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A vela acesa tinha uma chama que dançava sem vento, até que…

O cara mudou de pousada e estava ali. O cara voltou da praia aceso e encapetado depois de uns tragos desproporcionais.

Sentou-se à mesa do pátio da nova pousada e buscou o isqueiro. Acendeu a vela e dedicou à santinha Aparecida que tinha na pequena gruta/capelinha da pousada.

Coisa de ritual e cultura popular.

Depois falou com a filha pelo WhatsApp.

Ela estava com dengue, longe dali. Falou com irmão para pedir ajuda. E só então abriu a preciosa lata de cerveja barata, a última. Tomou três goles e sentiu frio, ânsia de vômito.

O outono terminando e o inverno batendo à porta da Enseada da Pinheira. Pensou, pensou e lembrou-se do tempo e da composição de Caetano Veloso Oração Ao Tempo:

“És um senhor tão bonito/Quanto a cara do meu filho/Tempo, tempo, tempo, tempo/Vou te fazer um pedido/Tempo, tempo, tempo, tempo”.

A vela continuava acesa, dançando na noite ainda sem vento, coisa rara no balneário.

Lembrou-se de histórias de outros tempos. Esqueceu que o amor, a amizade e a solidariedade podem ser sentimentos que vêm e que vão e se perdem nos dias.

E no tempo da divagação, esqueceu da Santa, do santuário, da vela e do vento que virou e entrou rasgando pela enseada.

“Fogo, fogo, fogo na pousada!”, os vizinhos gritavam pedindo ajuda.

Horas depois, entre cinzas, bombeiros e sofrimento, o cara apenas explicou aos policiais que nem era religioso.

“Caraca, meu… eu só acendi uma vela ali na frente da bonequinha com a capa azul… Juro, nem vi e nem saquei que o vento virou pra sul. Que merda, né, mané!”.

O final de semana chegou com o inverno e o vento batendo de sul jogando areia das dunas sobre as casas, sobre os corpos e almas, sobre tudo.

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