Falsos heróis
Bom senso impera e defensores da barbárie começam a recuar
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emDepois de Getúlio Vargas, Jânio Quadros, Juscelino Kubistchek e João Goulart, poucos presidentes brasileiros mereceram mais do que pequenas citações nos livros de história. Alguns passaram do aceitável, outros conseguiram um verbete, mas muitos certamente passarão batidos. E não há sequer necessidade de nominá-los, na medida em que, embora tivessem um dia se apresentado como salvadores da pátria, nunca passaram de anti-heróis. São aqueles que obrigam os brasileiros com um mínimo de inteligência a terem certeza de que, pelo menos no Brasil, a política é realmente uma obra inacabada.
Tudo é mutável no mundo. Os dias, as tardes, as noites, semanas, meses e anos nunca são iguais. A única coisa que não muda é o modus operandis de nossos mandatários e, por que não dizer, de todos os nossos políticos. Sem medo de injustiças, não há como citar exceções. Parece que, quando decidem pela candidatura, todos são matriculados no mesmo curso de malandragem. Alguns se superam e, com um ou dois mandatos, descobrem proprietários de mansões, fazendas, carros importados, jatos e alguns imóveis no exterior, preferencialmente em Miami ou Paris. De donos de Fusca e de uma meia água nos fundos da casa dos sogros, passam rapidamente a senhores de engenho.
São os paladinos, destemidos, intrépidos, valentes e notáveis enganadores do povo. Para o contista e dramaturgo alemão Bertolt Brecht, “infeliz a nação que precisa de heróis”. Então, os heróis são desnecessários? Claro que não. Desnecessários são os falsos heróis, do tipo mitos. Em Brasília, os dois lados da Esplanada dos Ministérios estão abarrotados desse tipo de protetor, cuja proteção não passa do próprio umbigo. O problema desse tipo de audaz é justamente o que ocorre hoje na sociedade brasileira. Um grupo especializado em coisa alguma se arvorou na criação de anti-heróis, paralisou sua capacidade de ação e transformou-se em prol de um herói forjado no combate a algo que ele mesmo só conhece de ouvir dizer. Esse agrupamento se acomodou, se anestesiou ao vislumbrar a possibilidade de projetar em uma divindade surgida do nada todas as suas esperanças.
E o que aconteceu? A turma passou a se mobilizar radicalmente em defesa do tal “herói” e agora fanaticamente se acha no direito de questionar antidemocraticamente o feito democrático do personagem que se opôs ao protagonista da história encenada diariamente no cercadinho palaciano. Em uma análise mais realista, são do tipo heróis que lutam ferozmente pelos seus interesses políticos e financeiros. De forma mais rasteira e até poética, os verdadeiros heróis são aqueles que vivem nas ruas, dormem com fome e acordam sem nenhuma perspectiva. Destes, infelizmente o Brasil tem milhões. Luiz Inácio Lula da Silva ressurge como a Fênix em um país que já teve como heróis o Japonês da Federal, Collor de Mello, Eduardo Cunha, Aécio Neves, Sérgio Moro e Jair Bolsonaro.
Estamos salvos? Ainda é cedo. No entanto, talvez tenhamos condição de, em futuro bem próximo, desdizer uma antiga previsão de Rui Barbosa: “Chegamos à barbárie sem atingirmos o apogeu como nação”. Após quase quatro anos em campanha, o único dos últimos presidentes a não se reeleger, finalmente chegou ao fim a pior e mais violenta disputa presidencial de minha existência. Graças a Deus acima de tudo e de todos, os bolsonaristas não conseguiram cumprir o objetivo principal da vitória em 2018, que era exterminar todos os opositores. Seria uma chacina oficial, no melhor estilo daquela famosa dupla sertaneja do século passado: Hitler&Mussolini.
Morreram alguns aniversariantes “comunistas”, petistas mais afoitos foram esfaqueados, jornalistas da Globo Lixo eram ameaçados diariamente e até pesquisadores de opinião eleitoral foram gratuitamente agredidos. Nada de anormal para aqueles que são normalmente anormais. A exemplo de milhares de eleitores anti um e anti outro, sobrevivi para, um dia, contar que quase fui crucificado por ter escolhido um candidato fora da curva traçada por uma minoria como o caminho a ser seguido a qualquer custo. Ainda sobre os heróis, tenho muito medo dos patronos denominados moralistas. Via de regra, estes são os que mais têm o comportamento pervertido.