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Corrupção. Até quando Catilina vai abusar da paciência do povo?

Os recentes escândalos dos políticos de Brasília confirmam o que há tempo a gente vem pregando por livros e artigos: é suma ingenuidade esperar o bom uso do dinheiro público pelos atuais detentores do poder, no âmbito federal, estadual ou municipal.

Os governos que se sucederam, ao longo de cinco séculos (colônia, monarquia, ditadura militar, falsas democracias de direita ou de esquerda), foram sempre marcados pela corrupção e pela impunidade, pouco se importando em fazer as reformas estruturais capazes de construir uma cidadania de verdade.

Recentemente, à ditadura pelas armas sucedera a ditadura pelo voto popular. O voto de cabresto é a negação do próprio princípio democrático por causar um verdadeiro mercado: irá vencer quem tiver mais dinheiro ou, estando já no poder, oferecer mais regalias e colocar melhor a máquina do Estado a serviço da propaganda eleitoral. Até quando os homens de bem têm que suportar tamanha safadeza? No Senado da Roma antiga, pergunta semelhante o cônsul aristocrata M.T. Cícero fazia ao colega do partido democrático, que promovia convulsão social:

“Usque tantum, Catilina, abutere patientia nostra?” (Até quando, Catilina, abusarás da nossa paciência?).

A recordação do passado nos deveria servir para verificar como a história se repete. Infelizmente, a evolução do cérebro humano é muito lenta: levamos milhões de anos para nos diferenciar dos primatas e ainda agora continuamos praticando a lei da selva: o mais forte ou mais experto leva vantagem sobre o pobre ou menos esclarecido. É tão difícil perceber que a causa primeira de nossos males sociais não está no homem, mas no sistema em vigor? Se o político não entrar no esquema da roubalheira, não terá os meios necessários para se manter no poder. Se não for corrupto, será obrigado a ser conivente ou omisso.

Que diferença faz escolhermos como Presidente da República um sociólogo ou um torneiro mecânico, um militar ou um civil, um homem ou uma mulher, se qualquer um deles, para governar, precisará barganhar o apoio de deputados e senadores que vendem seus votos em troca de benefícios? Adianta mudar o maestro se a orquestra permanecer a mesma? Estaremos sempre gritando no deserto se não conseguirmos cortar o mal pela raiz. A falha está na própria Carta Magna vigente, redigida por políticos que legiferaram em causa própria, salvaguardando seus privilégios e imunidades, institucionalizando a corrupção nos escalões governamentais. E qualquer forma de injustiça cria revolta, corroendo o princípio fundamental da democracia, que é a igualdade de todos perante a lei, cada um sendo remunerado conforme o mérito.

Faz-se, então, necessária uma nova Constituição, elaborada não pelos políticos no poder, como aconteceu em 1988, mas pelas forças vivas da Nação. Os Constituintes não deveriam ser deputados ou senadores, mas representantes das várias categorias da sociedade (advogados, professores, estudantes, sindicalistas, livres profissionais, artistas, sociólogos, cientistas), que jurariam nunca ocupar cargos públicos eletivos ou executivos. O projeto constitucional seria submetido à apreciação de todos os cidadãos, via Internet e outros meios de mídia interativa, para acolher sugestões. Sua redação final seria objeto de aprovação popular via Referendum ou Plebiscito.

Talvez seja uma utopia, mas precisamos lutar para isso acontecer, pois reformas sociais substanciais só podem ser realizadas a partir de uma nova estrutura política que garanta, ao mesmo tempo, governabilidade e alternância no poder. O modelo de governo a ser implantado poderia ser o atualmente adotado pelas melhores democracias européias e de cultura escandinava ou anglo-saxônica: Bipartidarismo com Parlamentarismo, candidatos escolhidos pelas bases partidárias (eleições primárias), campanha eleitoral financiada exclusivamente com dinheiro público. Antes de uma reforma política para valer, qualquer tipo de eleição deveria ser considerado suspeito pelo abuso do poder econômico ou estatal. Cabe aos brasileiros que têm consciência cívica iniciar uma campanha pública para exigir tal reforma com urgência, ameaçando a desobediência civil pela abstenção de votar em qualquer político filiado aos atuais partidos.

Salvatore D’ Onofrio – Doutor pela USP e Professor Titular pela UNESP

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