Promessa é dívida
Alunos da rede pública usam Notibras como pauta de português
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emAlgumas coisas bem legais aconteceram comigo após decidir levar a sério o trabalho como escritor. Ganhei alguns prêmios, fui convidado pelo José Seabra para ser cronista/contista do Notibras, passei a ser reconhecido nas ruas e recebi várias mensagens de pessoas que gostaram dos meus textos. No entanto, posso afirmar que, sem qualquer receio de estar falando bobagem, nada se compara a encontrar as turmas do professor Leandro Mendes no Centro de Ensino Fundamental 102 Norte (CEF 102 Norte).
Esse contato com o Leandro surgiu quando ele me mandou uma mensagem no início de 2022. Ele queria a minha autorização para utilizar os meus textos em sala de aula. Quase caí da cadeira, pois é o sonho de qualquer escritor alcançar algo assim. É óbvio que aceitei na hora. A partir de então, o Leandro utiliza meus contos e crônicas em trabalhos e provas com seus alunos e, inclusive, um dos textos de minha autoria virou uma peça de teatro feita pela garotada.
Pois bem, na terça-feira, 21, fui até o CEF 102 Norte para o meu segundo encontro, já que, ano passado, estive lá pela primeira vez, e, de cara, fui recebido por um entusiasmado Leandro, que me confidenciou que muitos dos seus alunos estavam descrentes de que eu iria conversar com eles, sem falar nos outros, que estavam muito ansiosos. Eu disse que havia acordado às 2h da madrugada, tamanha ansiedade que havia tomado conta de mim, mesmo que o encontro estivesse programado para o período da tarde.
Assim que fui apresentado à primeira turma, percebi naqueles olhos infantis um brilho que, talvez, muitos de nós perdemos ao longo dos anos. A garotada não parava de me fazer perguntas das mais variadas. Tentei responder a todos da maneira mais direta possível, mesmo porque logo se formou uma conexão entre nós, como se já fôssemos amigos há tempos. Coisas de crianças, que deveríamos levar conosco para sempre.
Vários nomes, que eu conhecia apenas das cartinhas recebidas daquela galera, se tornaram rostos naquele momento. A Liv, uma menina com os olhos e cílios enormes como os da minha filha mais velha, a Ninica. O Odin, com seu nome de deus nórdico. O Wendell, que ficou feliz por eu ter escrito o seu nome corretamente. O Rochinha, carismático além do infinito, que havia me recebido antes de eu entrar em sala de aula.
Outro menino que me encantou foi o Christopher, artista nato. Ele, sem qualquer traço de timidez, veio me falar que sabia fazer imitações.
– Eduardo, você quer me ver imitar um bem-te-vi?
Obviamente que respondi que sim. E lá estava aquele som lindo saindo diretamente da garganta desse menino. Mas não pense que parou por aí. Ainda teve imitação da cantora Joelma, que rendeu um comentário meu.
– Se você treinar mais, vai cantar melhor até que a Elza Soares.
O Christopher riu e, antes que nos despedíssemos, fez outra imitação, agora do som de um golfinho. Que talento! Eu ali parado diante de um artista pronto!
Ao todo, conversei com cinco turmas do professor Leandro. Em cada uma delas, fui acolhido de maneira extremamente carinhosa. O tempo voou e, antes de terminar este texto, quero destacar o que uma estudante, a Janaína, me disse, ao mesmo tempo em que me sorria aquele sorriso tão cheio de vida.
– Eduardo, eu não acreditava que você existia.
– Como assim, Janaína?
– Ah, o professor Leandro falava pra gente que você viria nos visitar em novembro, mas eu não acreditava. Eu pensava que, no final, ele diria que o escritor era ele.
Assim que eu ouvi essas palavras da Janaína, eu lhe disse que iria escrever sobre isso. Ela talvez não tenha acreditado, mas, quando ler esta crônica, talvez perceba que, além de eu existir, cumpri com a minha palavra.