Simbologia da pena
Xandão não refresca e dá ao golpista o mesmo 17 de Jair em 2018
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emA simbologia golpista pregada por Jair Bolsonaro durante quatro anos não serviu apenas como plataforma para a eleição de 2018. Na verdade, foi a senha para um bando de degenerados e bandidos de quinta categoria se associar a financiadores sem escrúpulos e programar para 2022 a tomada de governo pela força. Fora da curva para os autointitulados patriotas embandeirados, a eleição de Luiz Inácio antecipou a empreitada.
O dia 8 de janeiro de 2023 seria a glória para os profetas do apocalipse. No entanto, o Domingo no Parque terminou em catástrofe para uma turba de bobalhões neonazistas, fascistas, negacionistas, arrogantes e imbecis. Tão estultos que, narcisicamente, usaram à exaustão o celular como produtor de provas contra si.
Antes de detalhar os efeitos do vandalismo e já pedindo desculpas pelo tamanho da narrativa, vale registrar que, enquanto esse povaréu era preso após o fracassado levante, o autor intelectual do golpe passeava pelos Estados Unidos, onde tentava negociar joias que não eram suas. Pois o principal efeito foi o mesmo de um litro de purgante pós-ingestão de dois quilos de rabada com agrião.
Um dos milhares de executores do golpe simbolicamente articulado no dia da posse de Jair Bolsonaro entrou na quarta-feira (13) para o Guinness Book escrito desde 8 de janeiro pelo ministro Alexandre de Moraes, o Xandão da Paulicéia Desvairada. As antigas faixas autorizando Jair a golpear a democracia foram substituídas por Eu me…lasquei.
Recolhido preventivamente na Papuda, um ex-servidor da Sabesp foi o primeiro réu a ser julgado pela invasão e depredação de prédios públicos durante os atos golpistas do início do ano. Se depender de Xandão, Aécio Lúcio Costa Pereira será condenado pelo Supremo Tribunal Federal a uma pena de 17 anos, sendo 15 anos e seis meses em regime fechado.
Não sei se coincidência ou mais uma das cutucadas do xerife do STF no mito de pornochanchada, o sujeito ficará trancafiado 17 anos, o mesmo número com que Bolsonaro concorreu e ganhou a eleição de 2018. Ingênuo, burro ou ignorante, o tal Aécio e seus asseclas sabiam exatamente o que estavam fazendo e o que poderiam gerar a partir da barbárie que produziram.
Talvez tenham sido enganados pelo líder das arábias. Também não acredito, mas é possível, considerando a defesa simbolicamente veemente que um desembargador aposentado fez, “gratuitamente”, do tal Aécio. Travestido de advogado, o causídico protagonizou cenas dantescas na tribuna do plenário do STF. Com todo respeito ao tempo em que vivi nos três principais tribunais superiores, avaliei a sustentação oral do “adevogado” como um atestado antecipado de condenação.
Em resumo, aceitar ingenuidade e ignorância é muito mais fácil do que engolir o “terraplanismo”, o negacionismo, a arrogância e as estultices de quem deveria mostrar algum conhecimento para fazer o que se propôs. Assistindo ao início do julgamento dos envolvidos na barbárie, consegui sentir um misto de ojeriza e vergonha pelo que ouvi.
Demonstrando absoluto desconhecimento do caso, o doutor começou pelo fim. Esquecendo que ele não era o réu, primeiro fez sua própria defesa. Na sequência, transformou em iniciais tudo que o STF já havia decidido em abril. Ou seja, logo de cara perdeu por não reconhecer o respeito da beca em relação ao poder da toga. Desinteligência jurídica provavelmente não foi.
Pouco familiarizado com os julgamentos da Corte Suprema, onde, segundo ele mesmo, costuma estar em todas as posses, o padroeiro do golpista deixou claro sua preferência pelos convescotes às duas aulas ministradas semanalmente pela maioria dos ministros da Casa, inclusive e sobretudo por Alexandre de Moraes, com quem chegou a bater boca e, bem antes do julgamento, havia ameaçado de prisão.
Quem diz o que quer, ouve o que não quer. Foi o que ocorreu após o jurisconsulto “sugerir” que o julgamento era político e que Xandão se declarasse impedido de votar no caso do angelical Aécio.
“O negacionismo obscuro de algumas pessoas faz parecer que, no 8 de janeiro, tivemos um Domingo no Parque…É tão ridículo ouvir isso, que a OAB não deveria permitir”, ironizou o ministro, relator das ações contra os bandidos que se associaram às autoridades do frustrado golpe.
Se a intenção do referido jurista era santificar o cliente, o dito pelo não dito em plenário serviu para demonizar ainda mais o protegido.
Parafraseando Xandão, é lamentável que um juiz de passado até razoável tenha tentado mostrar aos togados superiores que seu afilhado político confundiu a Praça dos Três Poderes com o Hopi Hari, com a Disney ou com a Casa da Mãe Joana. O ápice da ópera bufa foi ele encerrar a sustentação lembrando aos ministros que eles são as 11 figuras mais odiadas do Brasil.
Talvez o doutor esteja certo se estiver considerando a avaliação dos parceiros signatários da tese golpista e das viúvas negras da eleição de Luiz Inácio, provavelmente seu inimigo número um por jamais tê-lo imaginado além do TJDFT. Coisas de gente ciumenta. Diante do pouco a acrescentar ao que já foi dito, o causídico perdeu a grande chance de ficar calado. Afinal, o peixe morre e apodrece pela boca.
Felizmente, a vida costuma ter os dois lados. Isso quer dizer que, para os brasileiros do bem, da paz e da alegria, o tutor do golpista também foi incluído na lista dos mais odiados suspeitos de incitar atos golpistas.
Pode ser exagero, mas, tão de repente como suas preces contra Xandão, o padroeiro do vândalo se tornou alvo de apuração no Conselho Nacional da Magistratura (CNJ), que, inclusive, determinou a quebra do sigilo bancário dele entre agosto de 2022 e 8 de janeiro de 2023.
Será que, mais uma vez, teremos de admitir a veracidade do ditado popular que diz que de onde menos se espera é que surgem as maiores decepções?
Sem novidade alguma, o ministro Nunes Marques não reconheceu elementos suficientes que configurem crimes de associação criminosa, golpe de Estado e abolição violenta do Estado Democrático de Direito. O Brasil inteiro viu, mas sua excelência provavelmente estava sem os óculos. O julgamento recomeça nesta quinta (14), às 9h, quando o Brasil e o mundo esperam posicionamentos menos subservientes.
*Mathuzalém Júnior é jornalista profissional desde 1978