Felipe Saturnino
Aprender a cortar madeira e descobrir o tipo de matéria-prima mais adequado para confeccionar cada objeto exige sensibilidade. Foi isso que a indígena Kananri Kuikuro percebeu quando se iniciou nas técnicas de sua etnia. “Desde nossos antepassados, nosso trabalho é o mesmo. Meu avô me ensinou o que é o fazer artístico indígena”, afirma ela.
O que muda de uma geração para outra são as especificidades. No caso, o emprego de materiais (madeira lixa, sucupira e jatobá). Os procedimentos que lhe foram transmitidos por seus antepassados, no entanto, repassam costumes e, apesar das mudanças aceleradas dos últimos tempos, mantêm uma tradição.
Hoje, embora no lugar de utensílios como dente de piranha e pau-canela (empregados na época do bisavô de Kuikuro) já tenham entrado em cena facões e lixas, a admiração e o fascínio pela natureza e pelos animais permanecem inalterados. Isso fica patente na atual coleção de bancos tribais confeccionados por Kananri.
Feitos, em geral, em madeira maciça escavada, sem encaixe, e diretamente inspirados em elementos da flora e da fauna, os bancos indígenas contam com diversas particularidades. A hierarquia da aldeia, por exemplo, está sempre presente. Existem bancos específicos para caciques e pajés, nos quais só eles podem se sentar. Algumas madeiras, como a sucupira e a piranheira, são as mais recorrentes.
“O mais fascinante é que eles procuram religar o ser humano à vida”, diz Sergio Fingermann, artista plástico e mentor do livro de referência Bancos Indígenas do Brasil, lançado em abril pela editora BEI, de Tomas Alvim e Marisa Salles.
A compilação, que conta com mais de 200 obras, reúne artistas indígenas de 35 etnias, predominantemente das regiões do Xingu e da Amazônia Legal. “O que nos levou a organizar o livro foi o encantamento com essas obras. É essencial preservar este legado”, diz Alvim.