Escolhas erradas
Brasil rejeita Bolsonaro e aliados sofrem com o efeito dominó
Publicado
emAfirmar que o assassinato do guarda municipal Marcelo Arruda não teve conotação político-ideológica é o mesmo que dizer que é mentira da imprensa comunista o atentado do Riocentro, em 30 de abril de 1981, véspera do Dia do Trabalho. Seja de direita, seja de esquerda, seja de coisa alguma, qualquer brasileiro com mais de 40 anos há de se lembrar de um dos momentos mais negros de nossa política. A proposta era a mesma: retroceder e manter a defesa da tirania à custa de vidas. Os que lembram certamente farão uma imediata analogia com os tempos atuais, tão negros e muito mais tenebrosos do que aquela noite no Rio de Janeiro. Também chamado Caso do Riocentro, o frustrado atentado do Riocentro foi um ataque terrorista imaginado por reacionários do Exército e da PM local.
A intenção era explodir várias bombas, assustar as 20 mil pessoas que ocupavam o espaço para assistir a um show de artistas da MPB, além de obviamente provocar centenas ou milhares de feridos ou mortos. Entretanto, como agora, o objetivo era muito mais amplo do que matar quem fosse atingido pelos explosivos. A ideia era incriminar grupos que se opunham à ditadura militar e, desse modo, justificar a necessidade do seu aparato de repressão. Em resumo, o propósito final era retardar a abertura política em andamento. Para sorte do hoje povo chamado do mal, os do bem é que se deram mal. Graças a Deus acima de todos, a desastrada condução da operação acabou minando seus efeitos.
Uma das bombas explodiu longe do alvo, enquanto a outra detonou prematuramente, danificando os demais explosivos. O resultado está em todos os livros de história e na Wikipédia com a devida riqueza de detalhes. Lamentável, mas felizmente as únicas vítimas foram um sargento, que morreu na hora, e um então capitão, hoje recuperado dos graves ferimentos da obra inacabada. É claro que o Brasil foi a maior vítima daquela quase barbárie. E no que ela difere da atual? Idêntica no modus operandi e na truculência, ela é, teoricamente, diferente quanto ao público alvo. Em 1981, a esquerda era supostamente simbolizada pela massa que apostava e sonhava com a democracia.
Como os de hoje, os brasileiros ameaçados da época não se imaginavam comunas, tampouco trabalhavam ou compravam propostas socialistas, adjetivos que sempre povoaram (e povoam) a mente rasteira de quem sonha com o poder eterno. Por conta da violência dos estímulos recebidos no atual governo, o ódio de nossos dias é contra o PT, seus filiados e simpatizantes. Na verdade, também alcança os que, por razões diversas, fogem do bolsonarismo como o Diabo da cruz. Definitivamente, a escória política saiu do armário. Trata-se da turma que acha bonito ser desinteligente e não aceita a derrota, consequentemente a perda de poder. Por isso, em nome de um mito que não sabe mais o que fazer para reverter sua impopularidade, a minoria de extrema direita, o chamado povo de Deus, se acha no direito de aniquilar com os extremos à esquerda.
Não tenho filiação partidária. Entretanto, jamais deixei de, entre os certos e os errados, reconhecer os mais corretos, os menos desonestos. Na disputa presidencial, não tenho o que falar a respeito do partido do candidato que concorre à reeleição. Ele não tem um para chamar de seu. Portanto, é difícil escolher mochileiros. Embora seja uma opção pela ausência de opções, prefiro os que têm história. Nesse contexto, somos obrigados a admitir que, apesar de eventuais erros, a legenda que abriga o candidato que lidera as pesquisas sempre respeitou a democracia. Nunca incitou seus apoiadores à compra de armas para, em última análise, matar.
Entendo que, a partir violência covarde dos que pretendem manter o caos, também é necessário concordar com a tese de que o antipetismo tornou-se forte porque o petismo está cada vez mais forte. Triste ver que a briga é para saber quem é mais forte. O país e o povo são meros detalhes. Talvez não para quem até hoje jamais fugiu da covardia, da bravata e da sonolência dos tiranos. A bomba caseira com fezes do Rio de Janeiro e a morte de Foz do Iguaçu são a prova cabal de que o modus operandi do despotismo não mudou. O que mudou foi a vontade da maioria do eleitorado. É claro que Jair Bolsonaro quer o Brasil, mas o Brasil não o quer mais. Simples assim.