A recente polêmica promovida pelo presidente Jair Bolsonaro em relação à compra da vacina do laboratório chinês Sinovac é mais uma aposta no “caos”, segundo o cientista político da Faculdade de Ciências Sociais da PUC de Campinas Vitor Bartella. As brigas constantes estimuladas por ele contribuem para a aversão à política. E um eventual aumento dos votos em branco, nulos e abstenções pode favorecer candidatos apoiados por Bolsonaro nas eleições municipais deste ano.
Ao desautorizar, como fez no início da semana, o acordo firmado pelo ministro da Saúde Eduardo Pazuello, com governadores para a aquisição do imunizante, Bolsonaro deu mais uma demonstração de incendiário. Com a decisão, ele agrada sua base mais fiel, adepta das teorias conspiratórias sobre a “vacina chinesa”. É também uma demonstração do alinhamento político-ideológico com o presidente norte-americano, Donald Trump, que também explora o sentimento anti-chinês.
Ao mesmo tempo que a postura autoritária agrada seus seguidores, esse tipo de atitude acaba colaborando para o afastamento da política do eleitor médio. “Ele briga o tempo inteiro para manter as pessoas afastadas, como aquele sujeito que diz que política é tudo igual, que não adianta fazer nada”, afirmou Bartella, em entrevista ao Jornal Brasil Atual, nesta quinta-feira (22).
Dessa maneira, Bolsonaro tenta repetir nas disputas municipais o cenário das últimas eleições presidenciais, quando os votos brancos, nulos e abstenções somaram 42 milhões de pessoas. “Ele sabe que, se esse pessoal entrar, pode provocar um desequilíbrio”, afirmou.
Outro fator que contribui para essa estratégia é a fragmentação política, com o aumento expressivo do número de candidaturas, tanto para o Executivo como para o Legislativo. Isso se dá, segundo ele, em função da proibição de coligações para as Câmaras municipais. Nesse sentido, mais partidos lançaram candidatos às prefeituras como forma de dar mais destaque às suas chapas com candidatos a vereadores.
Nesse cenário, a base enxuta, mas fiel, dos seguidores do presidente pode ser suficiente para levar candidatos bolsonaristas ao segundo turno, avalia o cientista político. É o que ele acredita que pode ocorrer, por exemplo, na capital paulista.
Em função do fragmentação e do desinteresse, o candidato Celso Russomanno (Republicanos) pode até levar vantagem, apesar do seu histórico em outras eleições, quando sua candidatura desidratou ainda antes da primeira votação, como demonstrou a última pesquisa Datafolha (caiu de 28% para 20% das intenções de voto em uma semana). “Num cenário de fragmentação, o pouco de apoio que o candidato consiga às vezes é suficiente para chegar ao segundo turno.”
O quadro se repete em Campinas, terceira cidade mais populosa do estado de São Paulo. A cidade também registrou recorde de candidaturas, com 14 chapas disputando a preferência do eleitor. “É uma cidade onde Bolsonaro teve votação expressiva, com quase 70% dos votos (68,82% dos votos válido no segundo turno) “, alertou Bartella.