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Rir para não chorar

Brasil precisa deixar mesmice de produzir bandidos e políticos

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Autor/Imagem:
Wenceslau Araújo* - Foto de Arquivo

Cansado do Brasil caranguejo e do caranguejal do Brasil, o melhor caminho é fazer como fazia Silvio Santos: rir do que é sério e tentar tornar sério o que é levado na brincadeira. Sonho e luto para conseguir tirar o atraso do Brasil do futuro, hoje denominado o país do faturo. Quanto ao ninho de serpentes ou caranguejal, acho improvável derrubá-lo, na medida em que, de acordo com o filósofo Tim Maia, no patropi, além da prostituta ter orgasmos, o cafetão sente ciúmes, o traficante é viciado e o pobre é de direita. O que fazer diante de tantas contradições? Antes que a nação vire de ponta cabeça, nos resta relaxar e gozar, conforme ensinamentos da sacerdotisa e monja superiora Marta Suplicy.

Por falar em contradição, quer coisa mais insensata do que a prosperidade dos nossos homens públicos? Como dizia o mestre Stanislaw Ponte Preta, tricolor de coração, essa constatação é a prova evidente de que nossos representantes no Congresso Nacional lutam dia e noite pelo progresso do nosso subdesenvolvimento. É por isso que, sempre que posso, faço uso dos sermões escritos a várias mãos e utilizados por Bob Fields para unir os patriotas de sua época em torno de uma ideologia que só servia para aqueles aos quais ele servia.

Em um deles, Bob, o nosso Roberto Campos, dizia que o Brasil é um país que não perde uma boa oportunidade de perder uma boa oportunidade. Antigo, mas de uma contemporaneidade pai d’égua, o pensamento pode ser sinônimo de um outro imortalizado pelo jornalista Aparício Torelly, também conhecido por Barão de Itararé: “O Brasil é feito por nós. O que falta é o brasileiro desatar os nós”. E assim vamos caminhando até que consigamos inventar o Brasil que queremos. Por enquanto, as únicas coisas que produzimos de forma organizada são o crime e os políticos.

Seguindo com as teses filosóficas de nacionalistas de quatro costados, chego a Millôr Fernandes, para quem o Brasil é realmente muito amplo e luxuoso. “O serviço é que é péssimo”. Embora não acredite mais na tese de que em se plantando tudo dá, sou daqueles que, mesmo com um olho no padre e outro na missa, ainda crê em dias melhores. Por essa razão, independentemente das tristezas do mundo e das dores dos brazucas, uma de minhas especialidades é distribuir risadas pela vida. Como saio em férias em qualquer janeiro que surja, faço isso de fevereiro a fevereiro.

Nesses muitos anos já vividos, acumulei de tudo um pouco. Até agora, só me falta ouvir de alguém que Nelson Rodrigues estava errado quando definiu a paixão política com algo cretino e cretinizante. Há controvérsias. Porém, nunca ouvi alguém discordar da afirmação de que esse tipo de paixão é o único sem grandeza e o único capaz de imbecilizar o homem. Como ilustração, volto alguns anos no tempo e tento buscar uma explicação lógica para a força de um atentado como forma de catapultar políticos, consolidar imagens e tornar mortais desconhecidos em ídolos de segmentos sem causa.

Nos anos 50, Carlos Lacerda, ex-deputado federal e ex-governador da Guanabara, virou estrela por conta do atentado da Rua Toneleros, em Copacabana. Jair Messias se transformou em mito depois da facada que lhe atingiu as tripas e o elegeu presidente da República em 2018. Também inexplicáveis foram a tentativa de explodir o antigo Gasômetro e o atentado do Riocentro, ambos no Rio de Janeiro. O de 8 de janeiro de 2023, na Praça dos Três Poderes, dispensa comentários. Como não consigo alcançar o Brasil do futuro e falta-me capacidade para lutar contra o caranguejal, vivo a sorrir, porque rir é um ato de resistência. O que não perco de vista é a frase de Oscar Wilde sobre o riso: “Se for dizer a verdade aos outros, faça-os rir, pois, do contrário, eles o matarão”. Na dúvida de brasileiro louco para viver, me utilizo da ideologia suburbana de rir para não chorar.

*Wenceslau Araújo é Editor-Chefe de Notibras

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