Um dos principais nomes do piano nacional, Aleyson Scopel volta à Sala Cecília Meireles, após dois anos, para apresentar, no dia 10 de junho, sábado, recital solo que celebra sua discografia dedicada ao compositor Almeida Prado — o último trabalho foi o álbum “Noturnos e Ilhas” (selo Grand Piano – Naxos), lançado em setembro do ano passado.
Aleyson irá executar um repertório centrado em duas grandes obras representativas do romantismo de Franz Schubert e do modernismo de Almeida Prado. O concerto integra a série Pianistas e faz uma homenagem ao saudoso compositor – um dos maiores expoentes da música de concerto brasileira da segunda metade do século XX e início do século XXI – que completaria, em fevereiro, 80 anos de vida.
Em 2023, estão previstas outras iniciativas para celebrar a efeméride. Ao concerto e ao CD “Noturnos e Ilhas”, soma-se, ainda, um álbum a ser lançado neste ano, em São Paulo. Em abril, Aleyson Scopel gravou com a violinista Gabriela Queiroz (spalla da Orquestra Sinfônica Brasileira), a “Sonata nº2” e a versão para violino e piano das “Cartas Celestes”, ambas do Almeida Prado. O álbum reunirá cinco duos diferentes interpretando a integral das obras para violino e piano do compositor, um projeto com coordenação de sua filha violinista, Constança Almeida Prado Moreno, e que também foi concebido para celebrar os 80 anos do pai. Antes, em novembro do ano passado, Aleyson e Gabriela subiram ao palco do afamado Carnegie Hall para executar a estreia norte-americana da mesma “Sonata nº2” para violino e piano.
Presença de destaque no cenário musical brasileiro, Aleyson Scopel apresenta-se regularmente como solista à frente das principais orquestras do país, como a Osesp, Filarmônica de Minas Gerais, OSB, Sinfônica de Porto Alegre, Amazonas Filarmônica, entre outras. É também detentor dos prêmios Nelson Freire e Magda Tagliaferro, e foi laureado em diversos concursos internacionais, tais como William Kapell e Villa-Lobos.
O programa na Sala Cecília Meireles abre com a ‘Sonata em Si bemol D. 960’, de Schubert, sua última obra dedicada ao gênero. Ela foi composta em 1828, pouco antes de sua morte, período de grande transbordamento criativo durante o qual ele também compôs, entre outras obras, seu mais importante ciclo de canções, a ‘Winterreise’ (Jornada de Inverno). Como a maioria das sonatas para piano de Schubert, elas caíram no esquecimento ao longo do século XIX. Mas, na segunda metade do século XX, a opinião de público e crítica havia sofrido uma alteração radical em relação a estas composições, que são atualmente colocadas entre as mais importantes das obras maduras do compositor, integrando o repertório obrigatório de todos os grandes concertistas. A peça se desenvolve em quatro movimentos que se expandem de maneira lírica através das harmonias que criam contrastantes matizes de cores e universos sonoros.
Cerca de 156 anos separam a obra derradeira de Schubert do quarto volume das ‘Cartas Celestes’ de Almeida Prado, a peça escolhida por Scopel para compor o programa. Com uma idiomática completamente diferente, apoiada sobretudo nas ressonâncias do instrumento, a obra é uma viagem sonora, ao longo dos seus 20 movimentos, por objetos celestes tais como planetas, constelações e galáxias que podem ser observados pelo céu do Brasil nos meses de fevereiro e março. Ela faz parte de um ciclo de 18 volumes, dos quais 15 são dedicados ao piano. O pianista Aleyson Scopel possui uma relação muito íntima com a música de Almeida Prado, tendo gravado cinco álbuns dedicados à sua música, incluindo a integral até então inédita das Cartas Celestes, obras de extrema dificuldade e virtuosismo.
Aleyson Scopel nasceu no Espírito Santo e se mudou para os Estados Unidos ainda adolescente. Lá, se formou em Boston, com uma bolsa de estudos no New England Conservatory of Music, tradicional instituição, onde estudou na classe da professora Patrícia Zander, discípula da escola francesa de Vlado Perlemuter e Nadia Boulanger. Seu primeiro encontro com a música de Almeida Prado foi com o primeiro volume das “Cartas Celestes”, que ele gravou em seu primeiro CD, resultado de um recital ao vivo na mesma Sala Cecília Meireles, em 2008. Sua execução foi assim descrita pelo próprio compositor, na época ainda vivo: “Saíram diretamente do Céu! Chuvas de meteoros, radiantes constelações, nebulosas resplandecentes, e um vigor transcendental marcaram a genial interpretação deste imenso pianista. Maravilhoso!” Ele viria a dedicar o XV volume da série a Scopel, que resolveu então gravar a integral a convite do selo.
Natural então, que Scopel continuasse explorando a obra rica e variada deste compositor no seu mais recente registro fonográfico. “Seus 14 Noturnos para piano foram escritos entre 1985 e 1991. Eles não foram escritos, necessariamente, com o intuito de serem executados como um ciclo. Entretanto, ao ouvirmos todos eles em sequência, podemos alcançar a grandiosidade de sua escrita multifacetada, exemplificada em cada uma dessas obras”, explica Scopel. “São obras mais acessíveis ao grande público por possuírem uma linguagem muito lírica”, continua.
A obra “Ilhas” foi escrita em 1973, um ano antes da composição do primeiro volume de suas “Cartas Celestes”. Ela pode ser ouvida como sua predecessora, principalmente pelo uso de um material cordal pré-estabelecido através das sete ilhas, chegando à sua apresentação final no Arquipélago. O gérmen da exploração de sonoridades de ressonância do instrumento também está presente aqui. A associação poética com títulos como Ilha de Gelo, Pedra ou Flores, por exemplo, nos dá a indicação de uma música programática, uma maneira a mais para se identificar com a obra, passando pela ígnea densidade dos 9 vulcões ao majestoso e impessoal iceberg da Ilha de Gelo. “Essa é definitivamente uma obra mística que merece ser apreciada a todo volume”, completa.