Ailton, após quase seis meses de conversinhas infrutíferas, tomou coragem. Decidido, aproximou-se da mesa de Edivânia, colega de trabalho. Em pé em frente à mulher, mas sem valentia de encará-la, o homem se tremia todo.
— Você está bem, Ailton?
— Tô.
— Vê se não vai me cair duro aqui. A Marli já limpou o chão hoje.
O destemor, que o gajo imaginava estar ao seu lado, ao menor sinal de perigo, o abandonou. Sem maiores expectativas, Ailton tratou de dar meia-volta. Edivânia, atolada em serviço, apenas balançou a cabeça e voltou a atenção para a montanha de papéis à sua frente.
Hora do cafezinho, segunda tentativa. Lá estava o Ailton, garrafa térmica na mão, quando Edivânia apareceu. Ela pegou uma xícara e a estendeu para o rapaz. Ele se tremeu que nem vara verde.
— Ailton, você hoje está muito estranho. Aconteceu alguma coisa?
— Não.
— Do jeito que você está tremendo, melhor eu me servir. Dê aqui essa garrafa.
Não demorou, Edivânia, xícara na mão, caminhou firme até a sua mesa. Poderosa que era, sabia muito bem que o colega estava acompanhando seu andar. E andou divinamente para deleite do Ailton, que jurou para si próprio que, da próxima vez, falaria o que estava lhe causando palpitações no coração.
As horas correram mais do que o esperado naquele dia. Pobre Ailton, não teve ímpeto de se aproximar da colega, até que, finalmente, o momento de ir para casa chegou. Já no corredor, por um desses acasos que acontecem quando mais tememos, eis que o homem se viu diante da Edivânia.
— Ailton, você está bem?
— Tô.
— Olha, sei que às vezes é difícil se abrir, mas sou sua amiga. Se quiser, podemos conversar qualquer dia desses. Que tal me convidar para jantar?
Ailton não acreditava no que estava ouvindo. Sem medo de ser feliz, aceitou prontamente a sugestão de convidá-la para um jantar. Marcaram para a sexta-feira seguinte em um afamado restaurante da cidade.
E lá estavam os dois pombinhos sentados, frente a frente num dos melhores pontos do restaurante, de onde poderiam desfrutar a vista do jardim logo abaixo. A temperatura agradável permitiu que a mulher retirasse o casaco. Ailton precisou se esforçar para não tirar os olhos dos olhos de Edivânia.
Antes de fazerem os pedidos, resolveram tomar um aperitivo. Ailton, animado com a bebida, começou a balbuciar algo, mas sua voz estava quase inaudível, o que dificultava a comunicação. Edivânia pediu para ele falar um pouco mais alto, momento em que o homem mexeu levemente na cadeira para se aproximar. Mas eis que um dos pés da cadeira tombou para o lado e lá se foi o Ailton rolando que nem jaca madura ribanceira abaixo até atolar a fuça na terra bem ao lado de uma rosa.
Edivânia, desesperada, começou a rir de nervoso, enquanto apontava para o colega. Garçons vieram acudir Ailton, que se levantou e foi puxado pelos braços firmes dos funcionários do restaurante. Os outros clientes, curiosos, olharam para aquela cena digna de pastelão.
Lá estava o Ailton, rosto todo coberto por terra, mas com uma rosa na mão. Ele ergueu o braço e a ofereceu para Edivânia. Apesar do gesto arrojado, o homem não conseguia proferir nem uma palavra sequer. A mulher, que de boba nada tinha, sorriu.
— Ailton, você quer ser meu namorado?
*Eduardo Martínez é autor do livro “57 Contos e Crônicas por um Autor muito Velho”.
Compre aqui
http://www.joanineditora.com.br/57-contos-e-cronicas-por-um-autor-muito-velho