Agnaldo, apesar de ter compulsão por pegar o que é dos outros, não podemos chamá-lo de ladrão. É que o homem sofria de cleptomania, que é um transtorno psiquiátrico. Não que o sujeito quisesse prejudicar a vítima, bem como o objeto em si não tivesse valor financeiro para Agnaldo. Entretanto, tal explicação nem sempre era suficiente para livrar o rapaz dos imbróglios que se metia.
Pois a última confusão que Agnaldo se meteu foi na semana passada, quando acompanhou Jurema, a esposa, até o supermercado ali das quadras 407/8 Sul. E lá estava ele empurrando o carrinho de compras, enquanto a mulher pegava cinco quilos de arroz, dois de feijão, algumas laranjas, alface, tomate, limão, farinha de trigo… A lista era enorme.
Foi num momento de distração de Jurema que o marido surrupiou uma barra de chocolate e a meteu no bolso do casaco. Ele abriu um sorriso de satisfação, como se o Flamengo tivesse sido favorecido pela arbitragem mais uma vez. O problema é que o gajo foi flagrado por um vigilante, que ficou de olho.
Após passar pelo caixa, lá foi o casal em direção ao carro. Foi nesse exato momento em que o vigilante do estabelecimento abordou o Agnaldo. Pego em flagrante, o homem não conseguiu inventar desculpas. Em seguida, a polícia foi acionada e conduziu o cleptomaníaco para a delegacia.
Conversa daqui, conversa dali, conversa até de acolá, o delegado arbitrou fiança de dois mil reais. Jurema ainda tentou demover a autoridade policial daquele valor exorbitante, ainda mais levando em conta que a barra de chocolate não custava nem dez reais.
— Minha senhora, a fiança não leva em conta apenas o valor do item furtado, mas da infração penal. O seu marido cometeu um crime e deve pagar por ele.
— Ele é cleptomaníaco.
— E daí? Sou tricolor e não saio por aí pegando o que não é meu.
Jurema, percebendo que não adiantava continuar naquela discussão infrutífera, foi sacar a quantia da fiança. Furiosa que estava, pegou todas aquelas notas e as trocou por moedas. Colocou tudo numa sacola e retornou para a delegacia.
— Aqui estão os dois mil. Agora solte o meu marido.
O delegado olhou espantado para aquela quantidade enorme de moedas. Nem pensou em reclamar. Olhou para o Gilmar, o escrivão, que passou um bom tempo contando aquela quantia.
— Doutor, faltam dez centavos.
O delegado, furioso com aquilo, mas querendo se livrar daquela pendenga o mais rápido possível, catou uma moeda no bolso e a entregou para o escrivão. Não tardou, Agnaldo e Jurema saíram de mãos dadas da delegacia. Apesar de aliviada pela soltura do marido, ela passou o dia inteiro com um pensamento fixo: “Ô, chocolate caro!”
*Eduardo Martínez é autor do livro “57 Contos e Crônicas por um Autor muito Velho”.