Esdras não gostava de trabalhar. Não que isso o fizesse diferente dos colegas, pelo contrário, pois era mais uma das coisas que o tornava mais próximo a eles, além da explícita paixão pela famigerada, apesar de tão desejada, vagabundagem. No entanto, como todos reles mortais, o homem precisava acordar cedo e cumprir sua sina de contribuinte para o sucesso da fantástica fábrica de sonhos destruídos. Afinal, as contas não paravam de surgir pela fresta da porta.
Sujeito de raras pretensões além de passar o dia inteiro em frente à praia do Costa, em Itacaré, Bahia, bebericando uma cerveja barata e degustando qualquer petisco para encher o bucho, Esdras não via razão para se frustrar em sonhos impossíveis. Não deseja possuir uma Ferrari nem morar numa cobertura na Vieira Souto ou até mesmo passar férias em Paris.
Nada mais de pisar com sapatos apertados nas duras calçadas na incessante gana por fechar aquele negócio das Arábias. O lance era andar descalço à beira-mar, e a única pressa seria a da completa esbórnia. E que todas as faturas fossem extintas por vontade popular.
Sentiu-se tão reconfortado com seus pensamentos, que acabou adormecendo na rede na sacada. Sonhou que todos aqueles desejos eram reais, que o aroma da maresia lhe chegava ao mesmo tempo do doce quebrar das ondas. Que delícia! Só faltava sentir a espuma da cerveja tocando seus lábios.
Não demorou, Esdras saboreava aquela bebida estupidamente gelada, quando algo começou a incomodá-lo. Ele havia se esquecido de calçar as meias e, não tardou, a incômoda brisa começou a gelar seus pés. O homem acordou, arregalou os olhos e, por fim, constatou o pesadelo diante dos seus olhos.
– Que droga!!! Nada mais cinzento do que uma manhã fria de segunda-feira!
*Eduardo Martínez é autor do livro “57 Contos e Crônicas por um Autor muito Velho”.
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