Advogada e bruxa
Varinha de condão e caldeirão com escorpião vencem causa quase perdida
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emMeu nome é Amália Campos, 28 anos, advogada e bruxa. Advogada? Sim, isso mesmo. Sei que pode parecer estranho, mas é a minha profissão há quase seis anos. Um campo, não raro, minado de intrigas e subversões da lei, independentemente de interpretações.
Aurélio, um dos meus mais antigos clientes lá no Setor Comercial Sul, desde cedo acreditou na minha capacidade de ganhar ações praticamente perdidas. É verdade que consegui reverter algo praticamente impossível já no primeiro processo, que já se encontrava na terceira instância. Criei uma tese esdrúxula, que, não sei como, convenceu os magistrados a darem causa ganha para o meu cliente.
Apesar da sorte de principiante, as próximas quatro ou cinco ações judiciais foram perdidas, inclusive uma que eu tinha certeza de que ganharia. No entanto, apesar dos fracassos, parece que Aurélio, talvez detentor de fidelidade canina, ainda guarde na memória o trunfo inicial.
Há dois dias, Aurélio me telefonou desesperando. O motivo? Estávamos com um processo cujo império era somente averiguar documentação, e a magistrada estava com eles em mãos para proferir a decisão.
— Dra. Amália, e aí?
— E aí o quê, Aurélio?
— O que a juíza vai decidir.
Tentei explicar ao meu cliente que não tinha como entrar na mente da togada. Pra quê? Além de não resolver o problema de ansiedade do sujeito, ainda tive que ficar respondendo às mil mensagens que não paravam de chegar.
“Doutora, e aí?”
“A senhora não conhece algum amigo da juíza?”
“Levando em conta a sua experiência, o que vai acontecer?”
“E se a senhora telefonasse pra juíza?”
Quando lá estava eu digitando mais uma resposta, eis que o meu cliente me ligou novamente.
— Dra. Amália, por favor, não é possível que a senhora não saiba o que vai acontecer.
Dei um suspiro profundo e me lembrei de algo que poderia provocar convulsões no meu representado. É que soube, andando pelos corredores do fórum, que a tal juíza não tem bons bofes, o que tornaria ainda mais problemática qualquer previsão favorável. Mas foi aí que me lembrei do meu outro ofício, que, na realidade, é algo que nasce ou não com a gente.
— Aurélio, como advogada, não sei, mas, como bruxa, digo que venceremos.
Se vencemos? E por acaso alguém duvida da capacidade de uma bruxa? Bem, espero que esse não seja o seu caso.
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Eduardo Martínez é autor do livro 157 Contos e Crônicas por um Autor Muito Velho’
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