Biógrafo diz que Ocidente discrimina campeão Djokovic por ter nacionalidade sérvia
Publicado
emFelipe Rosa Mendes
Imbatível neste ano, unanimidade entre os especialistas, Novak Djokovic vem conquistando o mundo do tênis aos poucos. Títulos, recordes e marcas importantes foram alcançados em uma temporada quase perfeita. Mas o número 1 do mundo enfrenta certa resistência da torcida, apegada aos ídolos Roger Federer e Rafael Nadal. Para o biógrafo de Djokovic, o também sérvio Blaza Popovic, não se trata apenas de preferência pelo suíço ou pelo espanhol. Na sua opinião, o líder do ranking ainda enfrenta preconceito, principalmente da torcida ocidental, em razão das atrocidades cometidas por sérvios na Guerra da Iugoslávia (1991-2001).
“Há muito preconceito contra a Sérvia ainda”, diz o jornalista, em entrevista à Agência Estado, por telefone, de Belgrado. “Claro que não são todos os fãs dos outros tenistas que têm preconceito. Mas as pessoas acabam sendo influenciadas pela TV, pelo rádio, pelos filmes, pelas notícias da CNN.”
Para Popovic, autor de “A Biografia de Novak Djokovic” (editora Évora/Generale), a guerra traz consequências para a imagem da Sérvia até hoje. O conflito, com forte cobertura da TV, matou cerca de 140 mil pessoas e deixou milhares de desaparecidos e ao menos 2,2 milhões de refugiados.
A guerra civil teve inúmeras causas, entre políticas, econômicas, étnicas e religiosas, mas teve como estopim a busca pela independência da Eslovênia, Croácia, Bósnia e Herzegovina, Montenegro e Macedônia. Estas pequenas repúblicas haviam sido reunidas para compor a nação comunista da Iugoslávia ao fim da Segunda Guerra Mundial, apesar das profundas diferenças históricas entre cada uma delas.
As divergências se ampliaram com a queda do Muro de Berlim, em 1989. E culminaram nos pedidos de independência a partir de 1991 Neste contexto de profunda animosidade, despontou o presidente sérvio Slobodan Milosevic, que rejeitou a independência das demais repúblicas e iniciou conflitos individuais com cada uma delas, com sérias denúncias de limpeza étnica.
O confronto ganhou contornos finais quando a Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte), sob a liderança dos Estados Unidos, e a Comunidade Europeia intervieram na região. Destituído, Milosevic acabou no banco dos réus do Tribunal Penal Internacional, em Haia, sob diversas acusações, entre elas genocídio e crimes de guerra – morreu antes do veredicto.
Todo o conflito nos Balcãs foi marcado por ampla cobertura jornalística. Na avaliação do biógrafo de Djokovic, boa parte das notícias que chegavam à comunidade ocidental eram tendenciosas, o que acabou transformando a Sérvia em uma espécie de vilã aos olhos do mundo. “Há forte propaganda contra a Sérvia, ainda por causa da guerra, dos bombardeios”, afirma o jornalista sérvio, que diz sentir ainda hoje o impacto do preconceito.
A imagem negativa do país acabou manchando também seus cidadãos, argumenta o biógrafo, que morava nos EUA na época dos bombardeios da Otan e acompanhou de perto a cobertura jornalística dos veículos locais. “O governo norte-americano satanizou tudo o que vinha da Sérvia.”
Na sua avaliação, as provocações que Djokovic enfrenta nas arquibancadas em alguns torneios é prova de como a imagem dos sérvios ainda está manchada pela guerra. “Sempre há um grupo de torcedores que provocam Novak nas arquibancadas. Tentam distraí-lo, irritá-lo”, afirma, argumentando que as manifestações não têm a rivalidade esportiva como causa. “Você nunca vê algo desse tipo acontecendo contra Nadal ou Federer.”
RECORDES – Popovic, contudo, acredita que a resistência enfrentada por Djokovic nas arquibancadas deve mudar no futuro. Com os feitos que o sérvio vêm obtendo no circuito, é apenas questão de tempo para ele se tornar ainda mais famoso, contribuindo até para melhorar a imagem do seu país diante do mundo. “Novak está pronto para ser o número 1 do mundo por muito tempo. Ele está preparado para isso. E vai bater muitos recordes”, prevê o biógrafo.
Ele aposta até que Djokovic deve superar o recorde de Grand Slams de Federer, dono de incríveis 17 títulos. “Acho que não será difícil bater o recorde de títulos de Grand Slam. Ele precisa de sete para empatar. E não vejo Federer vencendo mais algum. Em três temporadas, Novak com certeza vencerá nove. Acho que em quatro anos, no máximo, ele baterá o recorde”, projeta.