Oposição alimenta um golpe sem apresentar programa de governo
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emA Câmara Federal vive um alvoroço entre aqueles que querem a saída da presidenta Dilma do Palácio do Planalto. Reunidos em pequenas articulações, em restaurantes badalados da capital federal ou em encontros íntimos “petit comitê”, buscam viabilizar um golpe branco, prevendo todos os cenários do certame “formal” para atingir seus objetivos. Quando perguntados, dirão exatamente todas as etapas, votos necessários, atores a serem mobilizados, partidos e lideranças envolvidas. No entanto, arrisco afirmar, o passo seguinte é uma incógnita.
Por que é uma incógnita? Porque o horizonte estratégico máximo é acordar o tipo de procedimento a ser levado a cabo, e a consequente resposta sobre quem assume. O dilema a ser enfrentado é como compor o próximo governo, ajeitar quem vai para onde e, sobretudo, decidir com quem ficará a cereja do bolo: a candidatura de 2018. Ou seja, “assumimos agora, provisório, e em 2018 consagramos nossa decisão”.
Não contam as preocupações daqueles que lutaram pela redemocratização do país, pela estabilidade institucional, pelo respeito à soberania do voto popular e a imagem da jovem democracia brasileira perante o mundo. Também não conta o fato de que o estatuto do impedimento, na Constituição Federal, exige a ocorrência de crimes e práticas por parte do mandatário –que jamais foram evidenciados.
Isso se chama golpe, e não tem outra qualificação possível. E tanto é golpe, que é articulado logo após a vitória petista no sufrágio universal de outubro de 2014. Ou não é verdade que a pauta do 3º turno foi montada ainda antes da posse de Dilma em seu segundo mandato?
Na democracia, quem quer não deve impor. Porque tudo que é imposto não conta com legitimidade. E tudo que não tem legitimidade, a história nos mostra, usa de força e da ilegalidade para garantir seus desejos.
Mais grave ainda é o passo seguinte. Qual é o programa? O que fazer para além da verborragia do “fora isso, fora aquilo”? A instabilidade política reforça e amplia o cenário de dificuldades econômicas. A ideia do caos, do “quanto pior, melhor”, está gerando obstáculos e mais obstáculos. Posta em prática a marcha rumo ao atentado democrático, a situação tenderá a deteriorar-se. E então, o que farão se conseguirem tomar conta do Planalto?
Quem olha de forma ingênua para essa articulação, pode supor que não há um programa que unifique a turma, além da bandeira “anti-Dilma”. No entanto, um observador mais atento sabe que a resposta a essa incógnita de um programa para o Brasil já está escrita: privilegiar o capital financeiro em detrimento do setor produtivo, mudar o marco regulatório do pré-sal e abrir indiscriminadamente o capital da Petrobras.
Também irão promover uma agenda de austeridade que corta benefícios, direitos e programas sociais, e fazer um realinhamento automático da política externa brasileira junto às economias que forjaram o Consenso de Washington, além de enxugamento das estruturas públicas, flexibilização das relações trabalhistas, generalização das terceirizações, e por aí vai.
Quem quer o poder, tem que propor. Mas isso não é dito por que seria uma desmoralização de largada –mas é o que será feito, não restam dúvidas. A política é construída por alinhamentos, não nos enganemos.
Neste momento, cruzando os corredores do Congresso, tenho a nítida impressão que o interesse popular está distante. Muito distante. A pauta aqui deveria ser outra: melhoria das condições de vida, emprego, salário, aposentadoria, moradia, saúde, educação, acesso à terra e à cultura, transporte público de qualidade, respeito às diferenças, inovação, ciência e tecnologia. A instabilidade e a potencialização da crise não interessam à sociedade. O que interessa, em última análise, é a vida, que corre nas ruas, não nos conchavos golpistas.
Maria do Rosário