer pessoas envolvidas nos negócios da FIB Bank (até mesmo Francisco Maximiano, dono da Precisa), ou não dispor dos documentos necessários para responder as perguntas do relator, encaminhando as solicitações aos departamentos comercial e jurídico de sua empresa. Ao lhe perguntarem sua remuneração, o depoente pediu para prestar a informação por escrito após a reunião.

— Estamos diante de uma situação que é a cara do governo Bolsonaro — avaliou Humberto Costa (PT-PE). — Tudo é feito com ausência de cuidado, sem qualquer preocupação com a coisa pública, feito por pessoas e por empresas que não têm idoneidade — afirmou.

Renan Calheiros chegou a cogitar que a CPI prendesse o depoente, mas Omar Aziz ponderou que perjúrio não seria fundamento para a prisão.

Roberto Pereira reconheceu que a FIB Bank nasceu como shelf company. O senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) explicou que o termo em inglês (que significa “empresa de prateleira”) designa empresas constituídas em cartório apenas para serem revendidas a quem queira possuir uma pessoa jurídica sem enfrentar burocracia.

— A empresa de prateleira é um mecanismo para enganar os clientes e dar a impressão de que se é uma empresa sólida, para participar, por exemplo, de uma licitação — esclareceu Alessandro.

Simone Tebet (MDB-MS) fez uma detalhada exposição das “artimanhas” da FIB Bank ao longo dos anos, a começar pelo uso de “laranjas” como sócios.

— O contrato da Covaxin era fraudulento. Faltavam partes, [havia] valores para serem pagos em paraíso fiscal por quem não fazia parte da assinatura do contrato, e garantia de um banco que não era banco — afirmou Simone. — O Ministério da Saúde é tão ou mais responsável por isso.

‘Vai vendo, Brasil’
Um dos momentos mais surpreendentes da reunião foi a reprodução de um áudio de Geraldo Rodrigues Machado, morador do município alagoano de Pão de Açúcar. No áudio, Machado contou que, ao tentar financiar uma moto em 2015, descobriu que era sócio da empresa.

— Está vendo, Brasil? — exaltou-se Renan Calheiros, usando uma expressão repetida em vários momentos da reunião.

Também causou surpresa o valor da avaliação de um terreno em Curitiba incluído no capital social da empresa — R$ 7 bilhões de reais.

— A gente recebe muitas mensagens. Uma mensagem que eu recebi é que o Palácio de Buckingham, na Inglaterra, custa US$ 1,5 bilhão. Então, o terreno que o senhor tem dá pra comprar o Palácio de Buckingham — comparou Omar Aziz.

Convocação
Foi aprovado requerimento de Randolfe Rodrigues, convocando a depor Ivanildo Gonçalves da Silva, motoboy para a VTCLog, empresa de logística que atende o Ministério da Saúde na distribuição de vacinas e insumos para todo o país. Desde 2018 Ivanildo fez saques em espécie para a VTCLog num total superior a R$ 4 milhões.

Efeitos da CPI
O relator fez um balanço dos quatro meses da CPI. Ressaltou que, com o início das investigações, o governo federal mudou a postura em relação à pandemia de coronavírus.

— Graças à luz colocada pela CPI, o governo cancelou o contrato fraudulento da Covaxin; demitiu servidores que pediam propinas; cancelou negociações com atravessadores; comprou vacinas; parou de alardear sobre a fraude do tratamento precoce; fez influenciadores e sites de fake news apagarem posts que agravaram a pandemia; e fez até o filho negacionista do presidente se vacinar e postar nas redes sociais! — afirmou, referindo-se ao senador Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ).

Renan Calheiros anunciou que mais três depoentes passarão da condição de testemunhas para a de investigados pela CPI: Roberto Dias, ex-diretor de Logística do Ministério da Saúde; Francisco Maximiano, dono da empresa Precisa Medicamentos; e Emanuel Catori, sócio da empresa Belcher Farmacêutica.

Renan confirmou ainda que deve entregar o relatório final na segunda quinzena de setembro.

 

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