Intifada patriótica
Pizza ou pipoca, CPMI estourou como fuzuê na oposição
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emCraques na arte de sugerir e de instalar comissões parlamentares de inquérito, os nossos briosos e eficientes deputados e senadores só pecam na hora de concluí-las. Algumas até alcançam o meio do caminho, como foram as CPMIs do Mensalão, do Orçamento, que chegou a cassar mandato de seis deputados envolvidos em esquema de corrupção e, mais recentemente, a da Covid, cujo relatório final foi arquivado a pedido do ex-engavetador-geral Augusto Aras. O Supremo Tribunal Federal levou o resultado para as calendas. Em resumo, após exaustivas discussões relativas ao sexo dos anjos e muita firula política, raramente o destino das comissões é o esperado pelo povo brasileiro. Quando isso ocorre, emperram nos gabinetes do Ministério Público ou do Judiciário.
Vem daí o simbolismo da pizza, surgido no futebol na década de 60. Uma crise no Palmeiras, clube que não tem título mundial, juntou dirigentes de várias correntes do clube em uma reunião que durou quase 15 horas. Após muita discussão (provavelmente sobre o peso do Flamengo), todos, com muita fome, foram até uma pizzaria, ao lado da sede do Verdão, no bairro paulistano das Perdizes. A paz reinou de modo absoluto depois de barris de chope, palavrões em português, latim e italiano e 18 pizzas tamanho gigante. Contam que Milton Peruzzi, um dos ícones da crônica esportiva da época, escreveu e publicou matéria com a seguinte manchete: “Crise no Palmeiras termina em pizza”. Portanto, graças ao “Porco”, o termo se popularizou como sinônimo de não vai dar em nada.
Infelizmente, a máxima é corriqueira. Quando uma CPI entra no radar da política nacional é comum o presidente e o relator, em “reuniões” com a imprensa, prometerem fechar o cerco sobre os investigados. No entanto, o forno é aceso logo após o início dos debates. Enquanto um ou mais parlamentares abanam o fogo, o pobre do eleitor, também conhecido por contribuinte, é enrolado ao vivo, em cores e em rede nacional. Criadas este ano, já sob o pastoreamento de Luiz Inácio, que nada tem a ver com as CPIs, as comissões que investigam as invasões do MST, as fraudes com moedas digitais e as manipulações em partidas de futebol foram encerradas sem indiciamento de ninguém. Ou seja, ficou o dito pelo não dito. E ponto final, sem reticências.
Sedutoras Algumas das dezenas de CPI ou CPMI (mistas) começam seduzindo ou irritando eleitores. Foi assim com a última delas, a CPMI dos Atos Golpistas, popularmente chamada de 8 de Janeiro. Provavelmente não será diferente das demais e não mostrará o que a sociedade brasileira precisa ver e saber, principalmente a respeito daquelas “cabeças pensantes” que quase sufocaram nosso sofrido regime democrático. Não sufocaram porque lhes faltou o que nunca tiveram: inteligência. É claro que, para muitos, melhor que ninguém saiba nada. Talvez sejamos salvos pela Polícia Federal, cuja direção tem todos os nomes, inclusive os dos mentores, dos arquitetos, financiadores e executores dos atos terroristas.
Sugeridas pela oposição, que imaginou jogar no colo de Luiz Inácio a culpa pela barbárie de 8 de janeiro, as investigações quase concluíram que o culpado de tudo foi o extraterrestre visto comendo pão com bolo e maionese nos acampamentos patriotas das principais capitais brasileiras. No entanto, os oposicionistas do colegiado engoliram a poeira do ministro Flávio Dino, que descumpriu “ordens” dos deputados e senadores, e viram o despejo de luz em cima de autoridades que por meses estiveram escondidas nas sombras. Igual ao das demais, o resultado da comissão talvez seja pífio, mas já jogou mais lama do que louros naqueles que a propuseram. Policiais federais, sargentos, majores, coronéis e generais ficaram expostos, perderam o controle e o respeito e acabaram entregando a rapadura. Ou seja, a pizza pode até ir para o forno, mas, antes, vira pipoca e vai estourar na boca de muitos seguidores do mito Gargamel.
A CPMI será encerrada esta semana com 27 depoimentos pendentes e 1,3 mil requerimentos sem análise. De todo modo, aliado ao silêncio ensurdecedor de alguns, as delações, os números e as provas recolhidas e à disposição da relatora Eliziane Gama (PSD-MA) já são suficientes para provocar um fuzuê na república golpista. Ou seja, apesar do forno aceso, vem chumbo grosso, independentemente da decisão do ministro Nunes Marques, que suspendeu a quebra dos sigilos telemático, telefônico, fiscal e bancário de Silvivei Vasques, ex-diretor da PRF, acusado de tentar interferir na eleição presidencial do dia 30 de outubro. O relatório será lido amanhã (17) e deve ser votado na quarta-feira (18). Quem viver pelo menos conhecerá detalhes da fracassada intifada golpista planejada desde o primeiro dia da gestão do mito e abortada em 8 de janeiro deste ano.
*Mathuzalém Júnior é jornalista profissional desde 1978