Tragédia anunciada
Luta obsessiva pelo poder deixa Brasil mais perto da hora da morte
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Reconhecidamente o Lula 3 não é o governo dos sonhos de ninguém. Ruim provavelmente em decorrência de incursões de quem torce contra o país, a gestão deixa a desejar, mas precisa ser respeitada, como foi a de Jair Bolsonaro. Apesar da tragédia anunciada já no primeiro dia de seus quatro anos de mandato, Jair concluiu sua administração sem atropelos. Para isso, foi eleito democraticamente. Lula idem. A diferença é a paciência. Os petistas esperaram quatro anos. Os bolsonaristas querem ocupar o ocupado Palácio do Planalto à força, à custa do sacrifício de um povo que não consegue medir a obsessão pelo poder.
Esperem sua vez na fila. Também obcecado e com os mesmos desejos incontroláveis pelo comando absoluto, Donald Trump esperou o insosso Joe Biden se enforcar na própria corda. Façam o mesmo. Parem de encher o caso, inclusive daqueles que não têm, e deixem o governo Lula acabar ou se acabar. Insistir nas teses de fraude, de perseguição e de roubalheira dos petistas é chover na terra molhada. Aliás, terra que vocês ajudaram a molhar. Pior é estimular à sabotagem o segmento dos “patriotas”, formado, entre outros, pelo agronegócio e pelos parlamentares que perderam a boquinha. Posso estar sendo injusto, mas o noticiário sério não me deixa mentir.
A estratégia de desestabilização do governo, levando Lula para o abismo em que Bolsonaro já está, é suicida, na medida em que, se continuada, levará todo mundo para o mesmo buraco negro. Antecipar a tragédia acelera a passos largos a destruição do discurso de bom moço do cidadão que teima em querer ficar onde não foi chamado. É bom registrar que os efeitos desse tipo macabro de plano duram até que o silêncio conivente e disfarçado de neutralidade se transforme em gritos de liberdade. Não falo em nome de todos, mas acho que boa parte dos brasileiros está cansada de lidar com pessoas que só sabem criticar e nunca a ajudar.
O Brasil é um país riquíssimo, mas ou é dirigido por pessoas desnutridas intelectualmente ou intolerantes à derrota. Por isso, empurrado por aqueles que dizem que amam a pátria, caminha passo a passo para o precipício. Passados seis anos da ascensão de Jair Bolsonaro à função de presidente da República, está provado que o tempo não muda pessoas. Só mostra quem elas realmente são. A esses, vale lembrar que, para cada cidadão que odeia o Flamengo, uma imensidão de outros idolatram o Mais Querido do Mundo. Nesse período bicudo em que as palavras inelegível e indiciado não deixam o moço dormir, o melhor seria recolher os flaps. Não precisa se esconder, mas evitar o conflito que, a meu ver, só ele deseja.
Como em política o demônio é sempre o outro, bom seria se todo político fosse obrigado a, antes de assumir, receber do eleitor um modo desconfiômetro, ferramenta que poderia informá-lo do momento de se retirar da vida pública. Uns porque já roubaram demais, alguns porque já encheram o saco de quem só quer viver em paz, outros porque já deram o que tinham de dar e todos porque são, ao mesmo tempo, ocultos e obscuros. O mecanismo ajudaria a todos, principalmente aqueles que morrem, mas não aceitam a informação de que existe vida além dos parlamentares e mandatários que se adequam aos perfis acima. O fato a ser analisado é que, outrora cheio de vida, o Brasil pós-Bolsonaro e no meio do Lula 3 está pela hora da morte.
Embora seja o cobrador de promessas, o povo é quem mais sofre com o vai e vem de políticos mordidos pela mosca azul. Sofre, mas é sempre o maior culpado pelas más escolhas. Enquanto direita e esquerda choram o leite derramado por seus líderes, o café está pelos olhos da cara. Direta ou indiretamente, essa luta insana é da Avenida Paulista, de consumidores que almoçam em Paris e jantam em Londres e das turmas do pentecostes e do agronegócio, cujo maior investimento tem sido na gasolina para incendiar de vez o parquinho. Repito que posso estar sendo injusto, mas ainda não tenho argumentos capazes de me provar o contrário. Ensimesmado e convicto de que o ovo, a mandioca, o arroz, a picanha e o bolo mané pelado não estão absurdamente caros à toa, ando com radinho de pilha colado no ouvido à espera da notícia de uma nova era. Pode ser a que aí está, desde que livre dos abutres que espreitam um cadáver que, ao que parece, não surgirá tão cedo.
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*Armando Cardoso é presidente do Conselho Editorial de Notibras