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Sem liberdade

Deus, Pátria e Família de Bolsonaro levaram o Brasil para o abismo

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Autor/Imagem:
João Moura* - Foto de Arquivo

A retórica política do bolsonarismo, marcada pelo uso intenso dos conceitos de “Deus, Pátria, Família e Liberdade”, tem sido uma narrativa para mobilizar e cooptar eleitores no Brasil. Este conjunto de valores, evocado de forma enfadonha é um réquiem para Matraga às avessas, refletindo uma tentativa de criar uma base sólida de apoio, principalmente entre os conservadores. No entanto, a utilização desses lemas não está isenta de críticas, especialmente no que diz respeito à coerência entre o discurso e a prática, bem como ao impacto na polarização política do país.

Deus: A invocação de Deus serve para alinhar sua imagem com a de um defensor da moralidade cristã. Bolsonaro frequentemente faz referências a sua fé, participando de eventos religiosos e reforçando sua aliança com líderes evangélicos. Este discurso visa a coesão com uma grande parte do eleitorado brasileiro que valoriza a religião em suas vidas cotidianas. No entanto, a instrumentalização da fé para fins políticos levanta questões sobre a real separação entre Igreja e Estado, além de alienar aqueles que não compartilham da mesma crença.

Pátria: O apelo à pátria é uma chamada ao nacionalismo, buscando unir a população em torno de um ideal de soberania e orgulho nacional. Bolsonaro tenta promover uma visão de Brasil forte e independente, o que ressoa com eleitores que temem a influência estrangeira e desejam políticas de proteção econômica. Contudo, a ênfase no nacionalismo pode se traduzir em políticas isolacionistas e xenófobas, prejudicando relações internacionais e exacerbando divisões internas.

Família: A defesa da família tradicional é um pilar da retórica bolsonarista. Bolsonaro busca se posicionar como guardião dos valores familiares, prometendo combater o que considera ameaças à unidade familiar, como a ideologia de gênero e a liberalização dos costumes. Este discurso atrai eleitores conservadores que veem nas mudanças sociais uma erosão de valores fundamentais. No entanto, a política focada exclusivamente na família tradicional pode negligenciar as diversas configurações familiares presentes na sociedade moderna, marginalizando grupos e perpetuando discriminações.

Liberdade: A ideia de liberdade é utilizada para criticar intervenções estatais e defender a livre iniciativa. Bolsonaro frequentemente denuncia o comunismo e o socialismo, apresentando-se como um bastião da liberdade individual e econômica. Este argumento visa atrair eleitores que rechaçam o atual governo e outros que passaram pelo país – menos a ditadura que eles tanto endeusam. Todavia, a interpretação bolsonarista de liberdade muitas vezes ignora a necessidade de políticas públicas que garantam a igualdade de oportunidades e a proteção dos direitos humanos, resultando em um discurso que privilegia determinados grupos em detrimento de outros.

A retórica de “Deus, Pátria, Família e Liberdade” utilizada por Bolsonaro e seu grupo é uma estratégia que busca somente a eficácia para mobilizar um eleitorado conservador e criar uma base de apoio leal à sua narrativa de governar. No entanto, este discurso apresenta uma série de contradições e desafios. A instrumentalização da religião, o nacionalismo exacerbado, a defesa de uma visão limitada de família e uma interpretação seletiva de liberdade contribuem para a polarização e exclusão de segmentos significativos da população. Para além do apelo emocional e ideológico, é fundamental que as políticas públicas se baseiem em princípios de inclusão, respeito à diversidade e promoção do bem comum, algo que a retórica bolsonarista frequentemente deixa a desejar e é insuficiente para governar o país, servindo somente para mascarar seu real interesse pessoal.

Para além do mantra bolsonarista – que levou o país ao caos em 08 de janeiro de 2023 – o que vemos é que o lema “Deus, Pátria e Família” – sem o acrescento da “liberdade” -, tem sido uma constante na retórica política de muitos líderes ao redor do mundo. Este trio de valores é frequentemente invocado para mobilizar eleitores, definir identidades nacionais e estabelecer prioridades governamentais. No Brasil, esse slogan ganhou destaque especial, sendo utilizado por políticos de diferentes espectros ideológicos para conectar-se com o eleitorado, evocando um senso de tradição e estabilidade.

A evocação de “Deus” na política serve para sublinhar a moralidade e a ética, muitas vezes alinhando-se com as crenças religiosas da maioria da população. Em um país onde a fé tem um papel central na vida cotidiana de muitos, apelar para Deus pode fortalecer a imagem de um político como um defensor dos valores tradicionais e da justiça divina. Políticos que utilizam esse discurso geralmente buscam o apoio de comunidades religiosas, prometendo preservar seus valores e assegurar a liberdade de culto – está aí, o motivo pelo qual bolsonarista incluíram ao seu mantra a palavra “liberdade” (porém restrito ao seu culto xenófobo). A xenofobia muitas vezes se cruza com o racismo, tornando a situação ainda mais angustiante para as vítimas.

A “Pátria” simboliza o nacionalismo e o amor ao país. Este elemento do lema é frequentemente utilizado para promover políticas que protejam a soberania nacional, incentivem o patriotismo e reforcem a identidade cultural. No Brasil, a pátria também é um chamado à unidade em tempos de divisão, sugerindo que, apesar das diferenças, todos os cidadãos compartilham um destino comum. Políticos que enfatizam a pátria frequentemente defendem políticas de segurança nacional, defesa das fronteiras e proteção da economia doméstica – essa seria a intenção, mas o que vemos por parte dos patriotas de plantão é um endeusamento do EUA (e outras nações estrangeiras) em detrimento ao Brasil.

Por fim, a “Família” é o núcleo onde se espera que os valores morais e éticos sejam transmitidos. Na política, a família é utilizada como símbolo de estabilidade e segurança. Os políticos que se concentram neste valor geralmente promovem políticas que apoiem a unidade familiar, como incentivos fiscais para famílias, políticas de educação e programas sociais. Eles também podem se opor a legislações que consideram ameaças aos valores familiares tradicionais, como certas políticas de direitos reprodutivos ou reformas no casamento.

A utilização de “Deus, Pátria, Família” e até a própria “liberdade” como lema político é uma estratégia que apela a valores enraizados na sociedade. Embora essa retórica possa inspirar e mobilizar eleitores, ela também pode ser usada de maneira divisionista, incluindo grupos que não compartilham desses mesmos valores de forma incisiva como vem sendo usada por extremistas políticos. Contudo, o sucesso dessa abordagem depende da capacidade de traduzir esses valores em políticas concretas que beneficiem a sociedade como um todo.

*João Moura é Professor e Filósofo, observador da anatomia de governos e sociedade.

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