Mesmo com toda torcida de quem é contrário à forma como ele (des)governa o país, Jair Messias saiu da Cúpula Mundial do Clima como entrou. Amenizou o tom, mas não convenceu nem as paredes da Casa Branca, muito menos os computadores dos participantes da plenária virtual. Em respeito à liturgia do cargo, não insistirei na desgastada, porém verdadeira, tese defendida por repórteres, articulistas, editorialistas, técnicos e especialistas ambientais de todo o mundo de que Bolsonaro mentiu sobre os números dos incêndios e desmatamento voluntários e involuntários (?) desses dois anos e dois meses de governo. Prefiro entender que o mandatário brasileiro equivocou-se na apresentação em defesa de sua política ambiental. Para quem tem expertise no assunto, o teor não aumentou um milímetro de sua credibilidade junto a comunidade internacional.
Ficou claro que sobrou discurseira inútil e faltaram propostas sólidas, concretas e definitivas. O presidente da República mostrou o pires, pediu dinheiro, mas não informou onde os recursos já recebidos foram investidos. Ou seja, nada foi dito do que queriam ouvir: ações e resultados práticos. Além da deselegância exigida para uma reunião dessa envergadura, entre os principais recados enviados à Presidência, um chamou mais atenção pela veracidade do conteúdo do que pelo inusitado dos termos. Refiro-me à lembrança de que, ao contrário do que Bolsonaro imagina, cuspe não apaga o fogo que incendiou a Amazônia e o Pantanal. Mesmo com números fantasiados e buscando feitos de administrações anteriores, o capitão não conseguiu ser aprovado em seu maior teste internacional em dois anos e dois meses de mandato.
Entre os participantes da cúpula, se manteve como principal vilão na discussão ambiental. Para especialistas, ele tinha de mostrar à comunidade globalizada disposição para mudar a reputação perante o mundo. Faltaram habilidade e projetos propositivos capazes de Joe Biden e líderes de 40 nações. Como havia adiantado o vice Hamilton Mourão, viramos mendigos, rogando a piedade dos ricos para cumprir uma obrigação e zelar pelo que, faz tempo, deixou de integrar nosso glossário de “proprietários” da maior floresta tropical do planeta. O Brasil, por anos a fio, deu as cartas no tema meio ambiente. Hoje, a ideia do presidente e do ministro da área é singular: salva a Floresta Amazônica desde que recebam por isso. Se não pagarem, deixam a boiada passar. Simples assim.
Comprovando toda sua vocação diplomática, Bolsonaro sequer cumprimentou o anfitrião do evento, o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden. Como toda ação tem uma reação, Biden e a vice norte-americana, Kamalla Harris, deixaram a sala logo após a fala do presidente argentino, Alberto Fernández. Didaticamente, não quiseram assistir ao discurso de Bolsonaro. Sem qualquer preocupação com a catástrofe, a verdade é que bastou a metade de um governo sem perspectivas de futuro para que o trabalho de décadas em termos ambientais fosse absurdamente jogado na lixeira da insensatez e da retórica. Profundamente desgastado pelos altos índices de desmatamento na Amazônia, o capitão insiste em olhar apenas pelo retrovisor.
No discurso dessa quinta-feira (22), mais uma vez deixou de pensar adiante, repassando ao mundo informações que não condizem com a atual política nacional do meio ambiente. Em resumo, fora a “justa remuneração” por serviços ambientais prestados, o discurso oficial novamente foi equivocado na frase em que o presidente prometeu dobrar investimentos na área. Não lembrou, por exemplo, que o orçamento proposto para o Ministério do Meio Ambiente para 2021 é o menor dos últimos 21 anos. Isso quer dizer que, como afirmou o secretário-executivo do Observatório do Clima, Marcio Astrini, “o problema do Brasil não é falta de recursos, mas de governo e de compromisso”. Joe Biden e nós, simples mortais, torcemos para que não receitem cloroquina, ivermectina e tubaína contra incêndios e desmatamentos.