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‘Armandinho, querido, angu se come quente’

Adolescência é uma fase complicada para praticamente todos os mortais e, na verdade, não foi muito diferente para Tereza, pouco mais rechonchuda que a maioria, óculos fundo de garrafa, além das bochechas repletas de erupções conhecidas vulgarmente como espinhas. No entanto, a despeito de tais percalços, ela não tirava os olhos do Armandinho, que, caso desejasse ser ator, poderia facilmente interpretar qualquer galãzinho de seriado infanto-juvenil.

Veja você o que aconteceu certo dia! Pois lá estava a Tereza na festinha de formatura da turma, jogada num canto, como se tivesse sido esquecida ali. Ninguém a notava, muito menos o Armandinho, que recebia todos os olhares femininos, além de despertar a inveja nos rapazes.

Seja como for, pela primeira vez em toda sua existência, Tereza criou coragem para, finalmente, ir ao encontro do seu amado oculto. E foi! Foi mesmo, mas tudo aconteceu como o previsto por quase todos, menos pela pobre garota. Gente, que fora a Tereza levou! Além de caras e bocas, o Armandinho ainda foi cruel, como praticamente todo adolescente sabe ser.

– Se enxerga, cara de pipoca!

Todos caíram na gargalhada, o que contribuiu ainda mais para aumentar o posto de herói da galera. Tanto é que esse foi o assunto do dia seguinte, da semana inteira, quase perdurante pelo restinho do ano. O trauma foi tão grande, que Tereza desejou sumir do mapa. Não necessariamente do mapa, mas daquela rua. Por sorte, acabou passando no vestibular e até mudou de cidade.

Os anos se passaram, levando consigo aquelas marcas terríveis da adolescência. Tereza, agora com seus pouco mais de 30 anos, havia montado sua própria empresa de construção civil. Transformara-se numa mulher muito bonita, ainda mais porque o dinheiro havia dado uma forcinha para a natureza. Tereza poderia ser chamada de mulher que para qualquer trânsito. Se bem que essa frase não é a mais apropriada para se dizer em São Paulo, onde ela foi morar depois de formada, já que o trânsito por lá, de tão caótico, vive parado.

Os dias corriam ligeiros na capital paulista, mas nem por isso Tereza deixava de curtir as noites de sexta-feira. Aliás, ela tinha até uma frase pronta para essas ocasiões: “Preciso desopilar o fígado!” E foi justamente numa dessas saídas, na casa de uma amiga, que ela acabou reencontrando sua paixonite dos tempos de escola. Tereza logo o reconheceu, já que não havia mudado tanto assim. Na verdade, ela pensou: “Não é que o filho da mãe está ainda mais bonito!”

Tereza fez questão de ser notada pelo seu antigo colega de sala nas escolas-classe de Brasília. E foi! Tanto é que foi ele quem se aproximou, como se fosse um caçador certo de que iria se dar muito bem diante daquela caça tão formosa. Trocaram olhares sorridentes. “Não me lembrava que esse cretino tinha dentes tão lindos”, pensou Tereza.

Passaram a noite toda praticamente conversando a sós. Ele, obviamente, parecia não reconhecê-la. Ela, por sua vez, não fez a menor questão que ele soubesse. E, já na hora dos últimos batimentos cardíacos da festa, o irresistível Armandinho pegou suavemente a delicada mão de Tereza, ao mesmo tempo em que lhe lançou aquele olhar penetrante.

– Quer esticar a noite no meu apartamento?

– Garoto, se você não aproveitou quando o angu estava quente, agora é que não dá mesmo!

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