Denise Caputo
Apesar do incremento da produção agrícola de orgânicos no Distrito Federal, o uso de agrotóxicos ainda é marcante e crescente, em sintonia com o cenário nacional, que coloca o Brasil como o maior consumidor de agrotóxicos do planeta. O tema foi discutido em comissão geral realizada nesta quinta-feira (1º) no plenário da Câmara Legislativa.
Segundo o pesquisador da Embrapa Hortaliças Vicente Eduardo Almeida, entre 2008 e 2013, o uso de agrotóxicos por unidade plantada (hectare) no DF subiu 63%, ao mesmo tempo em que o registro de intoxicações a cada 100 mil pessoas cresceu 3.519%. “Há uma correlação perfeita entre o aumento no uso desses produtos e o número de intoxicações”, afirmou.
“É preciso discutir a responsabilidade dos produtores nesse processo, como está a fiscalização e outros aspectos”, destacou o deputado Ricardo Vale (PT), à frente do debate e autor de um projeto de lei que estabelece a obrigatoriedade de indicação expressa sobre o uso de agrotóxicos nos produtos alimentares produzidos e comercializados no Distrito Federal (PL nº 696/2015).
O presidente da Frente Parlamentar de Segurança Alimentar e Nutricional da Câmara dos Deputados, Padre João (PT-MG), elogiou a discussão na Câmara Legislativa e disse reconhecer a legitimidade dos interesses econômicos envolvidos na aplicação de inseticidas, fungicidas e herbicidas na produção agrícola. “Mas tem que ter limite”, ponderou.
Assim como outros participantes da comissão geral, o deputado federal apontou os riscos da pulverização aérea em áreas rurais e urbanas para a segurança alimentar, o meio ambiente e a saúde. “Pesquisas apontam relação entre agrotóxicos e várias doenças, como problemas neurológicos e câncer”, destacou. Padre João criticou ainda a continuidade do uso de agrotóxicos já proibidos em outros países.
Esse ponto também foi levantado pela toxicologista da Fiocruz Karen Friedrich. De acordo com a pesquisadora, o Brasil continua a consumir 60 substâncias proibidas em outros locais; sendo que, dos 50 agrotóxicos mais utilizados pelos agricultores brasileiros, 29 não são permitidos fora.
Ainda segundo Friedrich, o brasileiro consome 7,2 litros per capita de substâncias agrotóxicas por ano, resultando em diversos efeitos agudos (imediatos) e crônicos (tardios). “Pesquisa da Anvisa alerta que 1% dos alimentos consumidos pode causar dano imediato (intoxicação)”, ressaltou.
Outro lado – O presidente do Sindicato Rural do DF, Giovani Muller, disse desconfiar, contudo, dos dados de algumas pesquisas. “Estamos, então, bebendo agrotóxico?”, ironizou. Ele disse morar numa casa localizada a cinco metros da área plantada e não sofrer as consequências da aplicação de agrotóxicos. “Estou todo dia na roça e sei que tem, sim, uma maneira certa de utilizar agrotóxicos”, afirmou. Apesar das críticas ao cenário apontado pela maioria participantes, o sindicalista reconheceu ser preciso “brecar” o uso indiscriminado de algumas substâncias.
O secretário de Agricultura e Desenvolvimento Rural do DF, José Guilherme Leal, também concordou poder haver problemas na dosagem e na aplicação de alguns produtos por parte de alguns produtores. “Mas há um regramento complexo que tem segurança relativa se bem aplicado”, disse.
O chefe da pasta frisou ser importante refletir sobre os dados de forma técnica para avançar nas políticas públicas da área. E informou que o GDF tem buscado fiscalizar o comércio e o uso de agrotóxicos, implantar um programa de boas práticas agropecuárias, além de capacitar os produtores.
Propostas – Entre as propostas apresentadas pelos participantes, com vistas a reduzir o uso e os impactos dos agrotóxicos, estão a proibição de pulverização aérea; a suspensão da isenção tributária dos agrotóxicos; o fornecimento de alimentos orgânicos em hospitais e escolas, e a inserção de informação sobre as substâncias utilizadas na produção nos rótulos de alimentos.
“As pessoas se preocupam com gordura e sódio nos produtos, e ninguém pode ignorar o resíduo dos agrotóxicos nos alimentos. É um direito ter essa informação”, frisou Padre João.
Informação – Conforme citado, o PL nº 696,/2015, do deputado Ricardo Vale, torna obrigatória a inserção de informação, de forma expressa e legível, do uso de agrotóxicos nos alimentos produzidos e comercializados no Distrito Federal, “em suas formas de apresentação natural, minimamente processado, parcialmente processado ou industrializado”. O texto estabelece que a indicação deve constar no rótulo da embalagem e nas caixas de acondicionamento dos produtos comercializados em sua forma natural, no atacado ou a granel.
A proposição já passou pelas comissões de Defesa do Consumidor; de Economia, Orçamento e Finanças, e de Constituição e Justiça.