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Adalberto e Juçara em Guarapari

Casal côncavo e convexo descobre que conforto acaba quando nascemos

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Autor/Imagem:
Eduardo Martínez - Foto Produção Irene Araújo

Adalberto, mimado desde sempre, vivia choramingando pelos cantos por causa das mais efêmeras bobices. Por sua vez, Juçara, a mulher com quem dividia a vida nos últimos anos, era toda praticidade. Quase dois polos opostos, caso não fossem as tórridas noites de alcova, quando, por conta dos desejos praticamente contíguos, provocavam sonoras faíscas, que esquentavam os ouvidos dos vizinhos.

Juçara, que não passava aperto por conta de sapato doado, sabia muito bem o que era viver na penúria e, por isso, vivia falando que para tudo tinha um jeito, desde que não fosse morte bem morrida, do tipo que nem desfibrilador ressuscitava. O marido, apesar de não ter nascido em berço de ouro, recebeu todos os mimos e regalos, principalmente da mãe, das avós e das dezoito tias. Numa família de mulheres, era o tal bendito fruto.

A despeito dessas convexidades e concavidades, os enamorados levavam uma vida agradável, por assim dizer. Nada de muito luxo, mesmo porque a grana era curta, mas o suficiente para não correr o risco de deixar os pés de fora do cobertor nos meses mais longos do ano. E, caso a coisa apertasse, nada como a providencial água para fazer o feijão render.

Nascidos em Brasília, aqueles dois sonhavam em ir para a praia, pois cachoeira já conheciam desde meninos. Um amigo do casal, o Marcelino, caminhoneiro de profissão, disse que já havia feito algumas viagens para Salvador.

— É muito bonito?

— É bonito demais da conta, Juçara. Parece o lago Paranoá, só que com ondas maiores e espumas que nem sabão.

— E você tomou banho?

— Só no rasinho. Aquilo puxa mais do que areia movediça.

— Eita!

— E a água é salgada que nem os croquetes da dona Cassandra.

Aquela conversa transformou aquele sonho numa obsessão para aqueles dois. Juçara, afeita a fazer contas, economizava até nos centavos, ao mesmo tempo que controlava os impulsos do marido, que sempre queria levar um pouco mais de algo aqui e ali.

— Adalberto, pra que levar três pães?

— Ué, se sobrar, a gente faz torrada.

— Que mané torrada o quê, homem! Olha pra essa sua barriga! Tá até parecendo mulher buchuda.

Aos trancos e barrancos, eis que, após um ano inteirinho de economia, o casal havia juntado o suficiente para, finalmente, viajar para a praia. Não foram para Salvador, mas uma praia mais perto. Também não ficaram em um hotel em frente ao mar, o que não era problema, pois Juçara era adepta das caminhadas. O que eram míseros dois ou três quilômetros para alguém que morava há mais de mil da praia?

Guarapari! O paraíso dos mineiros, foi o destino escolhido pelos pombinhos. E lá foram os candangos, numa linda manhã ensolarada para a famosa praia do Morro. Juçara foi a primeira a retirar os chinelos e sentir a areia. Adalberto, meio reticente, continuou com os seus.

— Amor, não vai tirar o chinelo?

— Acho que não.

— Ué, por quê?

— Não estou me sentindo confortável com essa areia toda.

— Deixa de bobagem, homem! E desde quando alguém se sente confortável depois que nasce?

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