Fuga de Floripa
Assassinato de 10 ‘combatentes’ passa por suicídio…chamem Agatha
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Rumo a uma ilha isolada de Florianópolis, doze homens navegam ao cair da noite em uma lancha saída discretamente do continente.
Após a embarcação atracar na praia, o experiente condutor avisou aos onze passageiros:
– Podem desembarcar, rapazes!
– Obrigado e bom retorno, Daronte! Te esperamos amanhã cedo, respondeu o homem que parecia ser o líder do grupo.
– De nada, KP José Mauro, estarei aqui. Um conselho, não demorem a chegar na cabana…o tempo está para chuva. Suerte!
Após o desembarque, um dos homens perguntou:
– A casa fica muito longe da praia, Zé Mauro?
– Não muito, Zé Carlos, dá uns vinte minutos de caminhada. Espichem as pernas e bora lá!
Após o inicio da caminhada, um deles pergunta:
– Por que não podíamos fazer essa reunião por celular?
– Ou então lá no continente mesmo? Emenda outro. Irritado, Zé Mauro respondeu:
– Zé Elias e Zé Pinto, vocês ainda não entenderam que estamos sendo caçados e monitorados 24 horas por dia, seus energúmenos? Zé Bento, desenhe novamente o bizú para eles.
– O que o Zé Mauro está dizendo é que, por ordem do ministro Sandro Morales, o agente Taniguchi e sua equipe já estão na nossa cola…e essa equipe é muito safa e ligeira!
– São mais venenosos do que um ninho de cascavéis, praguejou Zé Mauro.
– Então, temos somente até amanhã de manhã para sairmos do país. Até lá, temos que ficar na moita, absolutamente incomunicáveis, finalizou, Zé Bento..
– Já foi um milagre a gente ter conseguido sair de Brasília sem sermos pegos, acrescentou Zé Mauro.
– Mas tínhamos mesmo que ficar sem os nossos celulares? Lamentou mais um integrante do grupo.
– Também não gostei disso, tivemos que entregar os celulares para alguém lá antes de entrarmos na lancha e me sinto meio nu sem ele…reclamou outro.
Balançando a cabeça, Zé Mauro falou novamente, agastado:
– Zé Luís e Zé Paulo, vocês não ouviram o Zé Bento? Estamos por um fio! Qualquer celular por aqui traria imediatamente o
Taniguchi para cá… assim como o cheiro de carne assada atrairia um cachorro perdigueiro.
– Certo, certo…entendi! Zé Paulo, me dá um cigarro que na correria não deu tempo de comprar.
– Tá bom, mas só tenho Oliú…serve? Praguejando, Zé Luís respondeu:
– Não sei como você ainda não morreu fumando esse mata-rato…mas tá bom, fazer o quê?
A seguir, imersos em um silêncio tenso pelo restante da caminhada, os onze homens chegaram a uma cabana típica das praias da região.
Já dentro do bangalô, Zé Mauro ordenou:
– Muito bem, combatentes, sentem-se e vamos confabular. Não temos tempo a perder!
Zé Bento, o segundo em comando, complementou:
– Tem latinhas de cerveja e de coca-cola no freezer, quem quiser pega lá.
Às gargalhadas, Zé Carlos caçoou:
– Coca-cola? Você tá de brincadeira né, Zero-Dois? Isso é coisa de veado!
Após todos pegarem cervejas e se acomodarem em volta da mesa, o Zero-Um abriu a reunião:
– Primeiro vamos repassar a situação do grupo…Conseguiram se evadir de Brasília e estão aqui: eu, Zé Bento, Zé Carlos, Zé Elias, Zé Luís, Zé Pinto, Zé Paulo, Zé Eduardo, Zé Ricardo, Zé Benicio e Zé Almir… portanto, todos os da rataria-raiz estão aqui. Zé Bento, por favor, informes sobre os outros combatentes que não estão conosco.
Tirando uma lista do bolso, o Zero-Dois explanou:
– Bem, sabemos que Peçanha, Chaves, Miguel, Aligati, Zé Maria e Dona Fátima de Blumenau, estão presos. Já, Zé João, Davi, Kléber, Ismael, José Nilto, Tonhão e Tio Belga, estão desaparecidos e ainda sem contato com a liderança…não sabemos se estão no país ou se já cruzaram alguma fronteira.
– Que desastre…e por que o KPL não está aqui com a gente? Questionou Zé Pinto.
Franzindo a testa, Zé Mauro falou:
– E o que ele estaria fazendo aqui? O KP-Líder não está identificado e vocês certamente entendem que ele não pode se expor…ele permanece em QAP em Brasília, operando sigilosamente pela causa e cuidando dos meios para a nossa evasão.
– É bom mesmo que ele cuide bem disso, disse Zé Luís, de mau-humor.
Balançando a cabeça afirmativamente, Zé Paulo acrescentou:
– Isso mesmo! O careca de toga e o Taniguchi vão querer pendurar o nosso couro em um arame farpado se colocarem a mão em nós.
– E agora que fomos identificados pelas câmeras, eles não vão sossegar o facho até nos colocarem na gaiola, lamentou-se Zé Carlos.
Rispidamente, Zé Mauro, interrompeu o colega:
– Senhores, chega de lamúrias! Vocês estão parecendo noviças assustadas e perdidas na selva…agora que todos estão cientes da situação, vamos ao que interessa. Zé Bento, informe o que está planejado.
– Amanhã, às oito horas, vamos pegar um micro-ônibus que estará nos esperando no QTH em um ponto específico da praia. Depois rumamos para a Tríplice Fronteira, onde haverá gente nossa nos esperando para nos levar até Buenos Aires…já temos o QSL deles.
Um sentimento de alívio contido pareceu percorrer o recinto, misturando-se à fumaça dos cigarros que dava cada vez mais densidade à nuvem por sobre a mesa.
´- Dúvidas? Perguntou Zé Mauro.
– Tá tudo muito bom, tá tudo muito bem, mas realmente…eu não tenho um centavo no bolso e acho que só tenho uns duzentos mangos na minha conta, reclamou Zé Carlos.
– Eu tenho menos que isso, lamentou-se, Zé Elias.
– Gastamos todo nosso dindin nos preparativos, equipamentos e alimentação durante o deslocamento para a missão, arrematou Zé Almir.
Novamente, Zé Mauro interveio, acalmando os ânimos:
– Relaxem, amanhã o KPL irá irrigar as contas de todos nós…e o nosso contato na Argentina tem uma grana viva para suprir as nossas primeiras emergências.
– Teremos cascalho para ficarmos na moita por um bom tempo, completou Zé Bento.
-Tá, mas e as nossas famílias? Questionou Zé Luís.
Com voz serena, Zé Bento falou:
– Já pensamos nisso… Amanhã, após a nossa partida, mensageiros de confiança irão pessoalmente às casas de todos para situá-los e também anotar as necessidades deles.
Após os esclarecimentos prestados pelo Zero-Um e pelo Zero-Dois, os combatentes relaxaram.
Sorrindo, Zé Bento propôs um brinde:
– Patriotas, apesar dos pesares, ainda estamos aqui, não é mesmo? Vamos brindar ao futuro e profetizado sucesso da nossa causa.
Após encherem as canecas verde-amarelas de cerveja, todos ergueram os troféus e exclamaram em uníssono:
– À causa!
– Selva! Que se fodam o presidiário, o careca sanguinolento e o maldito Taniguchi, vociferou Zé Almir.
E também todos os malditos comunistas que infestam esse país, acrescentou entusiasticamente, Zé Ricardo.
– Ei, Zé Bento, você não está tomando cerveja? Brindando com esse copinho de coca-cola aí, por quê? Estranhou, Zé Pinto.
– Hahaha! Não estou te reconhecendo, patriota…zombou Zé Luis.
– Estou com uma cirrose avançada, ordens médicas…falou Zé Bento, em tom neutro.
– Então azar o seu, traga mais latas de cerveja gelada que essas aqui já eram…pediu Zé Carlos a Zé Bento.
Após uma nova e animada rodada de brindes, os parceiros de causa começaram a sentir dores abdominais e musculares, alguns com vermelhidão na pele e, quase todos, puseram-se a vomitar.
Com os olhos arregalados, gemendo e balbuciando palavras incompreensíveis, os dez homens que tomaram cerveja foram desabando das cadeiras e se estatelando no chão, enquanto Zé Bento, impassível, observava a cena.
Calmamente, o homem que havia ingerido apenas coca-cola em um copo, levantou-se e falou:
– Perdoem-me patriotas, mas tinha que ser assim…sei que vocês entenderiam: ordens superiores! Com certeza, nós seríamos interceptados antes de chegarmos à fronteira e a verdade é que vocês eram arquivos que não poderiam cair em mãos erradas.
Convicto, o Zero-Dois acrescentou ainda:
– A identidade do KP-líder não poderia ser comprometida de jeito nenhum e, vocês, ofereciam esse risco em elevado grau. Zé Mauro, meu estimado Zero-Um, poderia ter sido você o encarregado de apagar os arquivos… mas escolheram a mim. Azares da vida, parceiro!
Após esse verdadeiro ato de contrição, Zé Bento pegou um celular que estava em um bolso inferior da sua calça e fez contato com alguém que estava próximo da ilha:
– Daronte, está feito! Quanto tempo para o helicóptero chegar até aqui? Vinte minutos? Certo, estou aguardando!
Duas horas após a partida de Zé Bento da ilha, o agente Taniguchi e sua equipe entraram na cabana e se depararam com a tétrica cena.
– Putz! Digno de um filme de Samurais, pensou alto o agente Taniguchi.
– Todos mortos! Tudo indica que foi arsênico, informa o agente Aulus.
– Verifiquei as identidades, são todos do grupo dos “Josés”… suicídio coletivo? Sugere o agente Éder ao chefe.
Intrigado, Taniguchi observa a cena demoradamente, reflete, e depois fala:
– Colegas, não posso ter certeza, é claro… mas, pensando bem, talvez isso não seja o que parece. De qualquer forma, até alguma outra evidência aparecer, essa é a única hipótese que temos para apresentar formalmente à imprensa.
– Por todos os deuses, esse é um verdadeiro “caso dos dez Zezinhos”, filosofou o agente Aulus.
– Sugestões sobre como iniciamos a investigação do caso, colegas?
– Tenho uma sim, agente Taniguchi, precisamos incorporar imediatamente a agente Agatha à equipe.
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