Virtude democrática
Trocar marmita por voto lembra que amanhã será outro dia
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emEmbora poucos acreditem, não tenho simpatia partidária, muito menos vinculação política. Claro que, ao longo da vida, admirei e segui matizes dos mais variados. O que quero dizer é que faz tempo deixei de lado os criatórios e optei pelas criaturas supostamente do bem. E elas existem. Ainda não fazem parte de minha preferência presidencial momentânea, mas estão entre nós. Sobre meu passado político-partidário, pelo menos jamais assumi ou defendi posições extremistas, tacanhas ou ditas ideológicas. Como brasileiro forjado em fatos e não em fakes, não desisto nunca. Por isso, após numerosos dissabores, decidi que a democracia será minha legenda de coração até o fim da vida física.
Esta é a razão pela qual votarei para presidente da República em um candidato cheio de defeitos, mas com a virtude de nunca ter atentado contra a soberania popular. Baseado em princípios filosóficos e, sobretudo, nos conceitos de família, descobri a tempo que decepções e cansaço não podem (e não devem) determinar posicionamentos radicais e imediatistas a respeito de nossos representantes. A bem da verdade, a política é medonha, mas alguns políticos conseguem fugir da máxima de pertencerem ao mesmo saco de farinha. Mais do que a necessidade de separar o joio do trigo, a maior descoberta chegou como quem chega do nada.
E chegou para mostrar que nem tudo está perdido, que ainda temos a possibilidade – e não é remota – de consolidarmos a paz, consequentemente erradicarmos o ódio. Craque da MPB e cheio de méritos quando o tema é a perfeição das frases, Chico Buarque musicou uma de suas várias profecias bem antes do conturbado episódio de Sérgio Moro em Curitiba: “Ele não me trouxe nada, também nada perguntou…, mas entendo o que ele quer”. Hoje, avalio a Teresinha de Julinho da Adelaide (pseudônimo de Chico) como mais uma previsão. Na canção Apesar de você, ele também se antecipou àquele que “inventou de inventar toda a escuridão…Inventou o pecado, mas esqueceu de inventar o perdão…Inventou a tristeza, mas não teve a fineza de desinventar”.
Em síntese – e aí novamente tudo a ver com o mestre Chico Buarque -, as referências são óbvias. Aparentemente arrependido, o primeiro contou suas viagens e “as vantagens que ele tinha”. O segundo lembrou o terceiro, que chegou meio sorrateiro e, como um falso profeta, “se instalou feito um posseiro”, enganando os corações de milhões de desavisadas teresinhas. E enganam debochando. É o caso de um empresário ligado ao agronegócio que, nesse domingo (11), humilhou, esculhambou e degradou uma senhora em clara situação de vulnerabilidade apenas porque ela declarou apoio ao candidato da antipatia do grosseiro cidadão, cujo trabalho social foi para o ralo da soberba e da imbecilidade política.
Ou seja, para aquele lado terrivelmente evangélico e honesto uma marmita vale um voto. O pior é que um posicionamento contrário vale o desprezo e o achincalhe. São os papagaios de pirata, cujo trabalho é repetir, ainda que sem conhecimento, tudo que ouvem ou recebem do governo do mito. Não sabem o que dizem, mas dizem e fazem. Caem em contradição, mas se levantam e novamente decepcionam. Na prática, não conseguem produzir nada a favor do mestre. São mandados e, como tal, mal e porcamente tentam de tudo um pouco contra o postulante que incomoda. Incivilizadamente se fantasiam de verde e amarelo e rudemente se acham patriotas. Teresinha e Apesar de Você foi só para lembrar a momentaneidade de minha preferência.
O objetivo final de toda essa enrolação é para dizer que a falta de simpatia é sinônimo de uma enorme antipatia por aquele candidato que, por conta das baboseiras que nega produzir diariamente, parece sofrer deliberadamente de anosognosia (esquecimento temporário).
Preocupado com as mazelas do país e simpatizante feroz da democracia sem percalços, faço meu o bordão de um candidato a deputado federal pelo DF. Ex-governador da capital da República, esse candidato é de opinião que quem já fez pode fazer muito mais. Lendo o slogan de maneira enviesada, temo pelas cacas de um eventual continuísmo. Nesse caso, melhor a consciência de que há pouca diferença entre o ter medo de tentar e o não saber governar. Daí a opção pelo virtuoso democrata.