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1º de abril

Chegamos enfim ao dia em que todas verdades parecem ser mentiras

Publicado

Autor/Imagem:
Wenceslau Araújo - Foto de Arquivo

Nem sempre finjo ou minto quando escrevo. Imaginar o que não é obvio é meu principal combustível. Ou seja, a imaginação é minha fonte inesgotável de inspiração. Como dizia Albert Einstein, a imaginação é tudo. Ela é uma visão prévia de todas as atrações futuras. Por essas e outras, entendo que a prior prisão é a da mente restrita, tal qual o pior esgoto é consciência coletiva a partir de um pensamento personalista. É como fazem os políticos, cujas verdades parecem mentiras. Como durmo e acordo imaginando coisas para fazer e para escrever quando não consigo fazer as coisas que imaginei, meu show da vida nunca é medíocre, pois ele está à disposição de todos.

O parquinho de diversões faz anos está desmontado. O circo da esperança e do prazer perdeu a lona. Entretanto, mantenho a envergadura da língua como propulsora da palavra. Com ela no prumo, não me acanho nem mesmo quando sou colocado no paredão do reality da vida. Penso e ajo como o filósofo Platão, cuja forma de viver foi achar que a liberdade musical dá alma ao universo, asas à mente, voo à imaginação e vida a tudo. Imagino sempre o que é bom para todos. É claro que vez por outra termino me afogando em um mar de expectativas que demoram a virar realidade.

Ontem, data em que, após 61 anos, a dita dura finalmente amoleceu, adormeci radiante com a notícia de que Marine Le Pen ficou sem os fundos desviados da União Europeia. Atingida profundamente de fora para dentro, a líder da direita radical francesa acabou inelegível como seu colega brasileiro, aquele que supostamente não desviou fundo algum, mas está com suas profundezas tostadas até as partes mais baixas da coisa oca. Permaneci em estado de letargia até esta manhã, quando equivocadamente imaginei Xandão com as chaves do novo dormitório reservado para o cidadão que um dia se achou mito.

Da realização à frustração foi mais do que um salto no escuro. Loucura, loucura, loucura. Embora seja normal, às vezes eu me odeio. Meu nome é Wenceslau, o do bilau afogado no mingau. Sou, mas quem não é? Sem querer querendo e do meu jeitinho, percebi a tempo que hoje é 1º. de abril, o Dia da Mentira. Caramba! Então, o Airbnb destinado àquele que foi sem nunca ter sido não passou de utopia. Digo utopia, pois não sobreviveria a uma mentira dessas partindo de Xandão, o xerifão de todas as pessoas que abominam os que recorrem a Deus para perdoá-los depois de tentar escravizar o semelhante. Corta pra mim!

Antes de prosseguir, preciso lembrar da desnecessidade de se reservar um dia para a mentira. Faço isso, porque não tenho dúvida de que convivemos com milhões de brasileiros que mentem nos 365 dias do ano. A conta aumenta patrioticamente nos anos bissextos, período em que eu mesmo declinei da Xuxa, abri mão da Mulher Melão e acabei deixando escorregar pelas mãos a Mulher Sabão. Ainda bem que para todo mentiroso há um abestalhado para acreditar. Aliás, é bom que se diga que ambos são necessários para um e para outro sobreviver. Para relaxar a narrativa, não tenho vergonha de afirmar que hoje é o único dia em que meu vigor sexual é tão fake como as promessas que faço nas segundas-feiras ou às vésperas do Natal.

Quanto ao equívoco do meu primitivo sonho, precisei me assear para me tocar que o dia é da mentira e não do milagre. Sabedor de que todo mentiroso fica bravo e se faz de vítima quando é descoberto, vou continuar fingindo que não imagino o mito fora de circulação. Como todo homem verdadeiro é um mentiroso, concluo informando que ninguém é tão feio como na identidade, tão bonito como no Instagram, tão feliz como no Facebook, tão inteligente como no X, tão ausente como no Skype, tão ocupado como no WhatsApp e nem tão bom como no curriculum vitae. Que a única mentira do dia seja acreditar que temos limites. Eu não tenho. Por isso, normalmente cubro o rosto para me olhar no espelho. Temo ser desmentido quando perguntá-lo se há alguém mais taludo do que eu. Se a política realmente é um palco, acho que aquele ex-presidente deveria ter nascido no dia 1º de abril. Afinal, ele é bom demais para ser verdade.

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Wenceslau Araújo é Editor-Chefe de Notibras

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