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Motim oficial

Pau que deu em Chico tem de dar também em Francisco

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Autor/Imagem:
Mathuzalém Júnior - Foto Antônio Cruz/ABr

Independentemente de algumas páginas negras do livro escrito em um passado nem tão remoto, o Exército Brasileiro é uma instituição centenária, séria e composta por uma maioria esmagadora de homens e mulheres honrados. Por isso, não merecia passar pelo que está passando. O anúncio da prisão de quatro oficiais militares e de um policial federal que haviam atentado contra a democracia sacudiu o Brasil, as Américas e o mundo. Nenhum desses supostos agentes da lei estava preocupado com o aquecimento global, com a fome, com o desemprego ou com o crime organizado que tomou conta do país. Em nome de um poder que não souberam exercer, o que fizeram foi se associar à bandidagem que imagina o Brasil como terra de ninguém.

Articulado exclusivamente para levar no tapetão uma disputa que perderam nas urnas, o fracassado motim pelo menos serviu para empurrar o que sobrou do bolsonarismo para as profundezas da ponte que partiu. Nada de novo para um grupelho derrotado que se acostumou a dormir, sonhar e acordar pensando em golpes. A novidade é que a trama foi arquitetada por pessoas que só falavam em Deus, pátria e família. Era Deus no céu e o Diabo na terra os ajudando a encontrar mecanismos para executar um presidente e um vice-presidente eleitos pela maioria dos votos dos brasileiros. Resumindo a oração pelos que não foram, se cuidem, pois hoje o Diabo veste farda.

A lista mortuária dos conspiradores fardados incluía um magistrado legalista, cujo principal crime foi votar para impedir que a súcia se utilizasse de um cabo, um soldado e de um jipe para invadir o Supremo Tribunal Federal. A certeza da impunidade era tão grande que o atentado foi planejado sob os olhares atentos do ex-representante do demo no Palácio do Planalto. Tudo por conta da vitória incontestável de um suposto fora da lei em 2022. E agora? Como tratar os militares que agiram à margem da lei, sempre com a assessoria direta de um general raivoso e de outro omisso e subserviente como poucos. Eram as quatro linhas tortas e sujas em que eles jogavam ao vivo e em cores.

Gravíssimo do ponto de vista político, preocupante em relação à vida e miliciano socialmente, pois o objetivo não era somente a tomada do poder, o episódio que poderia ter culminado na morte de Lula da Silva, de Geraldo Alckmin e de Alexandre de Moraes precisa ter respostas rápidas, conclusivas e definitivas. O comandante do golpe circula livremente e, por onde passa, debocha acintosamente daqueles que o julgaram e o condenaram ao ostracismo presidencial. Não somente por isso, a sociedade tem o direito de acompanhar publicamente o trabalho das autoridades constituídas para, como disse o senador Randolfe Rodrigues (AP), combater o fascismo e a delinquência usando meios legais.

Graças à educação recebida no berço, jamais serei flagrado e denunciado maltratando um animal, agredindo preconceituosamente um semelhante, afanando justificadamente uma peça de capa de filé ou jurando de morte um adversário. Se o fizer serei preso, pisoteado, condenado e enjaulado antes mesmo que consiga dizer meu nome. Os presos de terça-feira não são mais suspeitos, na medida em que a avalanche de provas os incrimina até a medula. O chefe e seu ajudante de ordens já estão com as almas encomendadas. Enviá-los para o calabouço deve ser uma questão de tempo. Se não for, sugiro que todos os ladrões de galinha, de bancos e de votos sejam soltos até que provem que são realmente ladrões.

Diriam os extremistas que Lula está solto. Bolsonaro e sua trupe também. Seja quem for o presidente, na República brasileira não há mais espaço para os que desejam acabar com a democracia. O que o povo brasileiro espera são pesos e medidas equivalentes. Se um bandido qualquer pode ser preso e mostrado em rede nacional, por que os terroristas assumidos têm de ficar na penumbra e com seus processos sob sigilo? Afinal, tanto um quanto o outro pagam os mesmos tipos de impostos. Portanto, o pau que já deu em Chico tem de ser dado em Francisco. Por fim, sabedores que o soldado deu no pé, que o cabo se escafedeu e que o jipe está com os quatro pneus furados, resta informar aos “patriotas” de araque não há mais espaço no Brasil para quem conspira contra a democracia e as liberdades. Concluo recomendando que, ouvindo “Deus, pátria e família”, disque 190.

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*Mathuzalém Júnior é jornalista profissional desde 1978

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