Notibras

Abandonada, cultura de Brasília vive os bastidores do terror

Julia Lindner

Considerada Patrimônio Mundial pela Unesco, Brasília tem alguns dos principais espaços culturais fechados há anos para reestruturação. Entre eles o Teatro Nacional Claudio Santoro e o Museu de Arte de Brasília (MAB). Ambos nem sequer têm prazo para início das obras, além do Espaço Cultural Renato Russo e o Centro de Dança do Distrito Federal (DF).

Com o fechamento do teatro, a Orquestra Sinfônica passou cerca de dois anos e meio sem local fixo para ensaios e apresentações. De 2014 a 2016, os músicos da orquestra passaram por pelo menos cinco lugares da cidade, incluindo auditórios de escolas, com o ônus de ter que deslocar instrumentos caros e frágeis a cada mudança.

Desde agosto de 2016, a orquestra ganhou da Secretaria de Cultura do Distrito Federal o espaço do Cine Brasília, sede do mais antigo festival de cinema do País, como casa temporária. Os músicos praticam no período oposto ao de exibição dos filmes, pelas manhãs, e se apresentam todas as terças à noite gratuitamente. A adequação do cinema, que teve a iluminação modificada e o palco ampliado em 1,5 metro, custou R$ 109 mil ao governo do Distrito Federal.

O piano de cauda, comprado por mais de ¤ 100 mil, fica acomodado de maneira improvisada na entrada da sala de cinema, protegido apenas por um pano preto. Desde o fechamento do teatro, o instrumento quase não é utilizado por causa dos riscos de danos e do valor do transporte, que custa aproximadamente R$ 5 mil por deslocamento. A falta de um local adequado para a orquestra também impossibilita apresentações de ópera e balé.

Outros instrumentos maiores da orquestra ficam armazenados debaixo do palco ou em um pequeno galpão dentro da sala de cinema, como contrabaixo, tímpano, bombo, harpa, além de equipamentos como cadeiras, tablados e protetores acústicos. Os de menor porte ficam com os músicos. Sem camarim, os profissionais utilizam o espaço atrás da tela de 14 por 6,3 metros para se preparar para as apresentações.

Diante desse cenário, o maestro Claudio Cohen, regente da orquestra, firmou parcerias com outras instituições para realizar as apresentações, entre elas embaixadas de outros países no Brasil. Para 2017, está previsto um ciclo de pelo menos nove concertos em homenagem ao compositor alemão Ludwig van Beethoven, que conta com apoio institucional da Embaixada da Alemanha, que também arcará com os custos das solistas do espetáculo.

“A volta do teatro nos possibilitaria fazer grandes espetáculos novamente. É um anseio que a questão do teatro seja resolvida o mais rapidamente possível”, afirmou o maestro Claudio Cohen. Apesar de considerar que a questão econômica é um problema real para a orquestra atualmente, Cohen avalia que o grupo de Brasília encontrou formas criativas de sobreviver e aproveitar melhor outros espaços culturais da cidade, levando música para diversas regiões.

Projetado por Oscar Niemeyer e inaugurado no fim da década de 1970, o Teatro Nacional foi fechado em 2014 após o Corpo de Bombeiros encontrar mais de 100 irregularidades durante uma vistoria. A obra de reparação nunca foi iniciada. Procurada, a assessoria de imprensa da Secretaria de Cultura afirmou ao Estado que está fechando um acordo de cooperação com o Ministério da Cultura para viabilizar o início da recuperação do teatro ainda este ano.

Artes – Abandonado há mais de dez anos, o prédio do MAB, que abrigava mais de mil obras contemporâneas, está tomado pelo mato Por dentro, rachaduras no teto e nas paredes, vidros quebrados, infiltrações e vazamentos e restos de material de construção e lixo espalhados nos três pavimentos do edifício.

Na entrada, uma placa anuncia a conclusão de uma reforma em maio de 2015, uma das três iniciativas do governo do DF que fracassaram para revitalizar o local. Outra pintura dentro do prédio ainda registra a última exposição do museu, Tommasi em Retrospectiva, do artista plástico Walter Tommasi, em 2006.

O MAB foi fechado para reforma em 2007 por recomendação do Ministério Público, que considerou o edifício um risco para o acervo, avaliado em RS$ 8 milhões. Por fim, todas as peças foram transferidas para uma reserva técnica do Museu da República, fora da área de visitação.

Para o arquiteto e especialista e patrimônio histórico Rogério Carvalho, a transferência das obras do MAB é uma “temeridade”. Ele considera o cenário cultural de Brasília “completamente comprometido”. “Os espaços de cultura mais importantes estão fechados. Há uma defasagem e a população não tem acesso a espaços culturais de qualidade”, declarou.

Reformas – Em processo de revitalização, o Espaço Cultural Renato Russo está fechado desde janeiro de 2014. Após ficar abandonado por cerca de dois anos, a reforma do local foi orçada em quase R$ 6 milhões. A previsão era de que o centro ficasse pronto em março deste ano, porém o prazo foi adiado. O local tem teatro, salas de ensaio, galpão de artes e biblioteca.

O espaço foi aberto em 1975 e, em 1977, foi criado o Centro de Criatividade, onde ocorriam aulas, ensaios e oficinas. Após passar por revitalização, em 1986, o espaço foi reinaugurado no formato atual em setembro de 1993 e rebatizado com o nome do músico Renato Russo.

Também em meio a um processo de recuperação, o Centro de Dança do DF, destinado a pesquisa, ensaios, oficinas, workshops e cursos da área, está com as obras atrasadas. A previsão era de que o local, fundado em 1993 e fechado desde 2013, fosse entregue à população em novembro do ano passado, mas o prazo não foi cumprido. A Secretaria de Cultura afirma que até o fim do ano a reforma de adequação, avaliada em R$ 3,2 milhões, deve ser concluída.

Sair da versão mobile