Os dias prosseguiram sem maiores informações. Os policiais, cada vez mais pressionados para solucionarem o caso, resolveram juntar todas as informações que conseguiram até aquele instante. Todos se reuniram, mais uma vez, na sala do delegado Hudson.
Luciano Baiano expôs todos os dados dos crimes. O primeiro pé fora encontrado no Parque da Cidade no dia três de janeiro. O segundo, na Asa Sul, na quadra 306, no dia 19 de janeiro. O terceiro e, até aquele momento, o último, na Asa Norte, na quadra 306, no dia quatro de fevereiro.
Enquanto o colega prosseguia, Ricky se levantou e ficou observando o grande mapa do Distrito Federal preso à parede da sala. Ele pegou uma caixa de percevejos e marcou os três pontos no mapa. Pensativo, nem percebeu quando o motoboy entregou o pedido do lanche que o delegado havia solicitado: pastéis e refrigerantes.
— O meu é o de queijo, hein, galera! – disse Mariane.
— Ricky, você quer pastel de quê? – Márcio perguntou.
O experiente policial se virou e, para seu espanto, tudo se tornou óbvio como nascente de água.
— Quadrado perfeito!
— O quê, Ricky? – quis saber Hudson.
— Doutor, se eu fosse o senhor, não comeria esse pastel.
— Por quê?
— Quadrado perfeito.
— O quê?
Ricky pegou um percevejo e marcou um quarto ponto no mapa. Depois pegou um pedaço de barbante e cercou os quatro pontos. Mariane olhou para Ricky e foi a primeira a entender.
— Quadrado perfeito. Ainda bem que o meu pastel é de queijo.
Ricky Ricardo explicou a sua tese, que, por mais estranha que pudesse ser, não foi colocada em dúvida pelos companheiros. Ele disse que todos os pés foram encontrados com intervalos de 16 dias e com distâncias que, quando unidas, formavam um quadrado.
— Os pés foram encontrados nos dias três de janeiro, 19 de janeiro, quatro de fevereiro, ou seja, a cada 16 dias. Dezesseis é o quadrado de quatro. Olhem a embalagem desses pastéis. Pastelaria Quadrado Perfeito. Hoje é dia 19 de fevereiro. O nosso autor vai desovar o quarto pé hoje à noite ou na madrugada, pois amanhã será dia 20, ou seja, 16 dias após o terceiro pé. E esse será o último crime desse cara, pois terá completado o quadrado.
Os policiais, após ouvirem a tese do Ricky, se convenceram de que ele estava certo. Combinaram fazer campana em quatro viaturas descaracterizadas para não levantarem suspeitas. As duplas foram escolhidas da seguinte maneira: Ricky e Mariane, Pedro e Gustavo, Luciano e Márcio, Hudson e o escrivão Gilmar, que foi chamado de última hora.
Ao chegaram ao local, Ricky percebeu que manter tantos veículos poderia espantar o autor. Luciano propôs que ele e Márcio ficariam em cima de uma árvore, pois estariam encobertos pela vasta folhagem. Pedro e Gustavo concordaram e também se dispuseram a fazer o mesmo. Enquanto isso, Hudson e Gilmar simulariam que estavam com o veículo enguiçado no ponto determinado. Ricky e Mariane estariam em um local mais distante, onde poderiam ter uma visão geral da área.
A campana, iniciada às 18h do dia 19 de fevereiro, havia consumido toda a noite e já chegava perto das 4h da madrugada do dia seguinte. Os agentes, que se comunicavam através de mensagens pelo celular, estavam exaustos, especialmente os quatro que continuavam escondidos nas árvores.
— Calma, galera, que estou com pressentimento de que estamos quase lá! – Ricky procurava manter os ânimos aflorados.
Eis que a Mariane chamou a atenção do Ricky e apontou para um vulto se aproximando de uma lixeira. O experiente policial observou a cena, enquanto o suspeito parou por alguns instantes, observou o relógio e olhou ao redor. Ricky percebeu que o indivíduo estava próximo ao local onde Luciano e Márcio estavam escondidos. Ele alertou os companheiros, mas pediu para não agirem ainda.
— O que está esperando, Ricky? – perguntou Mariane.
— Nosso suspeito vai esperar dar 4h para depositar o saco na lixeira.
— Hum! Quadrado perfeito!
— Isso, Mariane!
Pontualmente, o suspeito depositou um saco na lixeira. Nesse momento, Ricky mandou aviso a todos os companheiros, enquanto falou para Mariane ligar o carro e ir em direção ao suposto autor. Em segundos, os policiais chegaram ao local, sendo que Luciano e Márcio, que estavam mais próximos, já haviam abordado e algemado o suspeito. Aliás, a suspeita, como logo perceberam.
Márcio, que estava com luvas, pegou o saco que havia sido depositado na lixeira. Ao abri-lo, encontrou um pé. O quarto e derradeiro pé esquerdo, como Ricky Ricardo havia previsto.
Já na delegacia, Lorena Cardoso de Almeida, 35 anos, ex-professora de matemática, disse que havia se desiludido com a profissão. Acabou montando uma pastelaria, a Quadrado Perfeito. A primeira vítima foi seu ex-namorado, que a teria agredido. Os outros foram homens que ela atraiu para sua chácara, que ficava na região de Planaltina. Era lá que a mulher os matava e depois os descarnava. A carne, como também deduziu Ricky, era utilizada para rechear os pastéis vendidos.
Durante o interrogatório, o delegado Hudson, ainda intrigado com o fato de Lorena ter escolhido o pé esquerdo, questionou a assassina.
— Imagine que você esteja em um ponto. Se você quer ficar voltado para fora da figura a ser formada, pode começar pelo lado direito ou pelo esquerdo. Escolhi o esquerdo e segui a linha até fechar o quadrado.
— E por que o pé?
— Não iria usar carne de pé para rechear os pastéis. Pés são sujos, e os meus clientes merecem o melhor.
— E o que você fez com os pés direitos?
— Olha, o Fofinho precisa comer, né?
— Fofinho? Quem é Fofinho?
— Ué, o meu cachorro.