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Negros estão no topo das maiores vítimas de homicídios

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Morrem 153,4% mais negros do que brancos por homicídios no Brasil. Os números do estudo Homicídios e Juventude no Brasil, do Mapa da Violência 2013, mostram a brutal desigualdade na violência no País. Com dados do Sistema de Informações sobre Mortalidade do Ministério da Saúde, aponta que 71,4% das 49,3 mil vítimas de homicídios em 2011 eram negras – o que corresponde a 35,2 mil assassinatos.

Ambos os números foram os maiores registrados desde 2002. Há 12 anos, por exemplo, morriam 42,9% mais negros do que brancos. Em 2010, esse número já havia atingido 149%. O valor máximo até o momento, de 153,4%, também foi o último registrado, em 2011.

A “mortalidade seletiva”, conforme classifica o estudo, é observada pela diminuição de homicídios de brancos e crescimento de homicídios de negros. Novamente comparando os anos de 2002 e 2011, o número total de vítimas pretas ou pardas subiu de 26,9 mil para 35,2 mil. Paralelamente, as vítimas brancas reduziram de 18,8 mil para 13,8 mil.

A classificação negro engloba as cores preto e pardo (mestiços), de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Nas pesquisas, a população indica a qual cor pertence. Há ainda as opções branco, amarelo e indígena. De acordo com o Censo Demográfico de 2010, há, no Brasil, 90,6 milhões de brancos (47,7%) e 97,1 milhões de negros (50,7 %). Ou seja, não se pode justificar tamanha diferença entre o número de homicídios de negros e brancos simplesmente porque há mais pretos e pardos no País – proporcionalmente, a conta não fecha. Daí a expressão “mortalidade seletiva”.

Se a vitimização negra de 153,4% já é alarmante, de acordo com o estudo, imagine aumentá-la em mais de 80 pontos percentuais. É o que acontece quando se observa os homicídios em meio à população jovem. Nessa faixa de idade, morrem 237,4% mais negros que brancos no País.

Ainda que brasileiros de 15 a 29 anos sejam considerados jovens atualmente, o Mapa da Violência 2013 considerou apenas pessoas com idade entre 15 e 24 anos.

“Seguro para brancos, perigosíssimo para negros”

Alagoas e Paraíba são os Estados brasileiros com as maiores diferenças de taxas de homicídios de negros e de brancos. “O que se vê é uma contradição nesses Estados. Se forem brancos, estão seguros. Para negros, é perigosíssimo”, afirma o economista Daniel Cerqueira, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).

Em 2011, houve 90,5 mortes de negros a cada cem mil em Alagoas – o maior índice brasileiro. Curiosamente, o Estado ocupa a 22ª colocação na mesma taxa para brancos: 8,1 homicídios.

Apesar da desigualdade nos homicídios, Alagoas é a 11ª Unidade Federativa em percentuais de autodeclarados pretos ou pardos. Entre a população total, 66,8% são negros, conforme o Mapa da Distribuição Espacial da População, segundo a cor ou raça – Pretos e Pardos, da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial e do IBGE.

Na Paraíba, a situação é parecida. Enquanto a taxa de homicídios de negros é de 60,3 a cada 100 mil, segunda maior do País, para brancos o valor é de 5,5. O Estado, por sua vez, ocupa a 16ª colocação pelos percentuais de pretos ou pardos na população – que equivale a 58,4%.

Contrariando todas as demais Unidades Federativas brasileiras, morrem mais brancos do que negros no Paraná. Nesse Estado, 35,6 brancos morrem por homicídio a cada 100 mil. No mesmo critério, o número é de 20,5 para negros. O percentual de negros no Estado é de 28,3% – maior apenas que os outros dois Estados da região Sul.

O estudo Vidas perdidas e racismo no Brasil, desenvolvido pelo Ipea em parceria com a Fundação Getúlio Vargas (FGV), afirma que apenas 20% da diferença entre taxas de homicídio de negros e não negros nos municípios pode ser explicada por condições socioeconômicas e demográficas das vítimas. Ainda que não possa afirmar qual o percentual ligado diretamente ao racismo, Daniel Cerqueira, um dos autores, acredita que este esteja “escondido” em meio aos 80% restantes.

Entre as condições analisadas no cálculo estavam escolaridade das vítimas, percentual de jovens negros e brancos na população total, taxa de desemprego e renda média do trabalho.

Negros têm mais chance de serem assassinados

Em outro modelo, Cerqueira observou as mais de 1 milhão de mortes violentas ocorridas no Brasil entre 1996 e 2010, relacionando-as com parâmetros como gênero, estado civil, escolaridade, local do incidente, dia da semana e raça/cor das vítimas. Um dos resultados foi de que “o indivíduo de cor preta ou parda (negro) possui uma chance em torno de 7,5 pontos percentuais de ter sido vítima de homicídio em relação ao de cor branca”.

De acordo com Cerqueira, as conclusões vêm de encontro ao pensamento de alguns, de que o racismo é “bobagem” e “não existe no Brasil”. “Dizem que pobre é o que mais sofre e negros morrem mais porque estão mais entre os pobres. O que observamos é que não é bem assim. A maior parte não é explicada pelas características socioeconômicas”, afirma.

Por que negros morrem mais?

Julio Jacobo Waiselfisz, sociólogo da Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais e coordenador do Mapa da Violência 2013, atribui o avanço da violência sobre a população negra principalmente ao processo de terceirização de serviços básicos – segurança, educação, saúde – e às políticas públicas influenciadas pela mídia.

“A partir da década de 1990, há um processo de substituição da segurança pública pela privada entre os ricos. O mesmo aconteceu na educação, na saúde. Mas os mais pobres seguiram com os serviços públicos, que muitas vezes são de menor qualidade”, diz. Em parte, o problema poderia ser explicado pelo menor poder aquisitivo da população negra. De acordo com o IBGE, pessoas de cor preta ou parda ganharam, em média, 57,4% do rendimento de trabalhadores brancos em 2013. A pesquisa foi baseada em seis regiões metropolitanas do Brasil.

Da mesma forma, a preferência dos noticiários em cobrirem mortes de “brancos abastados” em detrimento da população pobre favoreceria políticas públicas voltadas para os mais ricos. “As políticas enviam segurança para onde a mídia cobre, para onde vai haver mais escândalo. Isso resulta numa dupla segurança, pública e privada, em áreas ricas”, afirma Waiselfisz.

Cerqueira acredita que os homicídios são explicados por dois canais. Um deles, indireto, é o efeito do preconceito de raça no mercado de trabalho, que afeta a renda. Por outro lado, há um canal direto, quando o indivíduo é “bombardeado” por estereótipos. “Há preconceito histórico de que negros pertencem a uma raça inferior e sua vida valeria menos que a de outros. Ou de que negros são criminosos”. O pesquisador destaca que os canais não podem ser separados – um influencia o outro.

Por fim, o registro de mortalidade também pode ser considerado um fator que contribui para o aumento das diferenças, segundo Waiselfisz. A documentação teria alcançado maior abrangência desde 2002 – o que torna os números mais precisos.

Cartola, Agência de Conteúdo

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