Sarney chamou Brossard, que chamou Ulysses, Jarbas, Maciel; renúncia abortada
Publicado
emJosé Escarlate
O governo Jânio Quadros, com mandato de cinco anos, foi encerrado laconicamente antes de completados sete meses. Ninguém saberá a razão. Ele levou seu segredo para o túmulo. O raciocínio era de que Jânio jogara, com a renúncia, tornar o país acéfalo já que o vice, João Goulart, além de estar em viagem à distante China, era rejeitado pelos militares, todos sabiam. Ninguém saberá jamais por que Jânio Quadros renunciou.
Se alguém o sabia, era ele, que levou seu segredo para o túmulo. Para analistas políticos o plano falhou porque os chefes militares vacilaram. Faltou-lhe, a Jânio, o apoio de forças políticas que o amparassem, pela coragem (?) de sacrificar sua carreira pessoal.
Geisel também ameaçou renunciar devido às fortes pressões da linha dura, que se julgava tutora do seu mandato – “se não me querem mais aqui, arrumo as minhas coisas e vou embora para casa”.
José Sarney, que recebeu no colo a presidência da República num golpe do destino, um dia chamou o ministro da Justiça, Paulo Brossard, dando-lhe ciência do desejo de deixar o governo. Jurista tarimbado, o ministro primeiro perguntou o por quê. Sarney desabafou dizendo que, ao assumir o governo em meio a um momento sem precedentes, teria pela frente seis anos de mandato, ressaltando que manobras no Congresso reduziu para cinco anos esse mandato.
“Agora – desabafa o presidente -, um forte movimento quer nova redução, à qual não vou me submeter”. Parlamentares queriam que o mandato fosse de quatro anos. Indagado pelo ministro se aquilo era apenas uma inclinação, ou uma resolução, Sarney disse que era uma resolução. “Então, assim vamos tratá-la” – respondeu um Brossard ainda aturdido.
Dotado reconhecidamente de uma paciência sem limites, José Sarney viu que, com a redução do seu mandato para quatro anos, perderia as mínimas condições políticas de governar.
Paulo Brossard voltou ao ministério e convocou uma “reunião reservada” com os líderes dos quatro maiores partidos: Ulysses Guimarães (PMDB), Jarbas Passarinho (PDS), Marco Maciel (PFL) e Paiva Muniz (PTB), aos quais comunicou que, diante da pressão, o presidente decidira abandonar o cargo. Perplexos, os líderes deixaram o ministério discretamente.
Ninguém soube, ninguém viu. A imprensa ficou a ver navios. Nenhum jornal publicou nada. Os quatro voltaram ao Congresso e, depois de muitas tratativas sigilosas, sem qualquer vazamento, a campanha pelos quatro anos perdeu força, até morrer. A renúncia não se consumou e Sarney cumpriu os cinco anos de mandato. Aos trancos e barrancos, mas cumpriu.