Corte jurássica e enfadonha
Barroso quebra vitrine e acena com STF mais perto da sociedade
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emAcostumados à prolixa mania de votar para mostrar um conhecimento que não interessa à maioria da sociedade e, quem sabe, para agradar o próprio ego, os ministros do Supremo Tribunal e, por extensão, de todos os tribunais do país precisam rever seus conceitos votantes. No Parlamento Federal, nas assembleias e nas câmaras municipais, os representantes do povo também não se tocam que na fala de um prolixo tem pouco pro e muito lixo.
Como passei boa parte de minha vida profissional em tribunais superiores, sempre avaliei a maioria dos votos que li ou ouvi como o melhor remédio para a insônia da plateia, dos advogados e do pessoal obrigado a acompanhar a sessão.
Era (e é) uma overdose de explicações e citações supérfluas, jurássicas e ininteligíveis, as quais, a partir da oitava repetição, me impedia de negar que os votos daquele tal ministro eram enfadonhos e entediantes. Embora tivesse proximidade com suas excelências, não dispunha de suficiente ousadia para informá-las que falar pelos cotovelos não é sinônimo de inteligência. Pelo contrário.
Dar voltas e não chegar a lugar algum significa falta de protagonismo, chatice. Como porta-voz de três dos cinco tribunais superiores, trabalhei com ministros que diziam o que queriam com duas ou três frases. Outros falavam por três horas e não se faziam entender.
Tecnicamente perfeito, um deles, já aposentado, não conseguia “brifar” um importante voto de sua lavra sem a presença dos cinco ou seis livros utilizados para pesquisas. Ainda tinha uma caneta marca texto para que ele iluminasse o que achava interessante.
O problema é que, para o nosso glorioso ministro, tudo era interessante. O briefing não durava menos de duas horas. A perda de tempo normalmente resultava no fim do Jornal Nacional e de outros telejornais. Enfim, o que seria manchete em qualquer lugar do mundo acabava num pé de página.
Com outras palavras, por diversas vezes tentei mostrar a ele e a outros magistrados que o prolixo explica demais e o simplista de menos. Quem é sensato fala ou escreve apenas o necessário. Tive outros assessorados brilhantemente ligeiros, eficazes e, mesmo sucintos, tão ministros como os outros.
Estes tinham plena consciência da falta de tempo do pessoal que, por alguma razão, dependia de seus votos. Sabiam também que, no mundo moderno, a tecnologia não permite mais espaço para falação desnecessária, textos rebuscados ou palavras desconhecidas. Ou seja, o exibicionismo e os votos para seguidores estão ultrapassados.
O tempo passou, os ministros são outros, mas o modus operandi permanece inalterado para alguns. Semana passada, durante o julgamento da constitucionalidade do Marco Temporal, um daqueles dois ministros que sempre fecham contra os outros nove colegas, levou uma sessão inteira para dizer que a tese aumenta a segurança jurídica.
Deitou falação contra o Marco Temporal, inclusive com numerosas citações do antropólogo, sociólogo e historiador Darcy Ribeiro, um dos maiores defensores das causas indígenas. É o tal negócio de que quem fala demais acaba dando bom dia a cavalo. Este deu e não se constrangeu.
Torcendo para que não seja mais um gesto que se perca na prolixidade histórica da Corte, o ministro Luís Roberto Barroso acaba de assumir a presidência do Supremo, prometendo o que jamais imaginei viver ou vivenciar: agilizar os julgamentos no plenário do STF. A inspiração é do modelo da Suprema Corte norte-americana, onde apenas o relator e o ministro vogal proferem seus votos. Os demais somente acompanham ou divergem.
Outra proposta que certamente colocará o STF na vanguarda dos tribunais é a de divulgar um resumo das decisões com linguagem simples e acessível à sociedade, especialmente em temas complicados. Como as 11 cadeiras são ilhas isoladas, não sei se ele consegue, mas, antecipadamente, voto com o relator.
*Presidente do Conselho Editorial de Notibras