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Barata Ribeiro, 716, tem tudo para ser a grande surpresa do Festival de Gramado

Luiz Carlos Merten

E o 44º festival encaminha-se para o seu final. Nesta sexta-feira, 2, serão exibidos os últimos dois filmes da competição, incluindo o brasileiro Barata Ribeiro, 716, de Domingos Oliveira, sobre a geração urbano-etílica que ajudou a forjar a identidade do cinema nacional nos anos 1960. Quem já viu, fala maravilhas da interpretação de Caio Blat como o próprio Domingos.

Pode vir Kikito daí, pois os grandes intérpretes desse festival ou são coadjuvantes, como Gustavo Machado e Júlio Andrade, de Elis, ou não concorrem ao prêmio, como o potente Rafael Mentges, de Desvios, pelo simples fato de que o longa do gaúcho Pedro Guindani passou numa sessão à tarde, fora de concurso.

Mais do que em qualquer edição recente do festival, que é latino e brasileiro, foram feitas, entre a imprensa, muitas críticas justamente sobre a seleção da América Latina. Houve bons filmes, como o boliviano Carga Sellada, de Julia Vargas, até grandes como o paraguaio Guaraní, de Luis Zorraquín, mas tem gente até agora tentando entender como Campaña Antiargentina está na disputa pelos Kikitos. Enfim, há uma série de filmes latinos que foram exibidos na quinta, ou ainda serão na sexta, e que poderão animar o panorama.

Está sendo uma boa seleção de curtas, com obras que apontam para a diversidade e, principalmente, têm espelhado o País com contundência. Questões sociais, políticas, estéticas – com certeza. Os direitos dos quilombolas, das mulheres trans. Houve até um curta – gaúcho – de Guto Migotto, Horas, cuja ficção (um homem numa borracharia de beira de estrada) é sob medida para cobrar uma promessa de campanha do governador Ivo Sartori, do PMDB, prometendo a incrementação da malha viária na região serrana do Rio Grande, aqui vizinha de Gramado. Dois curtas apresentados na quarta à noite só aparentemente fogem a essas questões, digamos, mais militantes.

Memória da Pedra, de Luciana Lemos, revisita Monte Santo e Milagres, onde Glauber filmou Deus e o Diabo na Terra do Sol e O Dragão da Maldade Contra o Santo Guerreiro em busca do que seria a herança glauberiana. O tempo passou, pouca gente se lembra dos filmes, mas as imagens, os sons e, principalmente, os diálogos continuam a preencher o imaginário dos cinéfilos. A também diretora Eliane Coster, de Super Oldboy, levantou uma pertinente questão de ordem – se a obra de Glauber é toda ela uma indagação sobre o choque entre o passado agrário e o desenvolvimento que virá, quanto desse futuro se descortina nas cidades que ele filmou?

Um pouco dessa pergunta percorre o curta Lembranças do Fim dos Tempos, de Rafael Câmara, sobre o artista português Pedro de Kastro. Visionário, a obra dele é uma indagação sobre a arquitetura e a decadência das grandes cidades. O centro de São Paulo vira personagem, mesmo que a viagem do filme seja intimista. Kastro, vítima de uma catarata traumática, arrisca-se a perder a visão. É um belo filme, e num rigoroso preto e branco.

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