Dênia Magalhães
A lembrança é de experientes catedráticos: quando o estudante começa a enveredar pelo Direito Penal, seja o concurseiro ou o acadêmico, uma das primeiras dúvidas a se dirimir é a diferença entre furto e roubo.
Os dois crimes, enfatizam esses professores, dizem respeito à subtração para si ou terceiros de coisa alheia móvel, diferenciando-se pelo emprego de violência ou grave ameaça à pessoa.
Para sermos mais didáticos: o furto, subtração sem violência, tem suas qualificadoras a fim de aumentar a pena em casos de uso de chave falsa, arrombamento, abuso de confiança, fraude, escalada ou destreza; este último é a qualificadora dos batedores de carteira.
O roubo, por sua vez, exige que a subtração ocorra com emprego de violência contra a pessoa, podendo-se aumentar a pena em caso de uso de arma, participação de mais pessoas, o fato de a vítima trabalhar com transporte de valores e também a restrição de sua liberdade.
Como se observa, a diferenciação dos crimes parece muito simples, eis que o elemento violência é condição sine qua non para que se possa enquadrar a conduta em um crime ou noutro.
Porém, como observam, além de professores, renomados juristas, em que pese tão simples diferença – não estamos falando de termos técnicos e termos vulgares –, parece que algumas autoridades responsáveis pela segurança pública têm dificuldade em marcar a alternativa correta.
Por isso mesmo causou espanto, até mesmo entre defensores públicos, que a recém empossada secretária de Segurança do Distrito Federal Márcia Alencar tratasse em entrevista a conduta de três menores que espancaram brutamente um segurança de supermercado que não permitiu sua saída do local levando uma mercadoria.
Para a psicóloga que exerce o mais alto cargo da segurança pública de Brasília, o fato de a mercadoria ser uma cesta básica, enquadra os agressores na hipótese de furto famélico.
O furto famélico, embora não esteja previsto em lei, já foi consagrado pela jurisprudência com o entendimento de que a fome e a miserabilidade colocam o indivíduo num estado de necessidade que exclui a conduta criminosa, na forma do artigo 23, I do Código Penal.
Um advogado que atua na área criminal lembra que para a configuração do furto famélico, a conduta deve ser o furto, ou seja, a subtração da coisa sem que haja violência ou grave ameaça à pessoa. Ademais, ao se analisar o furto famélico, o juiz verifica a proporcionalidade entre a coisa subtraída e a necessidade, não sendo razoável que uma pessoa em condição de extrema necessidade furte um objeto que não lhe saciaria a fome imediatamente.
– Respeitada a legislação é inadmissível que uma pessoa que comanda a segurança pública do Distrito Federal seja incapaz de diferenciar duas condutas tão distintas, desaba um professor, ao analisar a postura da psicóloga Márcia Alencar.
E conclui, enigmático, afirmando que talvez o nariz quebrado do segurança espancado, não seja suficiente para que receba a visita dos defensores dos direitos humanos, mas certamente o mingau dos agressores menores está garantido pela psicologia criminal.