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Ah, Pedrinho...

Há um santo a menos no paraíso… e a culpa é das formigas

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Autor/Imagem:
Cadu Matos - Foto Produção Francisco Filipino

Pedrinho, oito anos, era um garoto igual aos outros. Jogava bola, rodava pião, soltava cafifa, aprendia palavrões (um vocabulário novo e fascinante), se tocava todos os dias (uma prática nova, fascinante e, em especial, muito gostosa). Só havia uma diferença entre ele e o resto da molecada: Pedrinho decidiu virar santo.

Influência da família, católica na última. E da primeira comunhão, feita há pouco tempo. E do raciocínio lógico do menino.

“Porra, eu não peco”, dizia para si mesmo. “Palavrão não é pecado, é modo de falar. Punheta não é pecado, e se for, é perdoável, todo mundo bate uma. Então, se eu rezar bastante, viro santo.”

Lógica impecável. O garoto pegou uma toalha no banheiro e foi para o quintal. Estendeu a toalha no chão, para proteger de pedrinhas, ajoelhou-se e começou a rezar. Só Padre Nosso e Ave Maria, emendando um no outro.

Meia hora depois, começou a dar fome (era gordinho, comia pra dedéu). Mas foi em frente. Uma hora depois, começou a prestar atenção no canto dos passarinhos, nas risadas que vinham da rua… Concluiu que eram armadilhas enviadas pelo Coisa Ruim para distraí-lo e continuou a rezar. Uma hora e meia depois, passou a se achar um idiota por estar rezando no quintal; podia estar batendo uma bolinha com os amigos… Percebeu que esses pensamentos eram uma nova investida do Maligno, que não queria que ele virasse santo. Afastou-os e prosseguiu, impávido.

Mas aí vieram as formigas. Vieram em fila, como as formigas costumam andar, subiam no tapete, passavam junto a sua bunda (não estava mais de joelhos, doía, sentara no chão) e cravavam os ferrões. Não todas, para sorte dele; mas em número suficiente para se coçar com força e xingar as filhas da puta, entre uma Ave Maria e outra.

Claro que Pedrinho poderia ter mudado de lugar, indo para longe da trilha das formigas. Mas achou que era um novo desafio do Cramulhão, para ver se ele tinha força de vontade para se tornar mesmo santo. Então, ofereceu sua dor na bunda a Deus e continuou a rezar – e a xingar a porra das formigas.

Mas não deu. Tinha formiga demais, seu traseiro já estava todo empolado. Resignado, desistiu da santidade naquele dia, levantou-se, sacudiu a toalha – caíram umas quatro formigonas – foi pra casa, pôs a toalha pra lavar e tomou um banho, pra diminuir a dor no bumbum.

O diabão venceu. Pedrinho nunca mais tentou ser santo. E nunca mais rezou, pelo resto de sua vida.

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