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Desculpa esfarrapada

Almir, enrolado como briga de polvo, tem emprego ameaçado

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Autor/Imagem:
Eduardo Martínez - Foto Produção Irene Araújo

Almir era sujeito faceiro, garboso até dizer chega, mas tinha lá seus defeitos. O mais flagrante era que o cabra, quando queria, podia ser mais enrolado do que briga de polvo. Se dizia uma coisa, facilmente desdizia o que disse ou, pior, assumiria que jamais teria dito. E assim levava a vida, como se todos devessem acreditar em tanta armação.

Não se pode afirmar, entretanto, que Almir estivesse de todo errado quando o assunto era o desgosto por trabalhar. Afinal, quem, em sã consciência, o faz por prazer? Mas ele não havia nascido milionário nem mesmo poderia ser considerado pertencente à tão almejada classe média alta. Era, no máximo, média medíocre e olhe lá. Por isso, fazia-se necessário labutar para conquistar o quinhão que lhe fizesse manter a despensa abastecida com o suficiente, para caso de, valha-me Deus, fosse demitido.

Como o leite das crianças precisava ficar garantido por, ao menos, um mês, o homem até que tentava se esforçar, mas a sua natureza, nem sempre, colaborava. Que a culpa caísse, portanto, sobre ela! Ainda mais porque o acontecido caiu logo numa segunda-feira, cuja terça seguinte nem era feriado.

Antônio, patrão do Almir em uma loja da Asa Norte, já estava mais angustiado do que piolho em cabeça de careca, cuspia marimbondos e lacraias por mais aquele atraso do funcionário. Cadê aquele maldito? Onde será que se meteu o pilantra? Só falta chegar aqui no final do expediente com aquela cara lavada para dar a desculpa mais estapafúrdia.

De tão nervoso, Antônio telefonou dezenas de vezes pro Almir, mas só ouvia a mensagem de que o celular estava desligado ou fora de área. Fora de área ficaria o salafrário, ou melhor, a vontade do patrão era dar uma bicuda no traseiro do subordinado para que ele nunca mais aparecesse. Tentou até se acalmar, mas trocou o chá pelo cafezinho, o que o fez ficar ainda mais transtornado.

Quase duas da tarde, lá foi o patrão tocar a campainha da residência do Antônio. Tocou, tocou, tocou! Mas nada! Será que ele havia saído? Esmurrou a porta, até que, finalmente, surgiu o gajo, com remela nos olhos de tanto dormir.

— Seu Antônio, acredita que até agora estou procurando as chaves do carro?

— Ah, é? E faz quanto tempo que você acordou agora?

*Eduardo Martínez é autor do livro “57 Contos e Crônicas por um Autor muito Velho”.

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