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Bala de Prata (II)

Retiro forçado e ar majestoso mudam o cenário de Brasília

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Autor/Imagem:
José Seabra - Foto Reprodução/Sertão Dourado

Quem afirma que baiano é preguiçoso, que só fica na rede – que o diga quem conheceu Dorival Caymmi -, está equivocado. Baiano, quando tem interesse, age rápido. De preferência obedecendo um espaço que couber na agenda dele. Foi assim na segunda-feira, 16 de janeiro, oito dias após o fracassado golpe que tentou tomar o poder das mãos de Lula.

A tarde começou nublada, com prenúncio de tempestade ao anoitecer. Nuvens esparsas iam se acumulando, sopradas por um vento sudeste numa velocidade de 15 quilômetros por hora.

– Irmão, vamos tomar o café.

– Quando?

– Agora.

– Onde? Estou de bermuda, havaianas…

– No Sudoeste.

– Ok! Estou chegando lá.

Pães e vinhos. Ali a gente costumava se encontrar para trocar algumas ideias e muitas informações.

No curto e rápido percurso de onde me encontrava, na extremidade da Asa Sul, escolhi uma música aleatória no Deezer. Não acredito em coincidências, mas minha intuição costuma deixar-me mais atento. A voz de Luiz Gonzaga, já rouca, com o som da sanfona ao fundo.

Acauã, acauã vive cantando/Durante o tempo do verão/No silêncio das tardes agourando/Chamando a seca pro sertão…

Agouro, verão pelo meio do caminho, ainda distante do outono que marcaria a volta do Gordinho à sua cadeira. As águas de março já teriam passado; e as folhas secas começariam a ser pisoteadas na mansão do Lago Sul.

É verdade. Baiano, quando quer, chega rápido. Estacionei o carro na vaga reservada a idosos. Ao fundo da varanda, na última mesa, lá estava ele.

– Irmão, precisamos de ajuda. A Leoa está indócil. Com o Gordinho afastado, ela pode usar suas garras e dar um golpe. O zum zum zum indica que vem pedido de impeachment para os distritais resolverem.

– Não creio nessa teoria da conspiração, respondi. E sentenciei: Ela não tem metade dos votos (entre os 24 deputados da Câmara Legislativa) para isso. Chegar a dois terços, então, é impossível.

– Não, não, não. Há algo de estranho no ar. Não tenho acesso a ela, que anda cercada de amadores.

– Como ele está?

– Preocupado com ela, que tem circulado com o nariz empinado. Eu mesmo vi isso quando estive na casa dele, junto com o Conselheiro. Era a gente chegando, ela saindo. Mal nos olhamos quando cruzamos no jardim. Os olhos dela brilhavam. Tinha um sorriso majestoso, de vitoriosa.

– No dia do ataque golpista?

– Sim. Ele estava desnorteado. Eu e o Conselheiro conseguimos convencê-lo a muito custo a gravar o vídeo em que se desculpava com o presidente e com o povo de Brasília pelos atos de vandalismo.

– Vândalos, não – interrompi. Terroristas.

– Vai poder ajudar?

– O que você quer?

– Contra-atacar.

– Não tenho informações.

– Temos artilharia. Precisamos fragilizá-la. Se for preciso, arranjamos uma bala de prata para um tiro certeiro na testa dela.

*Essa narrativa é baseada em fatos reais. Na quarta-feira, 14, o terceiro capítulo.

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