Asa Sul
Saudade da Prainha reaproxima o pai e a filha
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emA filha e o pai, apesar de morarem no mesmo apartamento, já não se viam há dias. Não que eles tivessem brigado, mas simplesmente os horários não eram compatíveis com encontros rotineiros. Ela, sempre ocupada com as coisas do trabalho, tentava resolver tudo pelo aparelho celular ou, no máximo, pelo computador, que parecia sempre ligado. O pai, no entanto, apesar de acordar bem cedo, demorava mais de hora na cama, talvez pensando nas coisas que não teve coragem de fazer até então.
Naquele domingo, entretanto, os dois se esbarraram na cozinha. O pai, com aquela mesma xícara de café na mão, olhou para os grandes olhos da filha. Aqueles cílios negros pareciam espantados com a fisionomia desgastada à sua frente. Ela levou um tempo para perceber que era aquele mesmo homem que, há poucas décadas, a levava nos ombros para a praiinha do Paranoá, logo ali. Trocaram um quase sorriso.
- Quer? – o pai ofereceu a xícara.
Os dois sentaram à mesa. Tomaram o café quase em silêncio soturno, se não fossem os raros tilintares das xícaras com os pires. Nenhuma palavra, enquanto o pai observava a ânsia da filha em digitar cada vez mais rápido no minúsculo teclado do aparelho celular. Ele chegou a pensar como é que ela conseguia fazer aquilo com tanta habilidade. Todavia, um estrondo, vindo lá debaixo da rua, os tirou do aparente transe.
Já na janela, pai e filha observavam o formigueiro de gente curiosa. Um acidente de carro, aparentemente sem vítimas. Vozes, vozes, vozes! Nada que pudesse ser realmente distinguível para os dois no parapeito lá em cima do bloco. Trocaram olhares, como há muito não faziam. Não precisaram balbuciar palavras. Abriram a porta do apartamento, pegaram o elevador e desceram. Passaram pela multidão, como se ela não existisse. De mãos dadas, seguiram para o carro e de lá para a prainha, aquela mesma praia, que continuava ali perto, talvez saudosa daqueles dois.