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“Ameaça comunista”

Charles de Gaulle foi, sim, o verdadeiro descobridor do Brasil

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Autor/Imagem:
Wenceslau Araújo - Foto Reprodução/Defesanet

Depois de muitos anos de estudos, consultas às mais variadas enciclopédias nacionais e internacionais e à leitura de livrões e livrinhos de história, faz algumas décadas tinha certeza de que o descobridor do Brasil era realmente o português Pedro Álvares Cabral. Acompanhado da turma do fado de Lisboa, da soja do Mato Grosso e do funk da periferia do Rio de Janeiro, Cabral teria aportado na Terra do Pau Brasil em 22 de abril de 1500. Tudo bem que o que viria a ser o Brasil já era habitado, mas os baianos, os cariocas, os pernambucanos e os gaúchos, ciceroneados pelo pessoal que embala o pó nas principais comunidades, nem se importaram com esse pequeno detalhe. Por conta da canabis plantada nos arredores do Recife, houve até um princípio de atrito entre Cabral e o holandês Maurício de Nassau.

Então líder da Rocinha, no Rio, e quase um Xandão do Sol Nascente, no Distrito Federal, Cristóvão Colombo resolveu tudo na paz. Sequer precisou usar a AR-15 de propriedade de Américo Vespúcio, exportador da cola de sapateiro para o asfalto das grandes cidades brasileiras. Estudei isso tudo como se fosse a mais pura verdade. Só descobri nesse domingo (19), também conhecido por ontem, que havia sido engambelado todos esses anos. E como descobri? Consultando meu impenetrável alfarrabo (?), apelidado pelos amigos de Google. Lendo sobre a Segunda Guerra Mundial, fui informado que, de fato, o Brasil foi descoberto pelo general francês Charles André Joseph Marie de Gaulle. Político e estadista, ele presidiu o Governo Provisório da República Francesa de 1944 a 1946.

Líder mais influente da história da França moderna, de Gaulle virou persona non grata da Terra Brasilis ao se referir, entre fevereiro e março de 1963, à nossa República na forma de galhofa. E tudo por conta da pesca de nossas pobres lagostas, iguaria só alcançada pelos ricos. Para o general, patente adorada pelos seguidores do cristianismo bolsonariano, o Brasil não seria um país sério. Ainda menino, fui um dos que, munido de uma potente e carregada atiradeira e de um bumerangue da Estrela, me alistei no Exército do mito de Curicica para literalmente derrubar o Exército francês. Confesso que, com anos de antecipação, a ideia era vandalizar o Palácio do Eliseu, pichar o Palácio de Versalhes, obrar no Museu do Louvre, enfeitar a Torre Eiffel de verde e amarelo e, se possível, depredar a Catedral de Notre Dame.

Para essa empreitada patriótica, tinha do meu lado a militância birrenta do companheiro François Mitterrand. Percebi a tempo que, nunca na história deste país, alguém disse alguma coisa tão séria sobre nossa falta de seriedade. Portanto, está claro que de Gaulle descobriu o Brasil em 1963, mas somente nesse domingo ficou evidenciado o que a maioria do eleitorado já tinha como certo: o “golpista” francês tinha razão. Se ele (de Gaulle) fosse vivo, certamente teria subido sozinho o Complexo do Alemão, de onde interromperia o jogo entre Vasco e Flamengo para gritar: Que desçam os ETs patrocinados pelos representantes do agronegócio. E, derrotados e focinhados, todos desceriam em fila indiana para se se juntarem aos patriotas que, imagino, foram os responsáveis pelas respostas absurdas e ignorantes à pesquisa realizada pelo Ipec e publicada pelo jornal O Globo.

De acordo com os números, 44% dos brasileiros concordam, parcial ou totalmente, com a afirmação de que, com Luiz Inácio, o Brasil pode se tornar uma nação comunista. É a prova cabeluda de que ignorância, burrice e imbecilidade estão inseparavelmente conectadas. Não sabem o que significa o termo comunista, mas, por determinação do Jair e sua comunidade do ódio, associam o adjetivo ao presidente Lula, que, na mesma pesquisa, teve o governo avaliado como ótimo ou bom por 41% dos brasileiros. Alucinações à parte, vale lembrar que esse mesmo público temia virar jacaré caso tomasse a vacina contra a Covid-19 e insiste com a tese de que a Terra é plana.

Nada demais para quem é capaz de confundir injeção de ânimo com inoculação no ânus e jamais conseguiu separar a grande obra do mestre Picasso do grande maçarico do mestre de obras. Para mim, um reles mortal, não resta dúvida de que duas coisas são infinitas: o universo e a estupidez humana. Melhor terminar por aqui, pois peixe e estultos cheiram mal depois de três dias. Que Cabral e todos os portugas me perdoem, mas Charles de Gaulle é o cara. Ele não disse, mas me recomendou dizer: Se a ideia dos boçais é que a nação seja ignorante e livre, nunca será. Lembrando das frases mirabolantes e de autoajuda do filósofo Jair de Curicica, diria também que quem não pensa é pensado pelos outros.

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