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Dupla sertaneja

Davi e Hugo precisam se inspirar em Lacerda, Millôr, Campos e Ulysses

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Autor/Imagem:
Wenceslau Araújo - Foto de Arquivo

Deixando de lado as baralhadas da vida para entrar nas barafundas da política, me dei o direito de mais uma vez bordejar diante da seriedade. Sob nova direção, é chegada a hora de as duas casas do Congresso Nacional deixarem de produzir em função de interesses de grupos. O interesse efetivo da coletividade precisa estar acima da sedução do poder e, principalmente, do cifrão. Que tal se pensar na recuperação da péssima imagem do Parlamento, hoje contaminado até a alma pela corrupção? A recuperação pode não ser tão fácil como acreditam os parlamentares de valor. No entanto, nada é impossível quando dois ou três se juntam contra um. Como bem disse o udenista Carlos Lacerda, “O futuro não é o que tememos, mas o que ousamos”.

O momento é de corrigir distorções como a proseada pelo eterno Millôr Fernandes, para quem o Congresso de sua época era um exemplo de eficiência: “Ele mesmo rouba, ele mesmo investiga e ele mesmo absolve”. O tempo passou, os deputados e senadores são outros, mas, infelizmente, o perfil permanece inalterado. Ainda que seus nomes lembrem os de uma nova e pomposa dupla sertaneja, os atuais donos do pedaço, Hugo Motta (Republicanos-PB) e Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), podem sugerir a inclusão dos bodes nas principais salas do Palácio do Planalto e até defender as emendas parlamentares como direito dos congressistas.

E realmente são, assim como os bodes devem ter assento nas reuniões dos chamados “ministros da Casa”. O que eles não podem é achar, como seus antecessores, que o dinheiro público é capim para ser distribuído a pessoas sem nomes, endereços e telefones. Também não será de bom alvitre colocar o governo federal na condição de paciente terminal somente por eventuais perdas de espaço na Esplanada dos Ministérios. Os apaniguados são muitos e os cargos muito poucos para sanar a gula dos partidos que tentam se aproximar exclusivamente por conta das benesses. Hugo Motta e Davi Alcolumbre têm de pensar grande.

Seguir o método nada republicano de Arthur Lira (PP-AL) e pouco harmonioso de Rodrigo Pacheco (PSD-MG) é deixar os eleitores convictos de que só as moscas mudaram. Que eles trabalhem pelo Brasil e, se possível, incorporem o espírito de Roberto Campos, imortalizado pelo inusitado pedido aos colegas parlamentares de então: “Se os senhores e senhoras não conseguem se reunir para fazer o bem, pelo menos se reúnam para evitar o mal”. Simples assim. Continuar emparedando o atual presidente da República por conta de recursos não liberados e de pedidos de cargos não atendidos é abrir os flancos.

É, no mínimo, permitir que qualquer brasileiro entenda que, apesar dos discursos no caminho do entendimento e do alinhamento de objetivos, os retratos de Hugo Motta e de Alcolumbre em nada diferem do conceito de Maria Vai Casoutras. Representantes de estados do Nordeste e do Norte, os novos senhores do Congresso sabem que a pauta econômica é fundamental para a recuperação do país. Sabem também que, independentemente da possibilidade de a direita mais sensata ter chances reais de bons resultados nas eleições gerais de 2026, o presidente Luiz Inácio não é um boneco de trapo, tampouco uma marionete. Ninguém se elege três vezes para a Presidência da República se não tiver carisma, peso político e votos.

E isso, queiram ou não os extremistas do conservadorismo, Lula tem de sobra. Portanto, que as tensões e os desentendimentos deem lugar a harmonia constitucional e à busca consensual de solução para os numerosos problemas do Brasil e dos brasileiros. O bem-estar social tem de estar acima das diferenças ideológicas e financeiras. Ainda há tempo de os congressistas de hoje mostrarem a Ulysses Guimarães que o Congresso de Hugo Motta e de Davi Alcolumbre não será pior do que foi o de Arthur Lira e de Rodrigo Pacheco. Como reis mortos, quem sabe Lira e Pacheco não assistem da Esplanada dos Ministérios a recuperação da credibilidade dos deputados e dos senadores, hoje mais baixas do que a dos catadores de latinhas.

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Wenceslau Araújo é Editor-Chefe de Notibras

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